31/03/08

Ironias da era tecnológica

Uma aluna e uma professora engalfinharam-se por causa de um telemóvel. Desculpem lá eu não surfar com a maré mas, na minha modesta opinião, alicerçada tão-só no meu estatuto de antiga adolescente e actual mãe de família (com filhas adolescentes), quem, em primeiro lugar, devia ser chamada à pedra era a própria professora. Por uma razão etária (e falando contra mim, embora uma senhora nunca deva falar da idade): cabe aos adultos fazerem-se respeitar pelos jovens e não o contrário. Posto isto, e para que não haja confusões, imeditamente confesso não morrer de simpatia pelo Jean-Jacques Rousseau.
Creio, além disto, que se está a ignorar um dos aspectos mais relevantes do caso. É que este só provocou alarido porque um dos colegas de turma filmou a cena e a despejou na Web, para gáudio das televisões e profundo choque do Presidente da República.
Ou seja, do Procurador-Geral (crime, diz ele) a Paulo Portas, de Cavaco Silva aos jornalistas, passando pela professora (crime, diz ela) e até pelo João Carlos Espada (desta vez sem Karl Popper) todos foram ao You Tube pescar matéria para as suas reflexões.
E como chegaram lá? Através de um telemóvel. Pergunto: em que ficamos?
[Para se entender melhor a senda orwelliana que se esconderá sob a invocação abstracta de disciplina! disciplina! disciplina! ― como se ela fosse, em si própria, um princípio ético inviolável (ah! como os alemães foram disciplinados...) ― clique-se aqui. O assunto é outro, mas a lógica é semelhante à que está por trás da criminalização da indisciplina escolar.]

28/03/08

Diálogo sobre adjectivos

(...)
Eu: Pois, mas há coisas que são intemporais.
Ema: ????!!!! (leia-se uma cara nada convencida)
Eu: Sabes o que é que intemporal quer quiser?
Ema: Não é quando está um dia de sol e não chove?

25/03/08

Intervalo para a publicidade: Joaninha, a menina que não queria ser gente, já chegou às livrarias

Joaninha Toma uma Decisão Depois do Jantar e Nós Ficamos a Saber Qual Foi.
– Qual foi o quê?
– A decisão.
– E o jantar?
– O jantar foi bife com batatas fritas.
– Ah!

Então, um dia, o dia mesmo antes de fazer sete anos, depois do jantar Joaninha tomou uma decisão, que é uma coisa que também se pode tomar durante o pequeno-almoço, ou a outra hora qualquer. Não é como os remédios. Aliás, para se tomar uma decisão nem é preciso estar doente. Basta que deixemos de ter dúvidas e passemos a ter certezas.
Por exemplo, se perguntarmos ao lanche:
– O que é maior? Um hamster ou um elefante?
Claro que o elefante é de certeza maior, mesmo se o hámster for crescido e o elefante tiver acabado de nascer, até porque os elefantes bebés pesam 125 quilos e os hámsters nunca passam muito de 1 quilo, mesmo quando já são adultos.
Mas, voltando a Joaninha que, parece-me, não tinha hámsters. Nem elefantes, julgo eu.

