30/09/09
29/09/09
Peço imensa desculpa mas as notícias não são boas nem me parece que venham a melhorar nos próximos tempos
O Serviço Nacional de Saúde português ― apesar de na recente campanha eleitoral Sócrates ter usado de novo e até ao vómito aquela coisa da mortalidade infantil ter decrescido espectacularmente e tal ... ― está entre os piores da Europa: 25.ª posição num universo de 33 países.
Se recordarmos a firme defesa do SNS feita pelo grande líder nas últimas semanas, concluo que a culpa é com certeza dos doentes que em vez de adoecerem assim de qualquer maneira deviam mas é comprar painéis solares, de preferência os da empresa Energie que têm um sistema bestial capaz de funcionar com sol, céu nublado, chuva e à noite.
28/09/09
Paradoxos democráticos: a % das abstenções é superior à % de votos obtida por qualquer partido ― um dia destes ainda vão tornar o voto obrigatório
PS ― 36, 56%
PSD ― 29,09%
CDS-PP ― 10,46%
BE ― 9,85%
PCP-PEV ― 7,88%
...
Abstenções ― 39,40%
Nulos ― 1,31%
Brancos ― 1,75%
Daqui
PSD ― 29,09%
CDS-PP ― 10,46%
BE ― 9,85%
PCP-PEV ― 7,88%
...
Abstenções ― 39,40%
Nulos ― 1,31%
Brancos ― 1,75%
Daqui
27/09/09
A book a day keeps the doctor away
Apesar do que se diz ― a escrita ser a mais solitária das artes e tal (e é bem capaz de ser verdade…) ― produções literárias a várias mãos não são uma raridade. E nem precisamos de recuar ao Livro primordial (a Bíblia, naturalmente) para o comprovar. Um dos textos mais famosos da literatura portuguesa não tinha um autor mas três. Falamos de Novas Cartas Portuguesas, que, publicado com grande escândalo em 1972, trazia assinatura de Maria Velho da Costa, Maria Teresa Horta e Maria Isabel Barreno. A primeira, aliás, reincidiria várias vezes nas parcerias.
Quem ama, odeia pertence a essa categoria da escrita colectiva. No caso, também criativa. No sentido nobre do termo.
Os seus autores, o casal formado pelos argentinos Silvina Ocampo (1903-1993) e Adolfo Bioy Casares (1914-1999), ensaiam um texto de estrutura policial, paredes-meias com o fantástico, um género que Bioy Casares levaria mais tarde à perfeição com A Invenção de Morel, muito antes de alguém poder falar de realidade virtual ou de Second Life. E se os capítulos de Quem ama, odeia não trazem autoria, nem por isso é difícil ao leitor imaginar o que se devem ter divertido Silvia e Adolfo, cada um passando ao outro a continuação do mistério.
Um médico homeopata, Humberto Huberman, parte de férias para o mar. O hotel onde se aloja, propriedade de familiares afastados, situa-se em paisagem bizarra, sempre sujeito a temíveis tempestades de areia (que obrigam a janelas blindadas), rodeado de bosques labirínticos e de um sapal povoado de caranguejos. Nele terá lugar a morte de um dos hóspedes, envenenado por uma dose mortal de estricnina.
As férias literárias imaginadas pelo erudito Huberman (que levava na bagagem Satiricon, de Caio Petrónio, tendo prevista a sua adaptação) transformam-se, assim, ironicamente, numa caça ao assassino do Bosque del Mar.
Claro que o que conta aqui não é, em primeiro lugar, o deslinde do crime. Quem ama, odeia é, sobretudo, uma piscadela de olho literária, um divertissement cheio de malícia, um exercício de escrita exemplar. Pisamos terreno lúdico. Como é fácil de perceber, logo no final do primeiro capítulo, face às perguntas a roçar o sarcástico de Huberman: “Quando renunciaremos ao romance policial, ao romance fantástico e a todo esse fecundo, diversificado e ambicioso campo da literatura que se alimenta de irrealidades? Quando encaminharemos os nossos passos para a picaresca saudável e para o ameno quadro de costumes? O cheiro a maresia já começava a penetrar pela janela. Fechei-a. Adormeci.”. É todo um programa.
O mesmo “programa” que conduziria Jorge Luis Borges, amigo do casal, por aqueles caminhos que infinitamente se bifurcam.
