30/05/12

Vamos ser rigorosos, isto é uma conversa de merda

«(...) Filipe Neto Brandão, do PS, questionou por que razão Relvas omitiu essa informação há duas semana, quando teve o cuidado, por exemplo, de referir um encontro casual numa festa no Algarve.
"Fala numa festa de aniversário e omite um encontro desta natureza?!", indagou o socialista.
"Eu não omiti. Eu não tive um encontro com Jorge Silva Carvalho, tive um encontro entre a administração da Finertec e a administração da Ongoing. Vamos ser rigorosos, eu não vim cá falar da minha vida empresarial", defendeu-se o ministro-adjunto.
 AQUI

Buques

28/05/12

Uma conspiração de estúpidos

Se José Luís Arnaut tem razão, e falta à Grécia aquela qualidade “natural” que podemos admirar no faisão e na perdiz da célebre natureza morta de Renoir, ou mesmo em qualquer nação gerada por Deus na véspera do shabat, o que dizer do “paraíso artificial” que é indiscutivelmente este coiso, perdão, este jardim à beira-mar plantado cantado por Tomás Ribeiro?
Porque se é vero que, desaparecidos os loiros e as acácias olorosas, a noite de estrelas rutilante apenas ilumina autoestradas, tendo as torrentes alterosas dado lugar a barragens de um glorioso amarelo, nem por isso as aves gorjeiam menos noite e dia. Aves raras.
Tivesse Baudelaire conhecido o Portugal de hoje, e ao ópio, ao vinho e ao haxixe decerto acrescentaria a classe dirigente lusa, a qual, sem recurso conhecido a psicotrópicos, bombardeia o país com doses maciças de gás hilariante.
É assim que temos um ex-espião que descobre a sua queda para o coiso consumindo “O Santo” na infância, a que acresce, já na idade adulta, o modo pouco smart como deixa que o DIAP lhe game o smartphone, facto que nos permite suspeitar que em algum momento da vida terá telefonado ao pai, bradando, à maneira de Loureiro, “pai, já sou espião!”
Segue-se um ministro que, intérprete de uma versão série B do “J. Edgar” de Eastwood, ameaça uma jornalista de publicar na Internet pormenores da sua vida privada, desconhecendo, porventura, que na era do facebook a vida privada já não é como soía.
Para apimentar o plot, veio o mesmo negar as acusações pedindo porém desculpa pelo coiso, o que nos leva aquela frase avisada de Groucho: “Ele pode parecer um idiota e agir até como um idiota, mas não se deixe enganar: ele é mesmo um idiota!"
E bote plurais nisso.

25/05/12

Uma boa piada é uma boa piada é uma boa piada [e para desenjoar das piadas do Relvas]


Angela Merkel decidiu descansar dois dias, com o marido, num hotel rural em França, próximo da fronteira alemã.
Foi aí que se registou o seguinte diálogo entre o guarda fronteiriço e a chanceler:
— Nacionalidade?
— Alemã.
— Ocupação?
— Não. Venho só passar o fim-de-semana.

[roubado ao Tomás Vasques no facebook]

20/05/12

Leave the kids alone

A semana passada fiquei a saber três coisas que gostaria de partilhar com o leitor, se este não levar a mal.
A primeira (a ordem é aleatória, são todas péssimas…) é que existe um pediatra indignado por ter falhado nas farmácias um dos medicamentos prescritos para crianças que sofrem do chamado Distúrbio de Deficit de Atenção.
A falta de tal medicamento, cuja substância activa é o metilfenidato, um psicoestimulante que actua sobre o sistema nervoso central, “pode levar crianças a chumbar”. Desta vez nem o eduquês nem o ministro eram chamados à colação. A matéria ficava ao nível da ‘Lucy in the sky with diamonds’, mas, dizem, sem riscos de maior. E para menores.
Nas palavras do pediatra indignado, “As crianças querem estudar e não conseguem. Sem estudo e concentração não conseguem boas notas. Estão a ser empurradas para o insucesso escolar e até para a reprovação".
Ainda mal refeita do choque (I beg your pardon, o que é mesmo que andam a dar aos putos para eles terem boas notas?!), fiquei a saber, também através dos jornais, que numa escola do 1º ciclo de Portimão os recreios passaram a ser patrulhados por alunos e professores no âmbito do projecto PSP (Patrulha de Segurança do Pontal).
As equipas, constituídas por dois alunos por turma, terão que registar os colegas indisciplinados, cujos nomes serão depois exibidos em lugar público e bem visível. Com o cérebro ainda a oscilar entre os “queixinhas” do meu tempo e a Revolução Cultural Chinesa com os seus rituais de humilhação públicos, levo com a terceira notícia. Um livro sobre a crise em duas versões, uma para “miúdos de esquerda” e outra para “miúdos de direita”!
Como diria o Eliot, foi mesmo “very much reality” numa semana.

