30/09/10

É só para avisar que quem vier para aqui defender o sócrates, o alegre ou o almeida que apoia o alegre leva com uma bola-de-berlim nas trombas

O estilo fdp à antiga: aqui
O estilo fdp modernizado: aqui
O estilo não coisa nem sai de cima: aqui
Aviso à navegação: esta Pastelaria funcionará até que a sua proprietária tenha dinheiro para pagar a NET. Depois disso, a segunda, apesar de não ser loira, promete passar à acção directa garantido, todavia, que não roubará gravadores.

29/09/10

Homens de quem eu gosto: António Damásio



A propósito do seu último livro: O Livro da Consciência - A Construção do Cérebro Consciente, Temas e Debates
[Por aqui, uma entrevista que lhe fiz em 2003]

27/09/10

Descontrai baby* que assim como assim estamos lixados [seguido de explicação concisa e precisa]

"(...) Por outras palavras, o problema do défice e da dívida no contexto em que estão inseridos não têm solução. O país não vai gerar rendimentos para pagar a dívida, porque não cresce – e vai crescer ainda menos ou mesmo decrescer – e mais tarde ou mais cedo vai chegar-se a uma situação de incumprimento. Entretanto, imensas somas de dinheiro continuarão a ser transferidas para os predadores financeiros, sem que daí resulte qualquer vantagem (a não ser para eles) para a economia nacional.
O que se passa com Portugal, passa-se com a Grécia, a Irlanda e a Espanha. Como no seio da União Europeia não há a menor predisposição para encarar com realismo o que está a acontecer e apenas se raciocina na base da coerção, como se as leis económicas pudessem ser “domadas” pelo receio das sanções ou mesmo pela imposição das ditas, não se pode esperar da União uma via de solução que, atendendo ao problema de alguns, possa ser, a prazo, do interesse de todos.
Assim sendo, e tendo sempre presente que o actual caminho, aqui sintetizado nas imposições de Bruxelas e exigências dos predadores, não leva a qualquer solução, por muito que os governantes se esforcem por fazer crer o contrário, a única saída possível para o problema assenta numa posição de força dos devedores. Algo como: “Assim, não pagamos!”, de modo a forçar uma solução alternativa com saídas credíveis, socialmente aceitáveis. (...)"
LER NA ÍNTEGRA AQUI.

* Uma das minhas filhas esteve a ouvir o FMI no youtube com o avô e meteu o Zé Mário Branco, que não conhecia, na página dela do facebook. Talvez isto queira dizer alguma coisa.

26/09/10

Rui, mau mas mau mesmo é que seja qual for a escolha, do ricipe ninguém nos safa

"Não diria que é aquilo que mais temo perante a possibilidade de a crise política que se adensa nos empurrar para as mãos de Pedro Passos Coelho. O que pode acontecer aos destinos do país e à vida das pessoas, entregues de vez à volúpia da «cultura empresarial», afigura-se bem pior do que o aspecto de quem venha a gerir o estabelecimento. Mas é este, seguramente, um dos factores que me perturba. Ponderar como inquilino da residência de S. Bento um típico e obstinado beto dos eighties, seguido por um séquito de réplicas, é um pesadelo que me tem povoado as noites. Ser governado por alguém que aparenta querer impingir-nos a qualquer momento um pólo da Lacoste ou da Ted Lapidus, penteado «à Joe Dassin», de discurso tenso e redondo, soturno e previsível, ter de conviver diariamente com a seriedade enfatuada e a representação icónica do aborrecimento, constitui para mim uma preocupação adicional de ordem estética e ecológica. Talvez pareça um tanto frívolo e com angústias de baixa densidade política, mas não encontro nada que afaste de mim este enjoo. (...)"

Sobre o significado de ricipe ver aqui. Sócrates explica.

22/09/10

É que entre a politik pacóvia do engº José Sócrates e os "estados de alma" de Manuel Maria Carrilho o meu coração nem balança

Dizem uns que o ex-ministro da cultura foi demitido da Unesco devido à publicação do seu livro, E Agora? Por uma Nova República, e na sequência de uma entrevista ao Expresso.
Dizem outros que tal razão é um perfeito disparate, um truque publicitário, e que o motivo real — e inteiramente justificado — reside nos seus "estados de alma".
Concedo que a segunda hipótese me parece mais plausível. Contudo, apesar de mais plausível, nem por isso menos ínvia.
Porque a recusa de Carrilho em votar num troglodita que ameaçou queimar livros para director da Unesco é, no meu ponto de vista insuspeito porque nem sequer sou fã do dito, um estado de alma de se lhe tirar o chapéu!
E metam a "real politik" num sítio que eu cá sei.