A vertigem que assola o leitor de Quem ama, odeia perante as várias hipóteses que vão sendo criadas para solucionar o crime é semelhante aquela que se apodera de nós quando entramos pelos universos borgeanos adentro, reproduções ad infinitum de si próprios. Aqui, contudo, há uma solução última. Algo pueril, talvez, mesmo se marcando de morte a inocência. Ou, quem sabe, seria precisamente isso o pretendido. Porque quem ama, odeia. Esse é ponto de partida e de chegada.
Não se espere, porém, apesar do título, uma novela romântica. O amor está lá, com os seus equívocos, mas o que sobressai é o distanciamento dos autores que o contam. Cristalinos, modernos e divertidos: “Quanto a mim, redigi as páginas que acabais de ler, porque algumas amigas da minha mãe – as únicas amigas que tenho – quiseram que a minha actuação na pesquisa ficasse documentada”.
E depois viveram felizes para sempre. O casal protagonista do livro, à imgem de Silvina Ocampo e Adolfo Bioy Casares.
Quem ama, odeia pertence a essa categoria da escrita colectiva. No caso, também criativa. No sentido nobre do termo.
Os seus autores, o casal formado pelos argentinos Silvina Ocampo (1903-1993) e Adolfo Bioy Casares (1914-1999), ensaiam um texto de estrutura policial, paredes-meias com o fantástico, um género que Bioy Casares levaria mais tarde à perfeição com A Invenção de Morel, muito antes de alguém poder falar de realidade virtual ou de Second Life. E se os capítulos de Quem ama, odeia não trazem autoria, nem por isso é difícil ao leitor imaginar o que se devem ter divertido Silvia e Adolfo, cada um passando ao outro a continuação do mistério.
Um médico homeopata, Humberto Huberman, parte de férias para o mar. O hotel onde se aloja, propriedade de familiares afastados, situa-se em paisagem bizarra, sempre sujeito a temíveis tempestades de areia (que obrigam a janelas blindadas), rodeado de bosques labirínticos e de um sapal povoado de caranguejos. Nele terá lugar a morte de um dos hóspedes, envenenado por uma dose mortal de estricnina.
As férias literárias imaginadas pelo erudito Huberman (que levava na bagagem Satiricon, de Caio Petrónio, tendo prevista a sua adaptação) transformam-se, assim, ironicamente, numa caça ao assassino do Bosque del Mar.
Claro que o que conta aqui não é, em primeiro lugar, o deslinde do crime. Quem ama, odeia é, sobretudo, uma piscadela de olho literária, um divertissement cheio de malícia, um exercício de escrita exemplar. Pisamos terreno lúdico. Como é fácil de perceber, logo no final do primeiro capítulo, face às perguntas a roçar o sarcástico de Huberman: “Quando renunciaremos ao romance policial, ao romance fantástico e a todo esse fecundo, diversificado e ambicioso campo da literatura que se alimenta de irrealidades? Quando encaminharemos os nossos passos para a picaresca saudável e para o ameno quadro de costumes? O cheiro a maresia já começava a penetrar pela janela. Fechei-a. Adormeci.”. É todo um programa.
O mesmo “programa” que conduziria Jorge Luis Borges, amigo do casal, por aqueles caminhos que infinitamente se bifurcam.
A vertigem que assola o leitor de Quem ama, odeia perante as várias hipóteses que vão sendo criadas para solucionar o crime é semelhante aquela que se apodera de nós quando entramos pelos universos borgeanos adentro, reproduções ad infinitum de si próprios. Aqui, contudo, há uma solução última. Algo pueril, talvez, mesmo se marcando de morte a inocência. Ou, quem sabe, seria precisamente isso o pretendido. Porque quem ama, odeia. Esse é ponto de partida e de chegada.
Não se espere, porém, apesar do título, uma novela romântica. O amor está lá, com os seus equívocos, mas o que sobressai é o distanciamento dos autores que o contam. Cristalinos, modernos e divertidos: “Quanto a mim, redigi as páginas que acabais de ler, porque algumas amigas da minha mãe – as únicas amigas que tenho – quiseram que a minha actuação na pesquisa ficasse documentada”.
E depois viveram felizes para sempre. O casal protagonista do livro, à imgem de Silvina Ocampo e Adolfo Bioy Casares.
26/09/09
25/09/09
E que nem a propósito da ordem de Amado para que se trocasse a honra por um prato de lentilhas, acaba de sair a Breve História dos Judeus em Portugal
... lembrando-nos que se o governo, hoje, cedeu à queima dos livros, Salazar, ontem, havia cedido à queima de homens.