«Não quero fazer sete anos!», eis a decisão que Joaninha tomou eram quase nove da noite, já tinha comido o bife e estava na sobremesa. Tinha agora de avisar os pais, para não comprarem as velas.
Como a mãe não estava em casa (tinha ido ao jardim passear o Pata Branca), Joaninha foi ter com o pai à cozinha onde ele levava a loiça:
– Pai, estive a pensar… Eu não quero fazer sete anos!
– O quê? – perguntou o pai, porque com o barulho da água não a tinha percebido.
– Não quero fazer sete anos!
– Ora, que disparate!
– Não quero, não quero e não quero!
– E onde é que foste buscar uma ideia tão maluca?!
Joaninha ia responder que não tinha ido a lado nenhum buscar a ideia maluca porque ela estava muito bem, obrigada, dentro da sua própria cabeça, quando a mãe chegou da rua e o pai – crac! – partiu um prato.
– Lá partiste outra vez qualquer coisa! – disse a mãe.
E o pai disse:
– Para a próxima lavas tu a loiça!
E a mãe disse:
– Era só o que faltava! Eu faço o jantar, tu lavas a loiça!
E a Joaninha percebeu que iam começar naquilo do filme! notícias! filme! notícias!, só que desta vez ia ser loiça! jantar! loiça! jantar! e resolveu ir para a cama sem sequer lavar os dentes.
No outro dia de manhã, antes de fazer anos, porque só tinha nascido às cinco e meia da tarde, Joaninha tentou convencer a mãe:
– Mãe, não quero fazer sete anos!
A mãe, que estava – nhac! nhec! – muito distraída a comer os seus cereais, quase que se engasgou:
Glup! Não queres fazer sete anos?!
– Não, não quero!
– Mas que ideia tão sem pés nem cabeça! Pois se já fizeste seis... Não podes saltar para os oito assim de qualquer maneira. Isso seria batota!
– Mas eu não quero fazer sete anos! – insistiu a Joaninha.
– Oh! Joaninha! Mas toda a gente faz anos.
– Então, eu não quero ser gente!
E foi, então, que aconteceu uma coisa extraordinária.
Zás! Trás! Pás!
Joaninha transformou-se em PEIXE!
Ora, acontece que os peixes só respiram debaixo de água, o que não sendo uma coisa tão extraordinária como Joaninha ter ficado coberta de lindas escamas azuis, também não deixa de ser fantástico.
Como é que eles conseguem?
(...)
Joaninha, a Menina que não queria ser gente, Ana Cristina Leonardo (texto); Álvaro Rosendo (ilustracões), Gradiva Júnior

24/03/08

Será que Karl tinha razão? Só um bocadinho, pelo menos?

«Parece que, afinal, as notícias de que a Santa Sé teria declarado como novo pecado mortal ser-se rico demais eram ligeiramente exageradas. A Santa Sé não disse tanto (...) Bem o podia ter feito, que vinha mesmo a calhar, agora que o mundo vive na iminência de uma recessão económica global e grave, causada pelo excesso de ganância dos muito ricos.
«Alan Greenspan, ex-presidente da Reserva Federal Americana, lembrou-se agora de avisar que vem aí a maior recessão económica dos últimos 60 anos. (...)
«Os Estados Unidos vão precisar de injectar biliões de dólares de dinheiros públicos para evitar a falência em série do sistema financeiro e, por arrasto, de todo o sistema empresarial. O que lhes poderá evitar a repetição de 29 é que agora a economia é global e eles esperam evitar a falência de um Estado já altamente endividado através das trocas comerciais: vendem ao mundo inteiro mais barato e não compram nada de volta porque, com o euro a 1,60 dólares, ninguém consegue vender nada aos americanos. Ou seja: provocaram a crise e agora somos nós que temos de a pagar. (...)
«Obviamente, devia haver licões a extrair deste cenário de catástrofe e das razões para ele. Entregue a si próprio, após a queda do muro de Berlim, o capitalismo internacional parece que fez questão de confirmar que tudo o que de pior os marxistas tinham dito dele ao longo de um século só pecava por defeito. Só pode ser uma comédia histórica ver a Igreja Católica (decerto impressionada pelo exemplo indecente dos irmãos da Opus Dei no nosso tão católico BCP e outros) insinuar que ser escandalosamente rico é capaz de ser pecado mortal, e ver o Partido Comunista da China declarar que "ser rico é glorioso e revolucionário". O mundo está de pernas para o ar (...).»
Miguel Sousa Tavares, «A cor (suja) do dinheiro», Expresso, 21 de Março de 2008

20/03/08

Que nem a propósito: porque corria por aí um vídeo em que um aluno batia num professor. Solução: precogs*?