21/09/10

A book a day keeps the doctor away: "Desespero", Vladimir Nabokov

Com introdução do próprio Nabokov, surge nova tradução de Desespero, texto de 1932 escrito originalmente em russo, vivia, na época, o escritor em Berlim. A obra foi conhecendo várias versões em inglês, língua que Nabokov acabaria por fazer sua; esta que se tem agora entre mãos (a terceira versão) é de 1965, depois de revista pessoalmente pelo autor de Lolita.
Escreveu Julio Cortázar que a indiferença pelo estilo por parte de autores e leitores leva [me] a suspeitar que a 'mensagem' tão disposta a prescindir alegremente de um estilo também não há-de ser grande coisa.
Como se sabe, o desprezo pela “mensagem” foi algo que Nabokov sempre cultivou [“Desespero (…) não tem comentário social a fazer, não traz mensagem nos dentes. Não endireita o órgão espiritual do homem nem mostra à humanidade a saída justa. Contém muito menos ‘ideias’ do que qualquer um desses ricos romances populares tão histericamente aclamados na curta câmara de eco entre o aplauso e a vaia”].
Tal posição, que irritou a intelectualidade de esquerda (e também a de direita, que nunca lhe perdoou os amores do professor pela ninfa), faz de Nabokov um nome aparentado de Borges, se ao estilismo irrepreensível dos dois acrescentarmos o gosto evidente pela paródia de ambos.
Desespero é, no caso, uma paródia ao tema do duplo e da culpa (não demora muito para que pensemos em Crime e Castigo) magistralmente escrita. E é também uma paródia aos truques literários, às estratégias de sedução, aos esquemas de composição romanesca (Como começaremos este capítulo? Proponho diversas variantes para escolha).
Hermann Hermann, e não pode deixar de notar-se a similitude com Humbert Humbert, o narrador de Lolita, é uma personagem pouco simpática, solipsista, industrial do fabrico de chocolate que um dia encontra um vagabundo de nome Félix cuja fisionomia lhe parece uma cópia de si próprio. Obcecado pela semelhança, acaba por mergulhar num perigoso jogo de espelhos que o conduz à loucura e ao homicídio.
Um divertissement macabro ou Nabokov no seu melhor.

Desespero, Vladimir Nabokov, Teorema, 2010, trad. de Telma Costa

19/09/10

Quantos ciganos queres para a troca? (II)

[na continuação deste post e dos muitos comentários]

«Há ou não há fundamento para comparar a expulsão dos ciganos da Roménia e da Bulgária, ordenada por Sarkozy, com o que os nazis fizerem durante a II Guerra Mundial (como chegou a dizer a comissária da Justiça da UE, Viviane Reding) e com as deportação para Alemanha de 75.000 judeus (na maior parte sem nacionalidade francesa), de que o regime de Vichy se encarregou por conta do III Reich?
Num sentido, não há. Hitler queria exterminar os ciganos (como de facto exterminou centenas de milhares por toda a Europa) e não parece que a Roménia e a Bulgária tencionem tratar da mesma maneira os ciganos que Sarkozy eventualmente "repatriar". Mas, desgraçadamente, isto não torna o episódio um simples caso de emigração ou residência ilegal. E não torna, porque há outra face em que a política de Sarkozy se aproxima e até às vezes se confunde com a política de Hitler.
Não é por acaso que a França resolveu escolher os ciganos como objecto do seu rigor e não escolheu, por exemplo, os portugueses. Os ciganos são uma minoria étnica vulnerável e não têm um Estado que os defenda, e os portugueses não são e têm o mais velho Estado da Europa, ainda por cima membro da UE, para falar por eles. Promover colectivamente um pequeno grupo de "estranhos", sem protecção, a bode expiatório de uma crise grave e à superfície irresolúvel é uma antiga técnica do populismo, que Sarkozy (como Hitler) não hesitou em usar. Só que, por força, ela estabelece sempre sem exame uma culpa colectiva e aponta ao cidadão comum os "culpados" de um "crime" imaginário.
Qual é o verdadeiro "crime" dos ciganos? Em primeiro lugar a "raça" (uma noção mais do que ambígua). Em segundo lugar a cultura, que, neste caso, incluiu o nomadismo. E, em terceiro lugar, a recusa de se "integrar" na sociedade francesa, presumindo que existe um único modelo de "sociedade francesa". Ora, como muitas vezes já se verificou, estas três "razões" levam directamente ao ódio e à perseguição. E aqui Viviane Reding não se engana, a II Guerra mostrou a que extremos pode chegar e com que rapidez se pode espalhar o estigma imposto por uma autoridade nacional a uma minoria étnica. Berlusconi já permitiu 315 "intervenções" do Estado em acampamentos de ciganos. Pior ainda, consta que a santificada Angela Merkel se prepara para expulsar 12.000. Onde fica nisto e para onde vai a "Europa" dos direitos do homem?»
Vasco Pulido Valente no Público, lido aqui