"(...) os cônsules de carreira não poderão conceder vistos consulares sem prévia consulta ao Ministério aos estrangeiros de nacionalidade indefinida, contestada ou em litígio, aos apátridas, aos portadores de passaportes Nansen e aos Russos; (...) àqueles que apresentem nos seus passaportes a declaração ou qualquer sinal de não poderem regressar livremente ao país de onde provêm; aos judeus expulsos dos países da sua nacionalidade ou daqueles de onde provêm."
Circular 14, de 11/11/1939 in Breve História dos Judeus em Portugal, Jorge Martins, Vega, 2009
Na imagem, refugiados judeus partindo de Lisboa para os EUA
"(...) os cônsules de carreira não poderão conceder vistos consulares sem prévia consulta ao Ministério aos estrangeiros de nacionalidade indefinida, contestada ou em litígio, aos apátridas, aos portadores de passaportes Nansen e aos Russos; (...) àqueles que apresentem nos seus passaportes a declaração ou qualquer sinal de não poderem regressar livremente ao país de onde provêm; aos judeus expulsos dos países da sua nacionalidade ou daqueles de onde provêm."
Circular 14, de 11/11/1939 in Breve História dos Judeus em Portugal, Jorge Martins, Vega, 2009
Na imagem, refugiados judeus partindo de Lisboa para os EUA
24/09/09
Mais uma sugestão: devíamos fazer como Loretta, a mulher do xerife Bell, que nunca lia jornais e por isso sobreviveu ao inferno
Confirmar a eficácia da sugestão (re)lendo Este País Não É para Velhos (Cormac McCarthy, tradução de Paulo Faria, Relógio D'Água)
23/09/09
"Aqueles que queimam livros, acabam mais cedo ou mais tarde por queimar homens" e só por isto este governo devia ir para o olho da rua
"O animal defende a queima de livros", terá dito Carrilho para Amado, ministro dos Negócios Estrangeiros e diplomata atento aos pormenores, como aquele de conseguir distinguir o centro de detenções de Guantánamo da base militar de Guantánamo.
"De acordo, de acordo. Mas só os escritos por judeus...", terá respondido o rigorista cofiando a barba. "Além disso, andamos a ver se o Egipto nos dá uma mãozinha para entrarmos no Conselho de Segurança... Imagine o prestígio que isso traria a Portugal!"
E foi quando Carrilho suspirou, lembrou-se do Heine e teve saudades da filosofia moral de Kant.
"De acordo, de acordo. Mas só os escritos por judeus...", terá respondido o rigorista cofiando a barba. "Além disso, andamos a ver se o Egipto nos dá uma mãozinha para entrarmos no Conselho de Segurança... Imagine o prestígio que isso traria a Portugal!"
E foi quando Carrilho suspirou, lembrou-se do Heine e teve saudades da filosofia moral de Kant.
Outra sugestão: também nos podíamos suicidar todos dia 27 e deixá-los sozinhos a espiarem-se à vontade
'Cause suicide is painless
it brings on many changes
and I can take or leave it if I please.
...and you can do the same thing if you please.
22/09/09
Uma sugestão: em nome da minha sanidade mental
POR FAVOR CLIQUE AQUI ― Vai sentir-se melhor, garanto
21/09/09
20/09/09
As minhas alfaces aparecem no google earth: será que é um assunto de estado que interesse a joão marcelino ou ao josé manuel fernandes?
A gente lê esta notícia, esta, esta e esta, mais esta, esta e esta, ou mesmo esta, ou até esta, que já não é notícia mas é muito boa, etc. e etc., e fica é com uma enorme vontade de recolher as alfaces abusivamente espiadas.
Pela parte que me toca as minhas já estão a salvo: comi-as em salada temperada com queijo, azeitonas, azeite gourmet e vinagre balsâmico, tudo do pingo doce.
19/09/09
Opereta lusa: mas se um país foi destruído porque uns tipos inventaram que nele se escondiam armas de destruição maciça porque não umas escutazinhas?
A política tornou-se num nojo. Talvez sempre tenha sido. Mesmo antes de Maquiavel. Eu porém fui formada num tempo em que a política trazia consequências. Perdoem-me o desabafo, mas é que venho de uma família que passou pelo Hospital de Caxias e pelo Forte de Peniche.
Longe de mim apologizar os good old times. Verdade, verdadinha é que só quando as coisas apertam é que dá para perceber a qualidade dos bichos.
Vem isto a propósito do número das escutas à Presidência. Um plot de quinta categoria cujo timing noticioso não podia ser mais óbvio.