Alguém falou em Relatório Minoritário?
«A ideia é inglesa e antiga: primeiro a sentença, depois o julgamento, e só depois o crime. E, se não chegar a haver crime, tanto melhor, como diria a Rainha a Alice. Assim, noticia "The Observer", as autoridades policiais inglesas propõem-se recolher amostras de ADN das crianças das escolas primárias cujo comportamento indique que "podem vir a ser criminosos". A ideia é de Gary Pugh, director da Scotland Yard: com a ajuda dos professores e educadores de infância, identificar, ainda de fraldas, os "criminosos potenciais" que "irão possivelmente tornar-se um perigo para a sociedade". A lógica criminológica da coisa é simples: quem rouba a pastilha elástica ao colega de carteira, acabará "possivelmente" a assaltar o Banco de Inglaterra, quem parte um vidro da escola à pedrada estará um dia a atirar aviões contra o World Trade Center. Segundo Rugh, "é possível identificar marcas de futuros criminosos em crianças a partir dos cinco anos" e, por isso, cadastrá-las e segui-las desde logo (ou, mais radicalmente, pôr-lhes logo uma pulseira electrónica ou metê-las na cadeia) evitará que sejam cometidos crimes. Com um pouco de sorte, quem sabe?, talvez se possam também identificar "marcas de futuros directores carrollianos da Scotland Yard a partir dos cinco anos"», Manuel António Pina
ROUBADO DAQUI
A NOTÍCIA AQUI
* SOBRE PRECOGS

19/03/08

Ainda não vi o filme; quanto ao livro retomo o post que já andava perdido lá para os confins do blog

«That is no country for old men»: Cormac McCarthy foi buscar a Yeats o verso que dá título ao romance. Sylvia Plath também não estaria mal: «I talk to God but the sky is empty». Por aqui não há ninguém a quem o céu proteja.
O catolicismo tem, que me ocorra de repente, duas coisas boas: os filmes de Martin Scorsese e os livros de Cormac McCarthy. É verdade que em Este País não É para Velhos o Ser Supremo pode ser uma desilusão. Mas até o xerife Bell, assaltado por visões de Satanás entre os homens, compreenderia Hemingway quando este um dia, inquirido sobre se acreditava em Deus, respondeu: «À noite, às vezes».
Quando escrevo, a versão cinematográfica deste romance já estreou nos EUA. Não por acaso, decerto, sob a batuta de Joel e Ethan Cohen, a dupla responsável pelo maior tratado moral alguma vez transposto para o ecrã: Miller's Crossing, em português, História de Gangsters. Porque McCarthy escreve livros morais. Com o adjectivo a encarnar o seu sentido mais nobre, aquele que percorre autores tão diversos como Defoe, Flaubert, Dostoievski, Conrad ou Melville.
O cenário da acção é, como já o era em todos os títulos da Triologia da Fronteira, a América profunda que havia também fascinado Faulkner. Um caçador de antílopes a contas com o passado, Llewelyn Moss, encontra por acaso, ao lado de um monte de cadáveres, uma mala com dois milhões de dólares. Alguma coisa correu mal no que se percebe ter sido uma transacção de droga e o único sobrevivente é um mexicano moribundo que implora por água. Moss não tem como lhe matar a sede, mas tomará duas decisões morais que lhe irão determinar a vida (e a de outros) para sempre: rouba a mala dos dólares e volta ao lugar do crime para dessedentar o homem.
A partir deste fait-divers tantas vezes glosado, McCarthy produz um romance poderoso, um western moderno e metafísico que nos confronta, num registo slow motion que lembra Rulfo, com a condição humana no que ela tem de mais terrível. Porque, claro, Moss não se safará impunemente com a mala dos milhões: «(...) Ficou sentado a olhar para as notas, depois fechou a aba e continuou sentado de cabeça baixa. Tinha ali a sua vida inteira, pousada na sua frente. Dia após dia, do nascer ao pôr do Sol, até ao momento da sua morte. Tudo resumido a dezoito quilos de papel dentro de uma mala
Ao brilhantismo estilístico (e sobre isso escreve e bem o tradutor Paulo Faria em nota introdutória), acresce a construção romanesca.
A abrir Este País não É para Velhos algumas reflexões proferidas na primeira pessoa pelo desencantado e velho xerife Bell, as quais irão pontuando o desenrolar da acção sem que em nada satisfaçam, esclareça-se já, a nossa necessidade de consolo: «Lembram-se do que eu disse no outro dia sobre os jornais. Na semana passada lá na Califórnia, apanharam um casal que alugava quartos a idosos e depois matava-os e enterrava-os no quintal. A seguir iam levantar os cheques das pensões de reforma. Mas primeiro torturavam-nos, não sei porquê. Se calhar tinham a televisão avariada».
É Bell quem sairá em socorro de Moss e da mulher deste, alvos visados por Chigurh, um assassino a soldo dos patrões da droga que tem por missão recuperar o largo punhado de dólares. Desde sempre se percebe que o casal tem todos os motivos para não dormir descansado: «Estou-me aqui a preparar para fazer uma coisa completamente estúpida, mas mesmo assim vou seguir em frente. Se eu não voltar, diz à minha mãe que gosto imenso dela. A tua mãe já morreu, Llewelyn. Bom, então eu mesmo lhe digo.» E a coisa estúpida é ir dar água a um moribundo.
Chigurh, que não é um sádico (ao contrário do juiz Holden desse outro livro de McCarthy para «leitores corajosos», Meridiano de Sangue), apenas um homem zeloso do seu destino de matador, não sofre da doença humana da compaixão. É isso mesmo que ele explica a Carla Jean: «Estás a pedir-me que me torne vulnerável, e isso é coisa que eu nunca poderei fazer. (...) A grande maioria das pessoas não acredita que possa existir alguém assim. Isso deve constituir para elas um grande problema (...). Como levar a melhor sobre uma coisa cuja existência nos recusamos a reconhecer. Compreendes? Assim que eu entrei na tua vida, a tua vida terminou. Teve um começo, um meio e um fim. O fim é agora. Dirás que as coisas podiam ter sido diferentes. Que podiam ter corrido de outra maneira. Mas o que é que isso significa? As coisas não correram de outra maneira. Correram desta. Estás a pedir-me que desminta o mundo. Percebes? Sim, disse ela, a soluçar. Percebo. A sério que percebo. Ainda bem, disse ele. Óptimo. Depois deu-lhe um tiro
E é sobre Chigurh que Bell, logo a abrir, fará a pergunta mais inquietante de todas: «O que é que se diz a um homem que é o primeiro a reconhecer que não tem alma?»
Daqui ninguém sai vivo? Bom, quase ninguém. Talvez Loretta, a mulher do xerife. Mas só porque não lia jornais.