18/09/10

Hoje foi um dia igual aos outros mas com um final feliz

E seria chegado o momento de citar aquele poema do pastor protestante alemão, muitas vezes erroneamente atribuído a Brecht, Primeiro vieram pelos comunistas... não fosse ter acontecido ao poema do pastor protestante alemão o mesmo que aos girassóis do Van Gogh.
O caso é que, esteticismos à parte, PS, PSD e CDS votaram por Sarkozy. A explicação de Assis para a posição oficial do seu partido foi particularmente espúria. Cito: Quando está a decorrer um inquérito, não acho bem que a Assembleia da República condene um Estado de Direito democrático, como é o Estado francês. Não estamos a falar de nenhuma República pária ou de uma ditadura, mas de um grande Estado democrático.
Resumindo: atribui-se à França a presunção de inocência, como ao Carlos Cruz. Quanto aos ciganos, que aguentem os cavalos.
Enquanto isto, ou seja, enquanto na Assembleia da República Portugal reconhecia a grandeza do Estado francês apesar das Invasões, o povo clamava pelas casas e pelas ruas a pergunta milionária: onde fica o Poceirão?
E estava mais um dia a chegar ao fim quando o Olhanense ganhou ao Portimonense.
PS.: Lamento, Hugo Miguel, mas o meu dia acabou melhor que o teu. Já agora, sabes por acaso onde fica o Poceirão?

17/09/10

A book a day keeps the doctor away: "Crimes", Ferdinand von Schirach

Num estilo cru e descritivo, Ferdinand von Schirach relata-nos em Crimes uma série de actos criminosos, quase sempre sanguinolentos e ferozes, conseguindo ainda assim que sintamos empatia pelos seus autores. Fá-lo sem interferência do narrador, sem sentimentalismo ou demagogia. Limitando-se a contar, von Schirach, advogado de profissão, conduz-nos àquele estado de compreensão compassiva pelas personagens que teve em Tolstoi o grande cultor.
São onze histórias (que mereciam revisão mais cuidada). A última acaba bem e respiramos de alívio.
Crimes é difícil de catalogar. Não se trata de um policial, embora em todas as histórias haja delitos por desvendar; nem de literatura de “suspense”, embora alguns contos possam causar calafrios. É mais assim como um salto no escuro, com a crueldade a beber das suas circunstâncias.
Um velhinho afável perde a paciência ao fim de anos de casamento. Três delinquentes metem-se com quem não deviam. O desamor de um pai severo conduz a família à tragédia. Um jovem libanês tido como “palerma” salva os irmãos em tribunal. Uma jovem emigrante sem papéis acaba na profissão errada mas a sorte chega por um fio. Um casal sem dinheiro enfrenta um industrial rico numa acusação de assassínio que fica por esclarecer. Dois facínoras são mortos em legítima defesa por um homem misterioso. Um rapaz psicótico tem a estranha mania de matar ovelhas e arrancar-lhes os olhos. Um erro administrativo coloca um guarda de museu a vigiar a mesma estátua durante décadas e a coisa acaba mal. Um estudante apaixonado adquire um gosto bizarro por sangue. Finalmente, um homem bom assalta um banco mas acaba condenado apenas a dois anos….
A culpa, a verdade, a sorte e o azar confrontam-se nestes contos narrados à flor da pele. E se a realidade nem sempre é o que parece, os factos, esses, estão lá, peças de um puzzle em que o resultado, como na vida, é diferente da simples soma das partes.

Crimes, Ferdinand von Schirach, Dom Quixote, 2010, trad. de João Bouza da Costa

16/09/10

Quantos ciganos queres para a troca?

Num mundo em que o que realmente importa se designa por nomes estranhos como monoplay, doubleplay, spin off ou sell out é natural que os ciganos sejam uma maçada.
A troca de galhardetes a que temos vindo a assistir na Comissão Europeia a propósito das medidas francesas contra as comunidades ciganas é, quanto a isso, bastante esclarecedora.
A luxemburguesa Viviane Reding, comissária europeia da justiça, evocou as limpezas étnicas da II Guerra mas houve logo quem lembrasse que um bilhete de avião à borla e 300 euros no bolso não era coisa comparável. Com certeza.
Mas teremos, então, que chegar às portas de um campo de extermínio para expressar indignação? Não nos bastará saber que Sarkozy resumiu a coisa assim: "si les Luxembourgeois voulaient LES prendre il n'y avait aucun problème"?
E o que me lixa mesmo é a terceira pessoa do plural.