Até ao dia das eleições não se prevêem melhoras no argumento. Será o vale tudo. Mas o que devia sublinhar-se é que, apesar da luta ser de morte, todos irão sobreviver após 27 de Setembro. Com mais tacho ou menos tacho. Com mais jobs ou menos jobs. Ao menos, no tempo em que a política trazia consequências, o risco sempre era sério. E a sério.
Nos dias que correm apoia-se a destruição de um país porque uns tipos inventaram que nele se escondiam armas de destruição maciça e ainda se é reeleito. Presidente da Comunidade Europeia, que não fazem a coisa por menos. Com os votos do PSD somados aos do PS.
Ora vão todos bardamerda e enfiem as vossas escutas num sítio que eu cá sei! E excuse my french.
Longe de mim apologizar os good old times. Verdade, verdadinha é que só quando as coisas apertam é que dá para perceber a qualidade dos bichos.
Vem isto a propósito do número das escutas à Presidência. Um plot de quinta categoria cujo timing noticioso não podia ser mais óbvio.
Até ao dia das eleições não se prevêem melhoras no argumento. Será o vale tudo. Mas o que devia sublinhar-se é que, apesar da luta ser de morte, todos irão sobreviver após 27 de Setembro. Com mais tacho ou menos tacho. Com mais jobs ou menos jobs. Ao menos, no tempo em que a política trazia consequências, o risco sempre era sério. E a sério.
Nos dias que correm apoia-se a destruição de um país porque uns tipos inventaram que nele se escondiam armas de destruição maciça e ainda se é reeleito. Presidente da Comunidade Europeia, que não fazem a coisa por menos. Com os votos do PSD somados aos do PS.
Ora vão todos bardamerda e enfiem as vossas escutas num sítio que eu cá sei! E excuse my french.
18/09/09
Farta de gente feia, chata e rançosa, via, via
Via, via, vieni via di qui,
niente più ti lega a questi luoghi,
neanche questi fiori azzurri…
via, via, neache questo tempo grigio
pieno di musiche e di uomini che ti son piaciuti,
It’s wonderfoul, it’s wonderfoul, it’s wonderfoul
good luck my babe, it’s wonderfoul,
it’s wonderfoul, it’s wonderfoul, I dream of you…
chips, chips, du-du-du-du-du
Via, via, vieni via con me
entra in questo anore buio, non perderti per niente al mondo…
via, via, non perderti per niente al mondo
Lo spettacolo d’ arte varia di uno innamorato di te,
it’s wonderfoul, it’s wonderfoul…
Via, via, vieni via con me,
entra in questo amore buio pieno di uomini
via, via, entra e fatti un bagno caldo
c’è un accappatoio azzurro, fuori piove un mondo freddo,
it’s wonderfoul, it’s wonderfoul...
...
17/09/09
Acho que terá passado despercebido aos admiradores do grande líder socialista que o mesmo muito admira Sarkozy
Reafirmo que não vejo televisão. Assim sendo, perdi todos os debates partidários que, dizem-me, foram bastante esclarecedores. Também venho perdendo, pela mesma razão, as entrevistas do Gato Fedorento às nossas cabeças pensantes.
Online, vi alguns minutos da conversa entre Ricardo Araújo Pereira e José Sócrates. Apenas alguns minutos porque, e permitam-me que me cite, Sócrates aborrece-me. Tudo nele me aborrece.
Aborrecida, pois, gramei com as primeiras respostas pomposas do candidato bonzinho e depois ouvi-o chamar iconoclasta a Sarkozy.
Para dizer a verdade, não fiquei surpreendida.
Nos dias que correm, ao estilo trauliteiro do presidente francês não faltam adeptos: o género queres porrada? queres porrada? tomado por coragem, a inconveniência tomada por irreverência.
Mas perante a classificação de «iconoclasta» atribuída a Sarkozy pergunto-me se não haverá aqui matéria para desconfiarmos que Sócrates, embora não o confesse, também venera o Alberto da Madeira, deficit democrático aparte.
É que não vejo grandes diferenças. A maior seria a Bruni. Também conta?
Online, vi alguns minutos da conversa entre Ricardo Araújo Pereira e José Sócrates. Apenas alguns minutos porque, e permitam-me que me cite, Sócrates aborrece-me. Tudo nele me aborrece.
Aborrecida, pois, gramei com as primeiras respostas pomposas do candidato bonzinho e depois ouvi-o chamar iconoclasta a Sarkozy.