18/03/08

2 postes gamados por aí que explicam na perfeição a razão de ser e não ser do novo Acordo Ortográfico

Post 1, no qual se prova a olho nu que o Acordo é uma falsa questão
De aorcdo com uma peqsiusa de uma uinrvesriddae ignlsea, não ipomtra em qaul odrem as Lteras de uma plravaa etãso, a úncia csioa iprotmatne é que a piremria e útmlia Lteras etejasm no lgaur crteo. O rseto pdoe ser uma bçguana ttaol, que vcoê anida pdoe ler sem pobrlmea. Itso é poqrue nós não lmeos cdaa Ltera isladoa, mas a plravaa cmoo um tdoo.

Fixe os olhos no texto abaixo e deixe que a mente leia correctamente o que está escrito.
35T3 P3QU3N0 T3XTO 53RV3 4P3N45 P4R4 M05TR4R COMO NO554 C4B3Ç4 CONS3GU3 F4Z3R CO1545 1MPR3551ON4ANT35! R3P4R3 N155O! NO COM3ÇO 35T4V4 M310 COMPL1C4DO, M45 N3ST4 L1NH4 SU4 M3NT3 V41 D3C1FR4NDO O CÓD1GO QU453 4UTOM4T1C4M3NT3, S3M PR3C1S4R P3N54R MU1TO, C3RTO? POD3 F1C4R B3M ORGULHO5O D155O! SU4 C4P4C1D4D3 M3R3C3! P4R4BÉN5!


Post 2 (via Blogtailors), no qual se prova que o Professor Casteleiro, além de ilustre académico também tem jeito para o negócio
(...) Ainda há dias o ilustre académico [prof. Malaca Casteleiro], envolvido desde o início do processo nas negociações com o Brasil, se lamentava da pouca vontade política dos governantes portugueses na ratificação do acordo ortográfico. Logo que o acordo foi ratificado, Malaca Casteleiro e a Texto Editora apressaram-se a colocar no mercado os primeiros dicionários adaptados à nova ortografia. Se a maior parte dos editores se lamentava pelos prejuízos que a reforma ortográfica lhes iria trazer, também há quem pense ganhar dinheiro com a reforma.»
António Apolinário Lourenço