14/09/10

Eu acho o Obama racé, o Daniel Oliveira prefere atribuir-lhe uma raça

Quando a esquerda que temos, tão intransigente noutras matérias, insiste no conceito (pimba) de raça(s) bem pode Sarkosy expulsar prioritariamente ciganos.
Mesmo a popularidade de Obama, que varreu o Mundo há dois anos, deveu-se mais à sua simpatia e oratória, à sua RAÇA e à sua juventude, do que ao corte político e ideológico que, apesar de tudo, a sua eleição significaria [Daniel Oliveira, "A Política Pimba"; (as maísculas são minhas)]

Definição da palavra francesa racé (para os frequentadores da Pastelaria que já só tiveram espanhol na escola)

12/09/10

Professora de braga confirma telepaticamente a inocência de carlos cruz (um exclusivo do expresso)



A intuição dela é como o algodão: nunca se engana. Viu o Carlos Cruz na televisão e alcançou o satori. Tudo isto em Braga.
Uma amiga que conhece bem o processo explicara-lhe que a polícia judiciária entalara deliberadamente o ex-apresentador mas foi ao assistir ao último Prós & Contras que todas as suas dúvidas se dissiparam (e o mesmo não se pode dizer do Daniel Oliveira...).
Falou com a irmã e uns amigos e, juntos, lançaram um abaixo-assinado, o qual, no momento em que escrevo, já tem 316 assinaturas.
Um dos subscritores mostra-se particularmente indignado: Esta sentença foi vergonhosa, como é possível que depois de tantos adiamentos os arguidos e advogados não tenham acesso ao acórdão antes da sentença.

Aguardam-se declarações do Ministério da Educação, da DREN e daquele senhor que tem a mania de falar em nome dos pais dos alunos e cujo nome de momento não me ocorre.

09/09/10

As voltas que o mundo dá enquanto o mundo espera o acórdão [incluindo o Daniel Oliveira]

Eu sou primeiro ministro, eu não tenho o direito de me queixar da justiça. Tenho, isso sim, o dever de reafirmar a confiança na justiça (José Sócrates)

Eu não quero saber se há escutas ou não, eu não quero saber se há retaliações ou não, o que é grave é que as pessoas acham que há (Manuela Ferreira Leite)

Ambas as afirmações, aqui.

08/09/10

Já não se escrevem começos destes [ou se calhar escrevem-se]


Antes do aparecimento dos navios a vapor, quem se passeasse ao longo das docas de qualquer porto de considerável importância sentiria, com mais frequência do que hoje, a sua atenção desperta por um grupo de marinheiros bronzeados, da marinha de guerra ou mercante, a gozarem em terra a sua licença. Algumas vezes vê-los-ia reunidos à volta de uma figura superlativa, embora da mesma patente, caminhando juntos com Aldebarã entre as estrelas de menos intensidade da sua constelação. Este astro de primeira grandeza era o «Marinheiro Ideal» dos tempos menos prosaicos das marinhas mercante e militar. Não havia nele qualquer ostentação e aceitava essa homenagem espontânea dos seus camaradas com a simplicidade de quem vê reconhecido um direito natural. Lembro-me de um caso particularmente interessante. Há já uns cinquenta anos, vi em Liverpool à sombra do grande paredão imundo de Prince's Dock (há muito deitado abaixo), um simples marinheiro, tão negro que devia ser um nativo africano de puro sangue hamita. Era uma figura bem proporcionada, com uma estatura acima da média. Bailavam sobre o seu peito de ébano as duas pontas de um lenço de seda garrida que tinha amarrado ao pescoço; das orelhas pendiam duas grandes argolas de oiro e a sua cabeça harmoniosa era coroada por um barrete escocês.
(...)

Billy Budd, Herman Melville, Livros dos Brasil, Colecção Miniatura, tradução de José Estêvão Sasportes e capa de Infante do Carmo (2,20 euros numa das minhas livrarias preferidas, a Galileu de Cascais)

Como dizia a minha descansada tia, homem pequenino ou velhaco ou bailarino — a sarko nunca o vi dançar


Sobre a proposta de criar cidadãos franceses de primeira e de segunda ler (em francês) dois esclarecedores artigos: aqui e aqui.