Para dizer a verdade, não fiquei surpreendida.
Nos dias que correm, ao estilo trauliteiro do presidente francês não faltam adeptos: o género queres porrada? queres porrada? tomado por coragem, a inconveniência tomada por irreverência.
Mas perante a classificação de «iconoclasta» atribuída a Sarkozy pergunto-me se não haverá aqui matéria para desconfiarmos que Sócrates, embora não o confesse, também venera o Alberto da Madeira, deficit democrático aparte.
É que não vejo grandes diferenças. A maior seria a Bruni. Também conta?
16/09/09
Eis um problema verdadeiramente do caraças, seja lá quem for o próximo ministro (a) da educação
Escreveu o Alexandre Dumas: «Les enfants studieux ne manquent pas d’être des jeunes gens stupides et d’imbéciles grandes personnes».
O escritor António Lobo Antunes adaptou a frase e interroga-se com pertinência: «Porque é que há tantas crianças inteligentes que depois dão adultos estúpidos?»
Também é bem visto.
Também é bem visto.
15/09/09
Nas redes do amor com excesso de informação ou está provado que o facebook proporciona ciúme e altera o romantismo*
* Título roubado da revista ELLE de Outubro de 2009
14/09/09
A book a day keeps the doctor away
Logo a abrir o protagonista/narrador informa os seus leitores: “Sou Juan Pablo Castel, o pintor que matou María Iribarne”. Publicado originalmente em 1948 (e já antes traduzido em Portugal), O Túnel foi a primeira incursão de Ernesto Sabato na ficção. No conjunto, apenas três obras: a que agora se reedita, o magistral Heróis e Túmulos, 1961 (com edição na Europa-América em 1973), e Abaddón el Exterminador, 1974, que eu saiba nunca passado para português.
Ex-homem de ciência que um dia abandonou a física nuclear para se dedicar aos livros (além da triologia romanesca, tem obra ensaística de peso), cidadão comprometido com o seu tempo (foi comunista e admirado pelos existencialistas, nomeadamente por Camus que não pouparia elogios a O Túnel), diria o escritor argentino da relação entre ideias e literatura: “Um crítico alemão perguntou-me porque é que nós, latinos-americanos, temos grandes romancistas mas não grandes filósofos. Porque somos bárbaros, respondi-lhe, porque por acaso nos salvámos da grande cisão racionalista”. E é precisamente disso que não se salva Pablo Castel, o assassino de María Iribarne.
Escrito na primeira pessoa, é o próprio Pablo quem nos vai narrando a sua obsessão: como conhece María, como se torna seu amante, como o amor entre eles vai crescendo, como o mesmo se vê pouco a pouco corroído pelos ciúmes... até ao desenlace fatal. Amor e loucura vão aqui de mãos dadas e, chegados ao fim, como a Capitu de Machado, nada podemos garantir sobre María Iribarne, aquela que, segundo o seu próprio carrasco, fora a única a compreender-lhe a pintura. Escrito com a precisão de um relojoeiro louco, O Túnel conduz-nos pelos trilhos e abismos de uma cabeça exacta, lógica, capaz de criar o seu próprio inferno (ajudado apenas por uma imaginação delirante?). Metáfora da criação artística? Do estado do mundo? Seja o que for, uma obra-prima.
O Túnel, Ernesto Sabato, 2009, tradução de Francisco Vale, Relógio D'Água
O Túnel, Ernesto Sabato, 2009, tradução de Francisco Vale, Relógio D'Água
13/09/09
Não. não venho falar do debate mas apenas reafirmar que Sócrates devia evitar a poesia
... já tinhamos tido, entre outros, o Concerto para Violino de Chopin e a Fenomenologia do Ser de Sartre. Agora tivemos o Ricardo Reis do Sócrates ... que afinal era o Álvaro de Campos do Pessoa.
Razão tinha o Jorge de Sena (a quem nem morto deixam em paz): O problema não é salvar Portugal, mas salvarmo-nos de Portugal.
Ou pelo menos desta gente.
12/09/09
11/09/09
José Sócrates como nunca o viu: isto não é normal e nem os poetas lhe escapam
José Sócrates entrevistado por uma senhora chamada Raquel Alexandra.
Depois de umas generalidades sobre o Ricardo Reis que metiam trevos (???), um momento orgulhosamente só em que se garante que «aqueles que esperam uma ajuda externa, confessam a sua fraqueza» seguido da lancinante pergunta «José Sócrates chora?».
