Conhecida a sentença que condena todos os arguidos — com excepção de Gertrudes Nunes, a dona da casa de Elvas absolvida por razões técnicas (alteração de 2007 à lei do lenocínio) —, os visados avisaram que vão recorrer da decisão. Marinho Pinto, que não falará de cor, garantiu publicamente que o risco de prescrição é real.
Um processo é o que é e a justiça o que se sabe. Não vais ao cóquitel tás fodido, dizia o Cesariny.
Findo o primeiro round, os condenados cumprem o seu papel: recorrem. As vítimas regozijam-se, naturalmente. Um determinado tipo de reacções, ou a ausência delas, é que me espanta. Ou me envergonha.
Os que põem a mão no fogo pela inocência dos condenados (ou, pelo menos, pela de Carlos Cruz) usam dos mais variados argumentos. Da cabala política aos erros judiciários, do bode expiatório à inveja.
Os que não têm dúvidas sobre a decisão do tribunal clamam maioritariamente contra o tempo leve das penas (é verdade que se eu estivesse na pele do Bibi não hesitaria em pensar que cá no burgo a confissão não compensa…).
No intervalo, o absoluto silêncio. Em alternativa, um silêncio ruidoso e, como sempre, alicerçado no legalismo. Tomás Vasques escreve que se mantém fiel ao princípio da presunção de inocência até ao trânsito em julgado de sentença condenatória.
Parece-me bem mas deixo uma ou outra pergunta. Os arguidos foram ou não foram considerados culpados pelo Tribunal de Primeira Instância? A sua presunção de inocência sai ou não ferida neste primeiro acórdão, independentemente dos trâmites posteriores? E usando agora a muleta lançada pelo Marinho Pinho: se a coisa prescrever, como é possível que aconteça, qual será a posição do Tomás Vasques quando todos se safarem: vai considerá-los inocentes (à Leonor Beleza foi isso que aconteceu, não foi)?
Daniel Oliveira comenta o caso esperando que tenha sido feita justiça e mostrando-se sobretudo indignado — valha-lhe a retórica — com os jornalistas e com o Pedro Namora.
No Jugular, outro blogue de esquerda, sempre célere no apoio a todas as causas fracturantes, até ao momento em que escrevo a única referência consistia num post da Ana Matos Pires, que não faço ideia quem seja mas a falha é certamente minha, que esboça uma piada (?) sobre a relação entre a Casa Pia e a Maddie, remetendo para um jornal que também não costumo ler.
Não sou boa em listas e por isso fico-me por aqui.
Resumindo: nem uma palavra sobre as vítimas da Casa Pia (é que os miúdos foram mesmo repetidamente enrabados, topam?). Nem uma palavra sobre o padre António Emílio Figueiredo (já falecido) que denunciou o regabofe já nos idos de 60 e por isso foi para a rua (pois, temos pena mas este não era pedófilo). Nem uma palavra sobre o Mestre Américo Henriques, defensor dos putos e a quem a Costa Macedo decidiu pôr no sítio.
Resumindo que não me posso enervar: esta esquerda (desprovida de compaixão) não é a minha esquerda. Esta esquerda é quanto muito canhota.
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11 comentários:
Postei sobre o assunto. Infelizmente já tive de conviver, enquanto professora, com vítimas deste hediondo crime e sou particularmente sensível a este assunto.
Nesse dia, o meu pensamento e post foram para as vítimas.
Bj
No tempo do outro senhor, não havia os Ballet Rose? Ora, considerando que mudámos de uma ditadura corporativista para uma democracia corporativista (e torpe), seria de esperar que mudasse alguma coisa daquilo que é o essencial, o substrato, o húmus deste país?!
Quanto ao aspecto técnico do assunto, obviamente, de recurso em recurso até à prescrição final... tal como o país, que há muito prescreveu.
Transcrevo aqui dois comentários que deixei noutro blogue, e que resumem o que penso sobre isto:
1. A única coisa que, neste momento, dou como um dado adquirido é que foram infligidos abusos sobre crianças que se encontravam à guarda de uma instituição estatal; que esses abusos ocorreram de forma reiterada durante um largo período temporal; que vários governos ocuparam o poder em Portugal durante esse período; que em certos círculos próximos do poder político se falava desta questão à boca cheia. O que me leva à seguinte conclusão: independentemente de Carlos Cruz estar ou não a falar verdade, a teia é certamente assustadora, e nós nem da missa a metade sabemos – se é que algum dia saberemos.
2- Não sei se, neste caso, as condenações foram feitas em cima de joelho ou se essa é uma ideia que nos está a ser impingida por alguns dos condenados. No comentário anterior apenas elenquei o que me parece inquestionável; não tomo uma posição relativamente às condenações, porque isto tornou-se tão confuso que é complicado - impossível? - a quem está de fora tomar uma posição definitiva.
(Esta esquerda há muito que é desprovida de compaixão, seja pelo que for, e também não é a minha esquerda.)
as pessoas levaram tantos anos a achar que o processo "casa pia" não ia ter condenados e agora, que os teve, duvidam da condenação, o que me leva (eu sei que é simplista) a que, no geral, as pessoas estão é interessadas em contestar o sistema judicial.
Assim, pode-se mesmo ir ao ponto de imaginar que é mais fácil um tipo (que tenha meios de comunicar com as pessoas) reabilitar-se perante a sociedade se condenado por um tribunal.
Até o Tribunal ler a sentença estes arguidos eram inocentes.
Depois do Tribunal os condenar estes Srs.são culpados, até prova em contrário.
Será que de repente esta lógica deixou de existir?
Vícios privados... públicas virtudes (ocorreu-me). Querem ver que, afinal são todos inocentes?!?!?
Gosto da imagem escolhida.
Outro dia mandei-te uns recados. Dissimulados é verdade. Um dia talvez te explique ou se calhar já percebeste."Esta esquerda (sem compaixão) não é a minha esquerda". É isso. Gostei muio do teu texto sobre as vítimas esquecidas que evidencia as tuas boas intenções. Não estive no Camões, mas não me importo de participar em lutas ao lado de tias queques e insuportáveis, se a causa for justa. Faz-se um sacrifício, engole-se um sapo.
Lourdes, acho que este país enlouqueceu. Será que terá que ver com o facto de andar por aí tanta gente a tirar cursos de direito?
-:)
Um abraço
Se me permites uma modesta achega, ela aqui vai:
«Esta esquerda é, quanto muito, À canhota.»
fallorca, um poeta é um poeta; à canhota é muito melhor.
Pois, também tenho de ficar por aqui que não me posso enervar. O que vale é que o Manuel António de Pina existe, para nosso consolo, que ainda somos de esquerda e da que não é canhota.
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