E para que não se pense que sou a única a invocar a sabedoria popular, veja-se a publicidade alemã de uma empresa de aluguer de automóveis que, traduzindo, diz isto: "Faça como a Madame Bruni, opte por um (modelo) francês pequenino"


07/09/10

Posso não perceber nada de leis mas não serei completamente desprovida: ou há moralidade ou comem todos, eis a mensagem de Carlos Cruz

200 nomes. E não faz a coisa por menos.
A propósito, um texto com pés e cabeça que já começo a ficar farta de tanto choradinho sobre os perigos da justiça portuguesa bater aos pontos a da Coreia do Norte.

«Depois das lamentáveis e desastradas prestações televisivas dos últimos dias de Carlos Cruz e do seu advogado, o ex-apresentador de televisão parece agora disposto a avançar com outros meios para lançar a dúvida na opinião pública sobre a sua condenação.
A sua estratégia tem passado por várias fases: numa primeira fase clamou inocência com base no completo desconhecimento dos factos que lhe eram imputados ou se suspeitava ter praticado. Manteve-se nesta estratégia, mesmo depois de ter sido preso, até terem começado a circular publicamente depoimentos que o incriminavam.
Numa segunda fase, que parece ter começado na instrução e prevalecido durante todo o julgamento, a sua defesa preocupou-se fundamentalmente com a exibição de factos que pudessem contrariar ou pelo menos pôr em dúvida as provas incriminatórias. Daí a repetida alegação de que os factos imputados não estavam fundamentados.
Numa terceira fase, que parece ter começado imediatamente após o julgamento e que ontem já foi muito notória no programa “Prós e Contras”, a defesa parece basear-se na seguinte pergunta: “Então, se é assim, porquê só eu?”.
Esta é sem dúvida a estratégia que poderá colher mais aplauso junto da opinião pública e que mais problemas pode trazer aos poderes constituídos, a todos sem excepção. Sendo inequívoca a existência de múltiplas violações e de abusos sexuais sem conta, dezenas, centenas (...), é óbvio para toda a gente que o número de prevaricadores terá de ultrapassar em muito a meia dúzia de condenados do "Processo Casa Pia”.
Se é certo que relativamente a muitos o crime já prescreveu ou já se extinguiu o procedimento criminal por morte dos presumíveis culpados, não será menos verdade que relativamente a muitos outros tudo continua ainda sendo possível. E é essa questão que Carlos Cruz verdadeiramente promete reavivar quando, com aparente ingenuidade, a invoca em sua defesa. Aparentemente, Carlos Cruz quer dizer que a inconsistência da prova com base na qual foi condenado é tão evidente que a existência de provas idênticas produzida no processo não serviu sequer para processar mais ninguém, quanto mais para fundamentar outras condenações.
Realmente, o que Carlos Cruz quer dizer é que se os factos que serviram de prova e fundamento para a sua condenação são assim tão relevantes, muitos outros, além dele, terão igualmente de ser condenados por existir nos autos prova da mesma consistência relativamente a eles.
E com esta estratégia, verdadeiramente arriscada, mas também ditada por aquela coragem de quem já não tem nada a perder, ele sabe que pode conseguir uma de duas coisas: ou ganhar ou criar um problema de proporções incalculáveis de muito difícil solução.
Ou seja, para além da estratégia objectivamente prosseguida visando a prescrição do processo, vai agora ser posta em prática uma outra que aponta claramente para a absolvição por “conveniência prática”…»
Post roubado aqui.


E já agora que estou em maré cleptomaníaca, também valerá a pena ler isto:
«(...) num processo desta natureza, tendo em conta o tipo de crimes que estavam a ser julgados, a prova, nomeadamente a que vai para além da existência do facto, se faz — salvo situações excepcionais — mediante recurso a testemunhos. E que a prova testemunhal é livremente apreciada pelo tribunal: o juiz forma a sua convicção tendo em conta todos os elementos juridicamente relevantes. E a melhor doutrina até entende que o juiz (seja individual ou colectivo) do processo, salvaguardados os princípios do Estado de direito, dispõe de um poder discricionário na avaliação dos testemunhos, inalterável na sua concretização, pela proximidade e especial situação em que se encontra perante os factos. (...) E também é bom que se diga que a concordância dos depoimentos pode não ser suficiente para formar a convicção do julgador, assim como a sua eventual divergência o não impede de a formar com base naquele que considera mais credível. Pode haver erros: avaliações deficientes ou interpretações erradas. O que não pode é haver condenação com dúvidas: se o juiz tiver dúvidas, não condena; se não tiver, condena.