Ficamos a saber que depois dos 40 anos começou a «chorar no cinema com filmes enternecedores» (o que quer dizer que ou nunca viu o Bambi ou tem um problema com o canal lacrimal....) e ainda tempo para «fundamentalmente!» (e aqui note-se o suspiro à Herman José...) ir de Falcon «inaugurar uma das obras mais relevantes... que tem a ver com um lar de idosos...».
Foda-se e pardon my french, como diria o João.
Num momento em que a política lá fora se limita, mais coisa menos coisa, ao a minha é maior do que a tua (vide Sarkozy) nós preferimos meninos com lágrimas (retidas) ao canto do olho.
Lembramo-nos das casinhas e bate tudo certo. Mesmo com cheques-prenda na Fashion Clinic .
10/09/09
Dos modismos contemporâneos já detectados por Sabato em 1948 [ou de como os medíocres nunca dizem nada de novo]
«Foi quando já estávamos à mesa que a magra me perguntou que pintores preferia. Citei ignobilmente alguns nomes: Van Gogh, El Greco. Olhou-me com ironia e disse como se falasse para si:
― Tiens.
Depois acrescentou:
― Aborrecem-me as pessoas grandiosas. Sempre te digo ― prosseguiu, dirigindo-se a Hunter ― que me incomodam esses tipos como Miguel Ângelo e El Greco! A grandeza e o dramatismo são tão agressivos! Não achas que é quase má-educação? Creio que o artista se devia impor o dever de nunca atrair as atenções. Indignam-me os excessos de dramatismo e de originalidade. Repara que ser original é de certo modo evidenciar a mediocridade dos outros, o que me parece de gosto duvidoso. Creio que, se pintasse ou escrevesse, faria coisas que nunca chamassem a atenção.
― Não duvido ― comentou maldosamente Hunter.
Depois acrescentou.
― Tenho a certeza de que não gostarias de escrever, por exemplo, Os Irmãos Karamazov.
― Quelle horreur! ― exclamou Mimí, revirando os olhitos. Depois completou o pensamento ―: Parecem todos nouveaux-riches da consciência, incluindo esse moine, como se chama ele?... Zozime.»
O Túnel, Ernesto Sabato, página 91, Relógio D'Água, tradução de Francisco Vale, 2009 (reedição)
― Tiens.
Depois acrescentou:
― Aborrecem-me as pessoas grandiosas. Sempre te digo ― prosseguiu, dirigindo-se a Hunter ― que me incomodam esses tipos como Miguel Ângelo e El Greco! A grandeza e o dramatismo são tão agressivos! Não achas que é quase má-educação? Creio que o artista se devia impor o dever de nunca atrair as atenções. Indignam-me os excessos de dramatismo e de originalidade. Repara que ser original é de certo modo evidenciar a mediocridade dos outros, o que me parece de gosto duvidoso. Creio que, se pintasse ou escrevesse, faria coisas que nunca chamassem a atenção.
― Não duvido ― comentou maldosamente Hunter.
Depois acrescentou.
― Tenho a certeza de que não gostarias de escrever, por exemplo, Os Irmãos Karamazov.
― Quelle horreur! ― exclamou Mimí, revirando os olhitos. Depois completou o pensamento ―: Parecem todos nouveaux-riches da consciência, incluindo esse moine, como se chama ele?... Zozime.»
O Túnel, Ernesto Sabato, página 91, Relógio D'Água, tradução de Francisco Vale, 2009 (reedição)
09/09/09
Ora agora inauguras tu ora agora inauguro eu ou não devia haver uma lei que impedisse os corta-fitas de usarem a tesoura durante o período eleitoral?
A Secretária de Estado dos Transportes, Ana Paula Vitorino, presidiu, no dia 7 de Setembro de 2009, à cerimónia de reabertura do serviço ferroviário de transporte de passageiros na Linha de Vendas Novas, entre Lisboa e Coruche.
Para assinalar a reabertura deste serviço, as viagens entre Setil e Coruche serão gratuitas na primeira semana, ou seja de 8 a 12 de Setembro.
Para assinalar a reabertura deste serviço, as viagens entre Setil e Coruche serão gratuitas na primeira semana, ou seja de 8 a 12 de Setembro.
08/09/09
Que me perdoem as senhoras mas este post é dirigido a três moços para que eles não pensem que brinco com a realeza
Ao centro, na fotografia, o russo Boris Skossyreff, rei de Andorra por seis dias e posterior e provisoriamente exilado em Olhão, tendo à sua esquerda o advogado e jornalista Mário Líster Franco e, à direita, o médico e melómano olhanense Francisco Fernando Lopes.