16/03/08

Enquanto em Portugal as inteligências que mandam nisto andam preocupadas com os piercings e os coentros, no Tibete os chineses não estão para miudezas

No passado dia 14 o PS entregou na Assembleia da República um projecto-lei que pretende proibir os piercings na língua. Compreende-se que, no seu afã legislador, o partido do governo se tenha ficado pela sede das papilas gustativas e nada diga sobre os genitais: a polícia dos costumes controlará facilmente os infractores abrangidos ― «identifique-se e deite a língua de fora!» ―, fiscalizar as partes pudendas implicaria mandar descer as calças.
E enquanto por cá a nossa Assembleia, transformada em jardim de infância, se entretém com tão digníssimas matérias ― relembre-se a criação do grupo de trabalho (?) para tratar da excepção dos coentros e do pão duro indispensável à açorda ― no Tibete os chineses não estão para temas fracturantes. Balanço: cerca de 100 pessoas assassinadas; a agência Nova China diz que foram «apenas» 10.
Curioso também que o massacre tenha ocorrido pouco depois de Bush retirar a China da lista dos países violadores dos Direitos Humanos. Apesar disso, há quem continue a pedir o boicote às Olimpíadas de Pequim, mesmo se outros o dão como impossível. À imagem do que aconteceu, nomeadamente, em Berlim 1936. A história repete-se, embora a farsa não invalide a tragédia.

14/03/08

«Bom-dia Senhor Primeiro-Ministro!» ― Sócrates na intimidade, ou de como o casting pode dar cabo de um filme

Aviso: a visualização desta reportagem da SIC sobre o engenheiro-técnico José Sócrates pode tornar-se dolorosa e confrangedora.

Ministério Público (1) Corrupção (-11) e tudo isto se passou num cemitério

«Onze coveiros da Câmara de Lisboa foram acusados de corrupção passiva a troco de contrapartida económica, de valor não apurado mas "nunca inferior a dez euros". Após aturadas (e dispendiosas) investigações, concluiu o Ministério Público que a Câmara terá sido lesada em cerca (acho graça ao "cerca") de 687 euros. Segundo os investigadores, estes perigosos delinquentes arriscam uma pena de um a oito anos de prisão.»
Roubado nesta caixa de comentários.

13/03/08

11/03/08

Porque anda muita gente por aí a falar do que não sabe, dou a palavra a Amos Oz*

Don’t march into Gaza

Anger, frustration and invective are riling us. Israel must not fall into the trap that Hamas is setting for us — we must not march into Gaza. Because the number of casualties in a ground invasion of Gaza would be much greater than the number of casualties caused by Kassam rockets over the last seven years. Because during five of the seven Kassam years, we controlled the entire Gaza Strip and hundreds of rockets were fired on Sderot anyway, in addition to repeated bloody assaults on the Israeli settlers who lived there. Apparently, we've forgotten.Reoccupying the Gaza Strip would not necessarily end rocket fire on Sderot and its environs. In addition to the continuing attacks on Sderot, our occupying force would face gunfire and suicide bombers, day in and day out. Moreover, an invasion of Gaza would unite the Palestinian masses and the Arab and Muslim worlds around Hamas, which at present is isolated and loathed by most Arabs. If Israeli forces invaded Gaza, Hamas' fighters would immediately be seen as defenders of a Palestinian Masada to the Palestinians, the Arab world and international public opinion -- the few against many, residential neighborhoods facing an army, refugee camps under the shadow of bomber squadrons, boys battling tanks, David versus Goliath. If we conquer Gaza, we'll find ourselves sitting on thorns and scorpions. The occupying force will not have a day of peace. Neither will the inhabitants of Sderot and the area around it.
Even in such times of anger, when our hearts go out to the ongoing suffering of the Israelis of Sderot, we must not forget that the root of the Gaza problem is that hundreds of thousands of human beings are rotting there in refugee camps, camps that are incubators of poverty and despair, ignorance, religious and national fanaticism, hatred and violence. From a historical point of view, there can be no solution to the problem of Gaza as long as there is not at least a modicum of hope for these desperate people somewhere on the horizon. Then what can we do? We can and must achieve a cease-fire with Hamas in Gaza. A cease-fire would come, of course, with a high political price. But among all the prices Israel would have to pay for a mistaken and rash decision, it is the least deadly and the most bearable.
Retirado daqui e na sequência deste post.
*Escritor israelita com vários livros traduzidos para português