Um blogue civilizado [e já agora, se isso interessa a alguém, adorável]

Não se fala da Casa Pia. É falta de educação falar da Casa Pia. Aprendemos isso rapidamente. Há coisas de que se não fala. Não se fala de sexo em frente das tias, não se fala à mesa, não se fala de mortos, não se fala da menina Abigail a queimar cartas no terraço depois do senhor da Siemens a ter deixado, não se fala das capas das revistas de coração, não se fala das telenovelas que aliás nunca vemos, não se fala da Diana Chaves, não se come dobrada, nem se fala das vísceras em geral e do recto em particular, não se fala dos pobres, nem da pobreza, nem do que dizem os pobres, nem dos remediados, nem se fala de dinheiro, não se fala da Casa Pia. Não se fala do Saramago, nem do Lobo Antunes, não se fala, não se fala. Não se fala da Casa Pia. Não se vem para aqui falar das crianças maltratadas. Isto é um blogue civilizado. Não se fala. Criança maltratada é coisa de motorista. Coisa entre motoristas e crianças sem família. Devia ficar entre eles. Ou com os excitados sem causa, sempre à procura de tema para a excitação. Nós não somos responsáveis pelo mal do mundo. O mal está na natureza humana. Nós sabemos que o mal existe mas não é por falarmos dele que mudamos o que quer que seja. Não se fala da Casa Pia. É tema para entreter a populaça. Não se fala.

06/09/10

Porque a vida é a vida e não se resume aos tribunais como alguns parvenus da democracia pensam com um grande abraço ao Manuel António Pina

E tu? De que és inocente?

Os seis condenados da Casa Pia vêm engrossar a chorosa lista de inocentes de que, como se sabe, estão cheios tribunais e cadeias de todo o Mundo.
Até ver, e dependendo do resto do processo, a principal diferença entre os inocentes da Casa Pia e alguns dos outros inocentes (assassinos, violadores, assaltantes) é que estes não aparecem nas TVs a fazer queixa dos juízes aos Ex. mos Srs. Telespectadores nem a sua condenação (por crimes que, obviamente, nenhum deles cometeu) faz "aterrar" sobre a Justiça o apocalíptico Reino das Trevas (ou, ainda pior, das "Trêvas").
Como os demais "inocentes", os da Casa Pia irão "até ao fim" do Universo, da Física e da Metafísica para obter a condenação dos juízes que os condenaram e, se não for pedir muito, das vítimas que lhes "fizeram mal".
Ora quis o acaso objectivo que, no mesmo dia da sentença da Casa Pia, passasse na RTP um filme em que, a certa altura, John Turturro é metido na cela onde está Schwarzenegger e faz as apresentações perguntando imediatamente: "E tu? Estás aqui inocente de quê?".
"Maravilhosos acasos, aqueles que agem com precisão", diz Bresson.
Manuel António Pina
A imagem foi roubada com os devidos agradecimentos, aqui.

05/09/10

A Casa Pia nunca existiu

Conhecida a sentença que condena todos os arguidos — com excepção de Gertrudes Nunes, a dona da casa de Elvas absolvida por razões técnicas (alteração de 2007 à lei do lenocínio) —, os visados avisaram que vão recorrer da decisão. Marinho Pinto, que não falará de cor, garantiu publicamente que o risco de prescrição é real.
Um processo é o que é e a justiça o que se sabe. Não vais ao cóquitel tás fodido, dizia o Cesariny.
Findo o primeiro round, os condenados cumprem o seu papel: recorrem. As vítimas regozijam-se, naturalmente. Um determinado tipo de reacções, ou a ausência delas, é que me espanta. Ou me envergonha.
Os que põem a mão no fogo pela inocência dos condenados (ou, pelo menos, pela de Carlos Cruz) usam dos mais variados argumentos. Da cabala política aos erros judiciários, do bode expiatório à inveja.
Os que não têm dúvidas sobre a decisão do tribunal clamam maioritariamente contra o tempo leve das penas (é verdade que se eu estivesse na pele do Bibi não hesitaria em pensar que cá no burgo a confissão não compensa…).
No intervalo, o absoluto silêncio. Em alternativa, um silêncio ruidoso e, como sempre, alicerçado no legalismo. Tomás Vasques escreve que se mantém fiel ao princípio da presunção de inocência até ao trânsito em julgado de sentença condenatória.
Parece-me bem mas deixo uma ou outra pergunta. Os arguidos foram ou não foram considerados culpados pelo Tribunal de Primeira Instância? A sua presunção de inocência sai ou não ferida neste primeiro acórdão, independentemente dos trâmites posteriores? E usando agora a muleta lançada pelo Marinho Pinho: se a coisa prescrever, como é possível que aconteça, qual será a posição do Tomás Vasques quando todos se safarem: vai considerá-los inocentes (à Leonor Beleza foi isso que aconteceu, não foi)?
Daniel Oliveira comenta o caso esperando que tenha sido feita justiça e mostrando-se sobretudo indignado — valha-lhe a retórica — com os jornalistas e com o Pedro Namora.
No Jugular, outro blogue de esquerda, sempre célere no apoio a todas as causas fracturantes, até ao momento em que escrevo a única referência consistia num post da Ana Matos Pires, que não faço ideia quem seja mas a falha é certamente minha, que esboça uma piada (?) sobre a relação entre a Casa Pia e a Maddie, remetendo para um jornal que também não costumo ler.
Não sou boa em listas e por isso fico-me por aqui.
Resumindo: nem uma palavra sobre as vítimas da Casa Pia (é que os miúdos foram mesmo repetidamente enrabados, topam?). Nem uma palavra sobre o padre António Emílio Figueiredo (já falecido) que denunciou o regabofe já nos idos de 60 e por isso foi para a rua (pois, temos pena mas este não era pedófilo). Nem uma palavra sobre o Mestre Américo Henriques, defensor dos putos e a quem a Costa Macedo decidiu pôr no sítio.
Resumindo que não me posso enervar: esta esquerda (desprovida de compaixão) não é a minha esquerda. Esta esquerda é quanto muito canhota.