[Francisco e Tomás, aqui está a prova de que o homem existiu; João, guarda-me por favor os tais papéis sobre o mano-rei].
Voltaremos ao assunto. Ainda não sabemos como.
07/09/09
A book a day keeps the doctor away
O livro foi originalmente publicado pela Dom Quixote em 1989. Volta agora às livrarias, passados 70 anos sobre o começo da guerra mais devastadora da História (Setembro, 1939 – Setembro, 1945).
O autor, Martin Gilbert, reputadíssimo historiador britânico com vasta obra publicada (A Primeira Guerra Mundial saiu sob a chancela da Esfera dos Livros em 2007), é especialmente conhecido pela sua monumental biografia de Winston Churchill, também traduzida em português e editada pela Bertrand em 2002. O volume de mais de mil páginas que agora se reedita é uma valente arma de arremesso e tanto pode ser lido de enfiada (se o leitor tiver estômago para tanta mortandade…) como servir de obra de consulta, a espaços.
Organizado de modo cronológico, A Segunda Guerra Mundial cobre exaustivamente o conflito, nada deixando de fora, nem mesmo aquelas geografias mais remotas que justificam plenamente o termo “mundial”. Para lá da Europa, dos EUA e do Japão, Gilbert guia-nos até palcos obscuros na Tailândia, Birmânia, Tunísia ou Nova Guiné, desenhado com precisão cirúrgica o quadro de uma disputa que deixaria, quando terminada, um rasto de quase 50 milhões de cadáveres. Mas o que torna A Segunda Guerra Mundial não só uma obra de leitura obrigatória como também apelativa (se o adjectivo se pode aplicar a tal colecção de barbáries…) é a capacidade de Gilbert para dar rosto aos intervenientes. Não só aos grandes, a esses conhecemo-los, mas sobretudo àqueles que, vítimas ou carrascos quase desconhecidos (e a II Guerra Mundial, ao contrário da primeira, deixa facilmente perceber quem são os bons e os maus…), vêem assim reconhecido, sublinhado e afirmado, o seu papel.
Como logo se diz no início do primeiro capítulo (“A Invasão da Polónia pela Alemanha – Setembro de 1939): “ (…) a esmagadora maioria dos que morreram, quer na frente de batalha quer na retaguarda, tinham nomes e rostos obscuros, excepto para as poucas pessoas que os conheciam ou os amavam; mas em muitos casos, que talvez também atinjam uma cifra de milhões, até mesmo os que em anos posteriores poderiam ter recordado uma vítima foram eliminados”.
Escrever à luz desta afirmação, torna-se, assim, num exercício de justiça, de memória e de respeito pelas vítimas. E é isso que Gilbert faz magistralmente, transformando o que poderia ser uma árida tarefa compilatória numa história dramática em que mulheres e homens concretos participam, sofrem, dão ou ceifam vidas. E tudo isto se passou há apenas 70 anos.
A Segunda Guerra Mundial, Martin Gilbert, Dom Quixote, 2009
Organizado de modo cronológico, A Segunda Guerra Mundial cobre exaustivamente o conflito, nada deixando de fora, nem mesmo aquelas geografias mais remotas que justificam plenamente o termo “mundial”. Para lá da Europa, dos EUA e do Japão, Gilbert guia-nos até palcos obscuros na Tailândia, Birmânia, Tunísia ou Nova Guiné, desenhado com precisão cirúrgica o quadro de uma disputa que deixaria, quando terminada, um rasto de quase 50 milhões de cadáveres. Mas o que torna A Segunda Guerra Mundial não só uma obra de leitura obrigatória como também apelativa (se o adjectivo se pode aplicar a tal colecção de barbáries…) é a capacidade de Gilbert para dar rosto aos intervenientes. Não só aos grandes, a esses conhecemo-los, mas sobretudo àqueles que, vítimas ou carrascos quase desconhecidos (e a II Guerra Mundial, ao contrário da primeira, deixa facilmente perceber quem são os bons e os maus…), vêem assim reconhecido, sublinhado e afirmado, o seu papel.
Como logo se diz no início do primeiro capítulo (“A Invasão da Polónia pela Alemanha – Setembro de 1939): “ (…) a esmagadora maioria dos que morreram, quer na frente de batalha quer na retaguarda, tinham nomes e rostos obscuros, excepto para as poucas pessoas que os conheciam ou os amavam; mas em muitos casos, que talvez também atinjam uma cifra de milhões, até mesmo os que em anos posteriores poderiam ter recordado uma vítima foram eliminados”.