17/05/12

O Pedro Bidarra vai a todas, ele é West Coast, ele é Allgarve, ele é células estaminais

Hoje foi um dia para esquecer e macacos me mordam se isto não anda tudo ligado.
Começou com o Arnaut a dizer que "a Grécia é um país inventado".
Acaba com o Pedro Bidarra, parece que grau 33 do marketing e publicidade, a mostrar uma campanha sobre células estaminais que está a indignar pais, futuros pais e gente ligada à ciência e à ética da ciência (não vou dizer "gente de bem" porque poderia parecer mal).
A coincidência, porque ele há mesmo coincidências do caraças, é que se trata do mesmo Bidarra que nos vendeu a West Coast, essa ideia brilhante em que se associou ao não menos brilhante ministro Manuel de Pinho.
Na altura, o guru publicitário garantia que a West Coast tinha «associações "aspiracionais" – Hollywood ou Silicon Valley, por exemplo – que sem nada termos que fazer contaminam o conceito positivamente, tornando-o mais glamouroso e mais cosmopolita. Depois há as pontes e colinas de Lisboa e S. Francisco, o Vale do Douro e o Napa Valley, a aridez da Baja Californiana e o nosso Alentejo, coincidências felizes que é só aproveitar.
Agora diz que a actual «campanha é forte e tem uma componente de serviço público, para educar as pessoas».
Ó Pedro Bidarra, cá para mim quem precisava de ser (re)educado eras tu. Em alternativa, podias ir tratar da imagem da Coreia do Norte que anda muito por baixo.

Frases que mereciam um pano encharcado na cara

"A GRÉCIA É UM PAÍS INVENTADO; ERA UMA PROVÍNCIA DO IMPÉRIO OTOMANO", José Luis Arnaut (ex-Ministro Adjunto de Durão Barroso e Ministro das Cidades e etc. do governo de Santana Lopes) ontem à noite na SICN

Frases com sentido

Não conhecia esta frase do Mia Couto, mas é absolutamente verdadeira: "A maior desgraça de uma nação pobre é que em vez de produzir riqueza, produz ricos". Ora bem.

13/05/12

"Miúdos de Esquerda" e "Miúdos de Direita" é uma coisa obscena e uma ideia de merda com M grande

O autor do texto do livro "A Crise explicada às crianças (de direita e de esquerda)" disse que "queria experimentar esta coisa de escrever para os mais novos, tenho ideias para vários livros, mas esta foi a primeira a surgir, e calha bem com o tempo que estamos a viver".
Ele pode experimentar "as coisas" que quiser, mas só num país transformado numa latrina é que coisas destas são levadas a sério. Hoje estou Indignada e não é com os 15% de desemprego.
Mas, afinal, isto anda mesmo tudo ligado. Vómito.

12/05/12

Vou tentar fazer uma também em grego mas não prometo

Honi soit qui mal y pense (só para francófonos) 

Listen very carefully, I shall say this only once.
Papagaio de Flaubert. Bouvard e Pécuchet. Bouvard e Pécuchet, canal Saint Martin. Canal Saint Martin, Jean Gabin. Gabin, Yves Montand. Yves Saint Laurent.
Ostras. Magret de pato. Georges Perec. Pont-l’évêque.
Paul Verlaine. Maurice Blanchot. Jean Giraud. Henry de Montherlant. Arthur Rimbaud. Jean-Marie Gustave Le Clézio.
Croissant. Boris Vian. Roger Vailland. Guy de Maupassant.
Claude Simon. Jacques Vaché. Cassoulet. Georges Méliès.
Jean Renoir. Renoir. Jean-Luc Godard.
Jacques Prévert. Guillaume Apollinaire.
Place des Voges. Ile d’Aix. La Rochelle. Fernandel. Céline.
Je m'appelle Ferdinand.
Cognac. Honoré de Balzac. Julien Gracq. Crepes de chocolate.
Auvergne (bleu). Raymond Queneau.
Notre Dame de Paris.
Cyrano. Panache. Pastis. Chablis. René Goscinny. Madame Bovary.
Mademoiselle Chanel.
Une femme est une femme.
Proust. Madalenas. Petits fours. Framboesas. Caracoletas. Cuscuz.
Bordeaux grand cru. Bordéus. Bretanha. Bourvil.
Il pleut sur Nantes : Barbara.
Brassens : Quand on est con, on est con.
Albert Camus. Albert Cohen. Belmondo [até aos 35].
Roquefort. Allez, français, encore un petit effort!
Camembert moulé à la louche. Coluche.
François Truffaut. Alain Resnais. Claude Monet. André Dussolier.
Sena. Pontes do Sena. Sous le pont Mirabeau coule la Seine/ Et nos amours.
Sous le pavé, la plage.
Charles Baudelaire. Charles Trenet. Léo Ferré.
Charles de Montesquieu. Gérard Depardieu.
Michel de Montaigne. Michel Piccoli. Pierre Arditi. Jacques Tati. Claude Chabrol. Sabine Azéma. Serge Gainsbourg. Ratatouille.
Aunac. Armagnac.
Bayers. Angoulême.
Astérix. Obélix. Assurancetourix: Non, tu ne chanteras [plus]! Non, tu ne chanteras [plus]!