Depois explicarei do que se trata

10/03/08

100 mil manifestantes é muita gente e as preposições são o que são

«Não posso recuar naquilo em que acredito e em que estou absolutamente convencido.» A frase é pomposa e seria de efeito, não fora o erro nas preposições. Proferiu-a o engenheiro técnico José Sócrates, que fala mal português certamente por não ter tido professor à altura...
Pela parte que me toca, deu-me um jeitão do caraças. Andava há que tempos para postar esta citação roubada ao Homem que Sabia Demasiado: «O despotismo impressiona pela estupidez do estilo», Henri Beyle ou, melhor dizendo, Stendhal.

09/03/08

A propósito, e antes que me esqueça

— Angéla, tu es infâme!
— Non, je ne suis pas infâme. Je suis une femme.*
*Une femme est une femme, Jean-Luc Godard, 1961

05/03/08

Ingrid Betancourt




Vai uma grande confusão pela América Latina. Colômbia, Equador e Venezuela trocam acusações: a morte do líder das FARC Raúl Reyes, liquidado no Equador por tropas colombianas, foi o rastilho. Para lá das manobras de bastidores, onde ninguém é certamente inocente, continuam a estar os prisioneiros das FARC, entre eles Ingrid Betancourt, candidata à presidência da República colombiana raptada a 23 de Fevereiro de 2002.
Um vídeo servia-lhe há pouco de prova de vida. Dizia-se que a sua libertação estaria para breve (Clara Rojas, vice-presidente do partido de Ingrid e raptada na mesma altura, regressou a Bogotá a 12 de Janeiro deste ano). Com a morte de Raúl Reyes, a esperança terá sido de novo adiada.

Nascida em 1961 de pai diplomata (fulminado por um ataque cardíaco um mês após as FARC lhe terem levado a filha) e de uma Miss Colômbia seduzida pela política, Ingrid Betancourt viria, aos 40 anos, a contribuir para engrossar a lista dos milhares de desaparecidos na selva.
Infância e juventude passadas em Paris, na Avenue Foch, tinham-lhe permitido conhecer os melhores — Pablo Neruda ou Gabriel Garcia Marquez eram visitas lá de casa. Conclui o curso de Ciências Políticas em França, mas o casamento com um diplomata francês acabará em divórcio porque Ingrid insiste em regressar à Colômbia. Lá chegada, os seus métodos seriam classificados por um político de Bogotá como bons para a Europa dos salões mas incompetentes para a América Latina.
É eleita deputada em 1994, integrada nas listas do Partido Liberal (o mesmo que Alvaro Uribe abandonará em 2002 para se candidatar à presidência da Colômbia), que virá a denunciar como corrupto.
Reincide passado quatro anos, já à frente do Oxigénio, um movimento de cariz ecológico que entretanto fundara. Durante a campanha andara pelas ruas a distribuir preservativos juntamente com a sua própria foto, na qual se podia ler: «A melhor para nos livrar da corrupção». É eleita.
Tenta depois a presidência, escolhendo o Viagra como símbolo, com o que pretendia sublinhar a vitalidade das suas propostas. Chamada à pedra pelo Ministério da Saúde e pelos laboratórios que lançaram os comprimidos azuis, pouco depois já nada faria diferença: raptada durante uma deslocação à cidade de San Vicente del Caguán — em zona desmilitarizada que durante três anos servira de palco às negociações de paz entre o Governo e as FARC — Ingrid Betancourt foi obrigada a abandonar a batalha, num momento em que as sondagens oficiais lhe atribuíam menos de 1% das intenções de voto.
O carro onde seguia com Clara Rojas nunca chegou ao destino. Em entrevista dada no mês anterior ao rapto, a obstinada colombiana, céptica quanto às sondagens, dizia a um jornalista norte-americano: «Combato para limpar o país, para ter uma democracia tão forte e eficaz como a que vocês têm na América, na Europa e noutros países. Estamos a pedir o essencial, não o luxo».