Em Paris cantou-se Gainsbourg a favor dos sem-papéis (em Lisboa, nada a declarar)



...e a versão integral de 1972

04/09/10

E como todos já terão percebido, as perseguições étnicas são uma coisa que me chateia

Assim sendo, relembro que hoje, sábado, 4 de Setembro, há concentração às 15h30m em frente à Embaixada de França, em Lisboa (fica no topo da Calçada Marquês de Abrantes, transversal à Avenida Dom Carlos I, mesmo juntinho à 24 de Julho).
Aproveito também para reproduzir o esclarecedor texto de Ricardo Araújo Pereira que lança toda uma nova luz sobre a relação directa, e até agora não devidamente esclarecida, entre a crise e a ciganada. Ou, como diria o Senhor Comentador, é hora de os ciganos contratarem um advogado e um director de marketing.



... segue o texto do Araújo
«A crise económica que o mundo vive é complexa, e não é fácil apontar com exatidão o momento em que terá principiado, mas o governo francês já identificou os seus responsáveis: são os ciganos. A descoberta não terá apanhado ninguém de surpresa. A bem dizer, todos sabíamos do papel que os ciganos desempenharam no descalabro financeiro norte-americano e, subsequentemente, mundial. O conselho de administração do banco de investimento Lehman Brothers era integralmente constituído por ciganos. Uma das razões da falência do banco foi, aliás, o facto de os seus administradores só pegarem ao serviço à tarde. De manhã estavam na feira, a vender T-shirts de contrafação. Bernard Madoff, cuja tez morena é bem reveladora de ascendência cigana, confessou ter planeado o seu esquema fraudulento ao som dos Gipsy Kings. E subprime é um termo do dialeto cigano que significa "ai, Lelo, vamos conceder empréstimos imobiliários de alto risco até provocar a insolvência de três ou quatro grandes instituições financeiras".
Ninguém sabe bem a razão pela qual os gregos elegeram um governo de ciganos, mas o facto é que eles estão lá, a fazer crescer a dívida externa e a arrastar a Europa para a falência. E Sócrates, não sendo cigano, é, no entender de muitos, um ciganão. Creio que é óbvio para toda a gente que a crise económica é mundial precisamente porque os ciganos, sendo nómadas, conseguiram levá-la a todo o lado.
É mais do que natural e justo que o governo francês tenha perdido a paciência com os prejuízos que esta etnia tradicionalmente ligada à alta finança tem provocado e, por isso, como costuma suceder em França com os estrangeiros que não têm categoria suficiente para representar a seleção francesa de futebol, os ciganos foram recambiados para o seu país de origem. País esse que, neste caso, é a Roménia - que faz parte da União Europeia. É azar: os ciganos, que são um povo sem fronteiras, têm algumas dificuldades para circular na Europa sem fronteiras. Ainda assim, um povo tão habituado a ler a sina deveria ter adivinhado que isto da livre circulação de pessoas iria ser prejudicial para quem é nómada. Era mais que óbvio.
Não ignoro que a medida de Sarkozy tem sido criticada, mas apenas pelos radicais de esquerda do costume. Como o Papa. A verdade é que os ciganos só trazem problemas. Recordo que o cigano mais famoso de sempre era estrela de cinema. Chamava-se Charlie Chaplin. Se bem me lembro, era raro o filme em que ele não arranjava problemas com a polícia. Aquilo está-lhes no sangue. »
Lido AQUI (agradeço o link ao Nuno Ramos de Almeida)

