Num estilo cru e descritivo, Ferdinand von Schirach relata-nos em Crimes uma série de actos criminosos, quase sempre sanguinolentos e ferozes, conseguindo ainda assim que sintamos empatia pelos seus autores. Fá-lo sem interferência do narrador, sem sentimentalismo ou demagogia. Limitando-se a contar, von Schirach, advogado de profissão, conduz-nos àquele estado de compreensão compassiva pelas personagens que teve em Tolstoi o grande cultor.
São onze histórias (que mereciam revisão mais cuidada). A última acaba bem e respiramos de alívio.
Crimes é difícil de catalogar. Não se trata de um policial, embora em todas as histórias haja delitos por desvendar; nem de literatura de “suspense”, embora alguns contos possam causar calafrios. É mais assim como um salto no escuro, com a crueldade a beber das suas circunstâncias.
Um velhinho afável perde a paciência ao fim de anos de casamento. Três delinquentes metem-se com quem não deviam. O desamor de um pai severo conduz a família à tragédia. Um jovem libanês tido como “palerma” salva os irmãos em tribunal. Uma jovem emigrante sem papéis acaba na profissão errada mas a sorte chega por um fio. Um casal sem dinheiro enfrenta um industrial rico numa acusação de assassínio que fica por esclarecer. Dois facínoras são mortos em legítima defesa por um homem misterioso. Um rapaz psicótico tem a estranha mania de matar ovelhas e arrancar-lhes os olhos. Um erro administrativo coloca um guarda de museu a vigiar a mesma estátua durante décadas e a coisa acaba mal. Um estudante apaixonado adquire um gosto bizarro por sangue. Finalmente, um homem bom assalta um banco mas acaba condenado apenas a dois anos….
A culpa, a verdade, a sorte e o azar confrontam-se nestes contos narrados à flor da pele. E se a realidade nem sempre é o que parece, os factos, esses, estão lá, peças de um puzzle em que o resultado, como na vida, é diferente da simples soma das partes.
Crimes, Ferdinand von Schirach, Dom Quixote, 2010, trad. de João Bouza da Costa
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