08/05/12

É preciso saber reconhecer um grande texto quando tropeçamos nele

O nosso mais sagaz comentador observou que a morte de Miguel Portas instaurou um período de tréguas na sociedade portuguesa ou, pelo menos, na que tem algum reflexo nos meios de comunicação. Apesar de fazer um esforço para me afastar do ruído comum, acho que percebo a anotação. Durante alguns dias ouviram-se algumas vozes raras e calaram-se outras. Além do mais, entrava-se no período que vai de 25 de Abril ao 1.º de Maio e que o ritual democrático ainda em vigor respeita como uma páscoa da esquerda. Interventores menos habituais ou o registo emocional que a perda de Miguel Portas teve o condão de libertar nos habituais representantes da esquerda mediática revelaram um aspecto interessante: como disse Marisa Matias, não podemos viver sem esperança. Não podemos viver sem pão, sem grupos sociais, sem esperança e sem pessoas de referência que exprimem o que há de melhor em nós, o que em nós ainda acredita. Muitos dos que escreveram ou falaram mal tinham conhecido o Miguel Portas. Tinham-se cruzado ou estado juntos numa iniciativa, lido uma entrevista ou um livro, assistido a um debate, ouvido um comentário.
Há um período na vida das crianças em que estas parecem ter um amigo imaginário. Brincam com ele, reservam-lhe um espaço no carro da família, dão-lhe um nome, adormecem com ele. Geralmente, não querem partilhá-lo com a família ou com os pares, e calam-se quando alguém tenta imiscuir-se no seu mundo reservado. Aos três anos, Simone tinha dois amigos. Um era Anonas, talvez um rapazinho. O outro era Febo. Como Simone tinha também uma irmã mais velha, as deslocações de carro tornaram-se penosas. Anonas e Febo não cabiam no banco de trás, tinham de usar cadeirinha e cinto. Os pais e a irmã eram pacientes. Perceberam que se tinham transformado numa família numerosa. Conseguiram uma carrinha familiar em segunda mão, uma cadeirinha e um banco elevatório emprestados. Havia sempre um momento de pânico ao entrar na carrinha. Faltava alguém? O cinto de Anonas estava demasiado apertado? Simone era discreta. Mas quando, numa ocasião, admoestou o pai por este fechar a porta sem cuidado e quase magoar Febo, este começou a preocupar-se. Um dia, os amigos partiram. Primeiro Febo, mas Febo nunca fora verdadeiramente importante. Depois Anonas, e Simone adoeceu de tristeza. O carro de sete lugares já não fazia sentido. Uma tarde de domingo, quando rolavam numa estrada na direcção do mar, Simone alegrou-se. Do lado de fora, correndo ao lado do carro, vinha Anonas. Devia correr bem perto da janela, porque Simone colou o nariz ao vidro e durante algum tempo disse frases incompreensíveis onde se distinguia bem o nome do amigo. Depois Simone deixou de falar de Anonas. Depois deixou de falar. E um dia estava curada, tinha crescido e estava disponível para os meninos e meninas reais da escolinha.
Tenho uma amiga que não me proibiu de contar a sua história. É uma mulher alegre e extrovertida, e na infância deve ter sido hiperactiva sem défice de atenção. É primatóloga e veste-se com um estilo indefinível que remete para os locais exóticos da sua investigação. Tem um namorado imaginário há dez anos. Com nome, Bill, e residência ao Príncipe Real. Profissão, gostos cinematográficos, família, embora distante. Os amigos não o conhecem, porque Bill não gosta deles, só de ouvi-la falar. Passam férias e fins-de-semana em destinos maravilhosos de onde ela envia SMS de contentamento infantil. “Estou a sobrevoar o delta do Mekong com o Bill.” “ Estou a conduzir um Ferrari com o Bill.” “ Fui raptada no mercado de Pu Teh. Pelo Bill.” Às vezes, raramente, ele parece cometer um erro de escolha. Mas, mesmo nessas ocasiões, percebemos que é guiado pela imaginação dela: sexo desenfreado em hotéis de sete estrelas, sexo demais, estrela a mais.
Há uns tempos, o Bill zangou-se. Desapareceu, depois de uma cena de ciúmes com um rival imaginário, um primata por quem ela tinha apenas uma paixão científica e com quem dormira por cansaço e amizade. Acabaram-se os fins-de-semana românticos e as inumeráveis citações: o Bill acha isto, o Bill gosta daquilo, o Bill disse não-sei-o-quê. Já não havia Bill. Podia escrever calmamente os seus trabalhos, fazer conferências ao sábado, acompanhar os alunos em ausências intermináveis, ter reuniões com os comités e as task forces. O Bill já não se queixava. O Bill já não dizia nada.
Não se pode viver sem esperança. A tristeza pela perda do Bill foi tão verdadeira e desoladora, tão deprimente e difícil de suportar como a de outro companheiro mais real. O fim do socialismo real custou tanto aos que nele tinham depositado a esperança de uma vida como o fim da utopia do socialismo aos que deixaram de acreditar. Como diz António Barahona, aliás Muhammad Ashraf, novo guru dos nossos jovens poetas: este Ocidente sem deus nem fé não é feliz.
AQUI