Muitos consideraram a sua candidatura à presidência prematura, mas bastaria terem lido a sua autobiografia, Com Raiva no Coração, para perceberem que o «realismo» não era o forte de Ingrid.
Firme nos seus princípios, recusando ceder ao tráfico de influências e às ameaças (o que lhe valeu um atentado e o afastamento dos filhos — que fez sair da Colômbia por medo das represálias), terá existido nela alguma dose de ingenuidade: «(...) por duas vezes fui eleita com resultados notáveis, e hoje sinto que estou em condições de travar a corrupção. Verifico também que esses mesmos políticos que me odeiam contam comigo para os secundar nas suas iniciativas, porque sabem que sou crível, que não sou subornável como eles o são. De certo modo, obrigo-os a pensar que poderiam ser diferentes».
O jogo era muito mais sujo. Álvaro Uribe estará muito feliz por ter liquidado um membro do secretariado da guerrilha; as negociações para a libertação dos reféns terão conhecido melhores dias.

04/03/08

64% dos israelitas são pelo cessar-fogo

A violência no Médio Oriente tende a levar a posições extremadas, com alguns defensores de Israel a mostrarem-se mais papistas do que o Papa na compreensão da política militar do governo de Ehud Olmert.
Parece ser o caso, por exemplo, de Filipe Nunes Vicente que assina o seguinte post no Mar Salgado: «Tanto Israel como o Hamas visam alvos. O Hamas visa apenas civis, Israel visa o Hamas e atinge por vezes civis. É um facto. No entanto, o ponto preferido dos media portugueses é este: Israel mata mais. Isto é deveras espantoso. O Hamas só está em baixo na contabilidade macabra porque não tem as armas de Israel. Ou alguém pensa que um tipo que odeia o vizinho e lhe atira pedras todos os dias desdenharia usar uma metralhadora?»
Como a História não se faz de «se(s)», julgo ser um dever moral condenar as mortes de civis palestinianos na Faixa de Gaza (cuja responsabilidade caberá em última instância ao primeiro-ministro de Israel, o mesmo que, recorde-se, conduziu há pouco uma guerra desastrosa no Líbano — da qual pretenderá limpar-se agora da pior maneira).
No meio da barbárie, consola-me saber que 64% dos israelitas são pelo cessar-fogo, mesmo que tal implique conversações com o Hamas. Um facto que me dá mais que pensar do que todos os apoios incondicionais e/ou argumentos rebuscados em defesa da política de terra queimada.

03/03/08

Maria Gabriela Llansol [1931 / 2008]

[escrever ou tocar um instrumento é admirável] Porque, no primeiro momento, não há nada, parece que o vazio primordial e natural estão sentados connosco, importunando-nos, e, de repente, no instante seguinte, estala uma tempestade serena que distribui as figuras do som ou da imagem no interior da casa.
Maria Gabriela Llansol (retrato de Álvaro Rosendo)

Traje inovador apresentado pela embaixadora do «Portugal West Coast» em Paris. Diz-se que Miuccia Prada, essa ex-comunista, ficou roída de inveja

Fontes bem informadas garantem-me que Miuccia Prada ia tendo um ataque de nervos (digno de Anna Magnani!) quando lhe fizeram chegar as fotos do desfile de Fátima Lopes em Paris, o tal em que o brasileiro Paulo Coelho se sentou na primeira fila rendido ao apelo esotérico, se não do V Império pelo menos da West Coast.
O elaborado design e o cair elegante das roupas terão posto a italiana aos gritos – Dio, devo telefonare a Donatella! – temendo pela moda do seu país, a mesma que Manuel Pinho pensava ser imbatível em matéria de sapatos.
De passagem pela Feira Internacional de Calçado de Milão, o Ministro da Economia e Inovação provara ser um homem do mundo ao confessar aos jornalistas da SIC: «Eu vinha cá comprar sapatos italianos, mas fiquei tão impressionado com a qualidade dos sapatos portugueses que vou levar sapatos portugueses».
Hélas, como a Feira de Milão não faz vendas directas ao público, o bem informado ministro não conseguiu comprar nada, nem sequer um par de botas.
Fotografia de Christophe Becker