03/09/10

Estes já estão liquidados. O tiro foi bem na testa. Não comerão mais criancinhas no caminho da floresta

A frase em título (premonitória?) era dita por Carlos Cruz no singular e sotaque brasileiro aos microfones do programa Pão com Manteiga.
Hoje foram todos condenados. Ninguém pode estar de parabéns numa situação destas mas fico contente pelos putos. Que ao fim de 7 anos de caso casa pia já são homens.
Não sei como se faz, mas alguém devia processar o Estado por ter permitido a brincadeira (por onde andará a Teresa Costa Macedo?).

02/09/10

A única coisa que faltava mesmo era os ciganos serem acusados de raptar a maddie

O jornal inglês de referência The Sun noticiou que um homem não identificado entregou uma carta ao filho do pedófilo Raymond Hewlett, uma semana depois deste ter morrido de cancro na garganta.
Na missiva, escrita no leito da morte (claro), Hewlett garantia que nada tivera que ver com o rapto de Maddie embora soubesse o que lhe acontecera: fora raptada pela máfia cigana.
Um amigo do filho do pedófilo (que não falava com o pai há 20 anos) contou a história ao jornal. The Sun diz que o filho queimou a carta depois de a ler. E pronto.
Deste enredo de pacotilha fez o Diário de Notícias... uma notícia. Esqueceu-se de traduzir a parte de a carta ter sido supostamente destruída e de se desconhecer o seu mensageiro, e intitulou-a: "Maddie levada por Mafia Cigana". O I e a Visão, mais comedidos, titularam a coisa em modo conjuntivo. Respiramos de alívio!
Se isto seria sempre um disparate e exemplo de jornalismo, literalmente, de latrina, a coisa irritou-me ainda mais por surgir no momento em que surge.
E a propósito do momento...
1º: Está marcada uma concentração junto à Embaixada de França em Lisboa para o próximo sábado, pelas 15 horas, contra as expulsões dos ciganos.
2ª: Aproveito para transcrever post de O Senhor Comentador que, no essencial, resume aquilo que penso sobre o assunto. Cá vai.

O Senhor Comentador adverte os governos a suspenderem a caça aos ciganos
"A expulsão de ciganos ordenada pelo governo francês relembrou que a mentalidade europeia é organizada pela mediocridade. Percebo que os ciganos, ou os Roma, como agora lhes chamam, não sejam fáceis de aturar. É uma cultura fechada, preconceituosa, arrogante e incontrolável. E, pior, há séculos que tem uma péssima publicidade. Até os contos infantis, Pinóquio entre eles, os consagraram como papões etnicamente reconhecíveis. A aversão aos Romas é formada desde a mais terna infância. Contudo, não digo que seja totalmente infundada. Acredito que há ciganos criminosos, como os há pretos, árabes, nórdicos, europeus, galeses. Mas quando se fala dos Roma, a criminalidade é apenas burguesmente aceite; como se fosse uma condição sine qua non destas pessoas. Seja como for, esta etnia, sem ter influenciado directamente a história do mundo, sobreviveu a todas as histórias que o mundo teve. A sua cultura é uma curiosidade mas nunca foi uma influência. Talvez na música, com as rapsódias, com Liszt e Paganini, mas mais pelo desafio de adaptar a sua exuberância expansiva à nossa predominante melancolia ou cerimoniosa musicalidade. Que os países europeus não tenham conseguido “civilizá-los” ao longo destes séculos é, sem dúvida, um fracasso cultural. Esta força cigana merece respeito. Não está em causa o dever do cumprimento da lei, até mesmo por tão exótica e independente comunidade. Mas discriminá-los por, em conjunto, serem perigosos para sociedade suburbana, é, além de idiota, uma traição à nossa civilização. Os ciganos deviam ser tratados com o mesmo respeito que devemos às espécies em vias de extinção. A ânsia de controlar os nossos impostos, a nossa saúde, a educação, os nossos tempos livres, vai chegar a um ponto em que não haverá espaço burocrático para as culturas independentes ou marginais. É cada vez mais difícil viver à margem seja do que for. Os Roma conseguiram-no durante séculos. Aceitemos o seu triunfo e esperemos que também sobrevivam a estes tempos, em que os computadores são cada vez mais severos e as administrações mais implacáveis. Fora isso, tudo bem."
A fotografia foi encontrada aqui.

That's life