A book a day keeps the doctor away: "O Legado de Humboldt", Saul Bellow

Quando Humboldt Gift (romance onde as ideias se confundem com as personagens mas as personagens são de carne e osso) foi impresso, em 1975, Saul Bellow era já um peso-pesado das letras.
No ano seguinte, o livro ganha o Pulitzer e o seu autor nem mais nem menos do que o Nobel da Literatura, três décadas eram passadas sobre Na Corda Bamba, a sua estreita literária.
Apesar do reconhecimento – que Herzog, de 1964, apenas ajudara a consolidar – o talento de Bellow não gera unanimidade. Nabokov, por exemplo, não hesitou em classificá-lo medíocre, embora, neste caso, a apreciação trouxesse um bónus: o autor de Lolita pensava o mesmo de Dostoievsky, Faulkner ou T.S.Eliot. Outros houve que preferiram condená-lo pelo rumo conservador das suas convicções, não deixando sequer de fora a acusação de racismo (reforçada pela célebre boutade “Onde está o Tolstoi dos zulus? O Proust dos papuas?”) e, claro, de misoginia.
Detractores à parte, razão teria Philip Roth quando disse que a espinha-dorsal da literatura norte-americana do século XX assenta em William Faulkner e Saul Bellow. Martin Amis chamou-lhe “uma força da natureza” e o ensaísta Roger Shattuck afirmou: “Bellow é incapaz de escrever uma página desinteressante”. Lemos as 527 páginas de “O Legado de Humboldt” e confirmamos: não nos enfastiámos uma única vez.
Saul Bellow, com razão, chamou a O Legado de Humboldt um “livro cómico sobre a morte”. E num escritor que não teve problemas em afirmar, contracorrente, que a ficção é a forma mais elevada de autobiografia, é sem espanto que descobrirmos que Humboldt é uma versão ficcionada do poeta Delmore Schwartz, embora, na realidade, o romance seja sobretudo sobre Charles Citrine, personagem que se deixa colar, sem grande dificuldade, ao próprio Bellow.
Se acrescentarmos agora que O Legado de Humboldt é uma mistura arrebatadora de Marx Brothers, Kafka e "Eclesiastes", antroposofia, capitalismo e poesia, não estaremos a enganar demasiado o leitor. Domina-o um ambiente burlesco e caótico, e é neste que se projecta o desejo de imortalidade e a busca do sagrado. O início antecipa uma morte anunciada e o fim decorre num cemitério (a última cena é das coisas mais comoventes e simultaneamente mais hilariantes que Bellow escreveu).
Charles Citrine é um intelectual de meia-idade, judeu de Chicago de origem modesta, colector de prémios literários e autor de um tremendo êxito da Broadway que lhe rendeu bom dinheiro. De tipo melancólico e contemplativo, encontra-se em crise de inspiração, às voltas com um divórcio do qual se arrisca a sair arruinado (a reunião no tribunal com o juiz e os advogados é de antologia), e uma amante cara e exigente. A morte do seu antigo amigo e mentor Humboldt, poeta genial arrastado para a miséria pela loucura e pelo materialismo galopante de uma América cada vez mais hostil à poesia, fá-lo reflectir, conjugando-se aquela com o aparecimento de Rinaldo Cantabile, mafioso de segunda linha que insiste em safar Citrine da previsível penúria, recorrendo para isso a todo o tipo de expedientes, inclusive ao legado de Humboldt, à primeira vista sem valor.
À medida que a existência de Citrine se vai tornando mais errática, mais ele próprio se afunda em desconcertantes reflexões sobre a vida do Espírito pós mortem, tentando, sem grande êxito, entender e aplicar os ensinamentos esotéricos de Rudolf Steiner, numa tentativa de vencer o terror da morte e mergulhar numa “esfera superior”, na qual êxito e fracasso mundanos deixariam de ser preocupação.
A vida, contudo, no seu tumulto, encarregar-se-á de reconduzir Citrine à sua condição mais simples e primordial, a de “um rapaz da cidade” a quem restam as memórias de um mundo que já não existe, capaz, ainda assim, de fazer o Bem. Maravilhoso!
O Legado de Humboldt, Saul Bellow, 2012, Quetzal, trad. de Salvato Telles de Menezes