Escrever à luz desta afirmação, torna-se, assim, num exercício de justiça, de memória e de respeito pelas vítimas. E é isso que Gilbert faz magistralmente, transformando o que poderia ser uma árida tarefa compilatória numa história dramática em que mulheres e homens concretos participam, sofrem, dão ou ceifam vidas. E tudo isto se passou há apenas 70 anos.
A Segunda Guerra Mundial, Martin Gilbert, Dom Quixote, 2009
06/09/09
05/09/09
Porque anda por aí a circular a ideia extravagante que os políticos são superiormente inteligentes e isto apesar do Hitler ter invadido a Polónia
Como aqui temos escrito também nos parece uma coisa muito estúpida. Tão estúpida como um secretário-geral usar o seu discurso no congresso do partido para atacar uma estação de televisão, achar normal licenciar-se ao domingo ou declarar-se vítima duma campanha negra urdida por magistrados portugueses, serviços secretos ingleses e jornalistas. Sendo estas últimas coisas muito estúpidas ― usar o seu discurso no congresso do partido para atacar uma estação de televisão, licenciar-se ao domingo e declarar-se vítima duma campanha negra urdida por magistrados portugueses, serviços secretos ingleses e jornalistas ― a verdade é que segundo José Sócrates essas coisas não são estúpidas. Logo a outra coisa muito estúpida ― o afastamento de Manuela Moura Guedes três semanas antes das eleições ― provavelmente só a nós nos parece estúpida. Para nossa desgraça a José Sócrates poucas ou nenhumas coisas lhe parecem estúpidas.
Roubado daqui e na continuação do post anterior.
04/09/09
Nunca pensei vir a apoiar a manuela moura guedes
Não vejo televisão e nunca vi o telejornal apresentado pela Manuela Moura Guedes.
Há muitos anos, quando ela decidiu que queria ser deputada, entrevistei-a. Achei-a vaidosa, ingénua e com falta de mundo.
Da actual jornalista, recordo uma música que ela cantou na juventude e aquele gesto de cabeça à Miss Piggy enquanto anunciava pleonasticamente: «Olá, boa-noite! Sou a Manuela Moura Guedes».
Agora, como toda a gente, sei que o Jornal Nacional de sexta-feira foi suspenso. Acusou-se Juan Luis Cebrián, presidente da Prisa, grupo espanhol que manda na TVI e não esconde simpatias pelo partido de Zapatero, de ser responsável pela medida. Entretanto, a Prisa veio desmentir, dizendo que a decisão foi tomada pela direcção de Lisboa.
No meio disto tudo, cita-se Sócrates (antes de se ter travestido em santinho) mais a sua aversão confessa pela Manuela Moura Guedes.
Não faço ideia se alguém pegou no telefone. Não faço ideia se alguém foi dar recados. Não faço ideia se alguém anda a pensar no futuro. Que o silenciamento, a tão pouco tempo de eleições, é conveniente, é. Embora possa também tornar-se incómodo por confundido com censura.
Como vivemos em pleno darwinismo político (e Darwin não é para aqui chamado mas sim Spencer), entregues a gente sem crédito nem insónias, acho que tudo é possível.
É que os denominados mais fortes são demasiadas vezes os mais estúpidos. Como a História dos homens vem provando à exaustão. E só por isso não me admiraria nada.
03/09/09
Huuummm... Estou capaz de votar neste
Partido Nulo: um partido que não prescinde dos caroços das cerejas!
02/09/09
01/09/09
Fui ameaçada com um processo-crime por um anónimo. Será que vou aparecer na televisão?
Houve um anónimo que veio à Pastelaria indignar-se com o meu post anterior. Comenta ele que o mesmo é passível de processo-crime e denota um grande mau gosto.
Quanto ao mau gosto também acho: tanto os alemães terem invadido a Polónia como o ministro gostar de malhar.
O caso do processo-crime já me levanta dúvidas. Por exemplo esta: como é que alguém me pode impedir de fazer associações de ideias?
Quanto ao mau gosto também acho: tanto os alemães terem invadido a Polónia como o ministro gostar de malhar.
O caso do processo-crime já me levanta dúvidas. Por exemplo esta: como é que alguém me pode impedir de fazer associações de ideias?
A não ser, ocorre-me de repente, que o dito anónimo esteja a pensar numa pena tipo lobotomia.
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