06/05/12

Aux armes et cetera

Imaginem o Cavaco Silva a dizer isto sem se rirem*

Nous ne sommes pas n’importe quel pays de la planète, n’importe quelle nation du monde. Nous sommes la France.
François Hollande

*e já agora imaginem a Merkel...

Das vitualhas e dos ajuntamentos ou a prova provada de que isto anda mesmo tudo ligado

“Quantas pessoas terá de envolver o ajuntamento para que possa merecer o qualificativo de manifestação? Eis um problema cuja resolução tem atormentado os espíritos e esvaziado as penas de alguns dos mais prestigiados constitucionalistas alemães: sete, dizem uns; três, afirmam outros; duas bastam, replicam ainda alguns. Perante a transcendência de tal imbróglio, a nossa opinião, certamente de pouco préstimo, vai no sentido de considerar que, sendo duas pessoas já uma pluralidade, esse número deverá ser suficiente”.
Campanha Alegre? Não, não é Eça de Queirós.
É um excerto do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República. No caso, o tal parecer referido por Carla Duarte (a mesma que aconselhara os jornalistas a usar coletes identificadores nas manifestações porque, afinal, “qualquer manifestante que acabou de arremessar uma chávena ou uma cadeira contra a PSP pode dizer que é jornalista”) para justificar o seguinte: “Duas pessoas já fazem uma manifestação”.
A PGR é a PGR mas Carla foi mais longe: citou o Decreto-Lei nº 406/74.
Li-o com apropriada reverência, e se o refiro é porque logo no Ponto 2 do Artigo 2º (onde se declara que a vontade de alguém se manifestar deve ser comunicada às autoridades competentes, porventura também ao médico de família embora isso não fique claro) se diz que tal comunicação deve ser assinada “por três dos promotores”.
Para que são precisos três se dois bastam, é um imbróglio cuja transcendência trinitária me atormenta.
Espero vir a ser esclarecida por Carla Duarte, apesar de a porta-voz da PSP estar persuadida que “a PSP não tem que justificar a sua actuação”. Olhe que tem, Carla, olhe que tem. Pelo menos enquanto Alexandre Soares dos Santos não for Presidente desta coisa.

03/05/12

Alexandre Soares dos Santos à presidência da república ou finalmente é desta que vai chegar o Encoberto

A cadeia de supermercados que, paradoxalmente, fez parar o país no 1º de Maio, já veio esclarecer através do seu director-geral que a campanha de descontos foi movida pela "grande preocupação social" do grupo.
O mesmo senhor, o director-geral, garantiu que a lei da concorrência foi cumprida e que não perderam dinheiro (esta última afirmação leva-me a perguntar quanto ganharão as criaturas quando não fazem descontos...).
Prevejo, mas posso estar enganada, que Soares dos Santos ainda se vai candidatar a presidente desta coisa, e prevejo também que durante a campanha para a presidência desta coisa serão distribuídos brioches. Milhões. E gratuitamente. Imagem do filme Viridiana, 1961, de Luis Buñuel