31/03/11
Aparvalhados ou não, basicamente é isto
Durante os anos cavaquistas andámos a betunar o país. Durante os anos socratistas foi um fartote de marketing e publicidade. Resultado: hoje nem o olival se safa. Por estas e por outras, faço minhas as palavras do Souto Moura: Deixem de ser parvos, EMIGREM!
30/03/11
Será que o ministro sabe o nome da senhora com quem casou?
Acho que isto diz tudo do PS do Sócrates e o resto é propaganda contra uma direita muito estúpida
Pergunta que não me sai da cabeça há uns dias. Em que país do mundo, um Partido Socialista usaria como argumento a seu favor o apoio prestado por Angela Merkel às suas medidas? E, no entanto, lá está ele bem em destaque, coroa de glória, no site do próprio. 24.Março A chanceler alemã exortou, esta quinta-feira, os partidos políticos portugueses a manter[em] o esforço de reequilíbrio das contas públicas previsto [por] José Sócrates. "Portugal apresentou um programa muito corajoso para os anos 2011, 2012 e 2013. É bastante apropriado. Lamento profundamente que não tenha encontrado uma maioria no Parlamento", afirmou Angela Merkel à chegada a Bruxelas para o Conselho Europeu. "Neste momento, é muito importante que todos os que falam em nome de Portugal digam claramente se estão unidos em torno do objectivo deste programa", disse. Angela Merkel lembrou, ainda, que a questão "não importa só para Portugal", mas que envolve "toda a Europa e em particular os Estados-membros da zona euro". Ficamos conversados quanto ao nível e interesse da política em Portugal.
29/03/11
Se não sabe por que é que pergunta
Dei-me ao trabalho de ler, com estes que a Terra há-de comer que eu cá não vou em cremações, que se visava assegurar uma trajectória descendente do rácio de dívida pública no PIB a partir de 2013, assim como a redução do défice de 4,6% do PIB em 2011, 3% em 2012 e 2% em 2013, e que para assegurar o ajustamento orçamental estaria em curso uma implementação de medidas de consolidação orçamental para 2011 – ajustamento estrutural do défice em 5,3% do PIB – que implicariam um reforço dos mecanismos de monitorização e controlo intra-anual da execução orçamental, assim como um reforço das medidas de consolidação adoptadas como precaução adicional face aos riscos resultantes da volatilidade do contexto financeiro e económico e que, para assegurar tal ajustamento, o esforço de consolidação e monitorização em curso, agora complementado com medidas adicionais em 2011, conferia uma margem de segurança adicional para o alcance da meta de 4,6% do PIB para o défice em 2011 e contribuia para o ajustamento da trajectória orçamental em 2012 e 2013, o qual teria de ser complementado por medidas nos anos seguintes, atenta a exigência das metas assumidas.
Tais gloriosas e singulares cousas – como diria Camões – só antes as lera no Campanha Alegre do Eça naquela cena em que, interrogado sobre as suas ideias em matéria de religião, o Partido Reformista respondia:
– Economias! (...).
Espanto geral.
– Bem! e em moral?
– Economias! – bradou.
– Viva! e em educação?
– Economias! – roncou.
– Safa! e nas questões de trabalho?
– Economias! – mugiu.
– Apre! e em questões de jurisprudência?
– Economias! – rugiu.
– Santo Deus! e em questões de literatura, de arte?
– Economias! – uivou. (...)
Fizeram-se novas experiências. Perguntaram-lhe:
– Que horas são? – Economias! – rouquejou.
(...) Fez-se uma nova tentativa, mais doce.
– De quem gosta mais, do papá, ou da mamã?
– Economias! (...)
Muito mais tarde o Coluche diria o mesmo, embora de forma diversa e em francês: Technocrates, c'est les mecs que, quand tu leur poses une question, une fois qu'ils ont fini de répondre, tu comprends plus la question que t'as posée.
Tais gloriosas e singulares cousas – como diria Camões – só antes as lera no Campanha Alegre do Eça naquela cena em que, interrogado sobre as suas ideias em matéria de religião, o Partido Reformista respondia:
– Economias! (...).
Espanto geral.
– Bem! e em moral?
– Economias! – bradou.
– Viva! e em educação?
– Economias! – roncou.
– Safa! e nas questões de trabalho?
– Economias! – mugiu.
– Apre! e em questões de jurisprudência?
– Economias! – rugiu.
– Santo Deus! e em questões de literatura, de arte?
– Economias! – uivou. (...)
Fizeram-se novas experiências. Perguntaram-lhe:
– Que horas são? – Economias! – rouquejou.
(...) Fez-se uma nova tentativa, mais doce.
– De quem gosta mais, do papá, ou da mamã?
– Economias! (...)
Muito mais tarde o Coluche diria o mesmo, embora de forma diversa e em francês: Technocrates, c'est les mecs que, quand tu leur poses une question, une fois qu'ils ont fini de répondre, tu comprends plus la question que t'as posée.
28/03/11
Contra a rendição da inteligência, perguntas com sentido
Este grupo de políticos tem em comum o entusiasmo que não consegue inspirar nos eleitores dos seus países respectivos. Não parecem acreditar com grande firmeza em qualquer conjunto coerente de princípios ou políticas. (…)
Beneficiários dos Estados-providência que põem em causa, eles são todos filhos de Thatcher: políticos que superintenderam ao recuo nas ambições dos seus antecessores (…)
Convencidos de que pouco podem fazer, pouco fazem. Deles o melhor que pode ser dito, como tantas vezes sucede com a geração baby boom, é que não defendem nada em particular: políticos light.
Já sem confiança em pessoas assim, perdemos a fé não só nos deputados e congressistas, mas no próprio parlamento e no congresso. Nessas alturas o instinto popular ou é "mandar os malandros para a rua" ou então deixar que façam o pior. Nenhuma das reacções é promissora: não sabemos como mandá-los para a rua, e já não nos podemos dar ao luxo de deixá-los fazer o seu pior. Uma terceira reacção – "derrubar o sistema" – é desacreditada pela sua inanidade intrínseca: que partes de que sistema, e a favor de que sistema substituto? De qualquer maneira, quem é que o vai derrubar?
(Tony Judt, Um tratado sobre os nossos actuais descontentamentos, Edições 70; p.133-4).
DAQUI
Beneficiários dos Estados-providência que põem em causa, eles são todos filhos de Thatcher: políticos que superintenderam ao recuo nas ambições dos seus antecessores (…)
Convencidos de que pouco podem fazer, pouco fazem. Deles o melhor que pode ser dito, como tantas vezes sucede com a geração baby boom, é que não defendem nada em particular: políticos light.
Já sem confiança em pessoas assim, perdemos a fé não só nos deputados e congressistas, mas no próprio parlamento e no congresso. Nessas alturas o instinto popular ou é "mandar os malandros para a rua" ou então deixar que façam o pior. Nenhuma das reacções é promissora: não sabemos como mandá-los para a rua, e já não nos podemos dar ao luxo de deixá-los fazer o seu pior. Uma terceira reacção – "derrubar o sistema" – é desacreditada pela sua inanidade intrínseca: que partes de que sistema, e a favor de que sistema substituto? De qualquer maneira, quem é que o vai derrubar?
(Tony Judt, Um tratado sobre os nossos actuais descontentamentos, Edições 70; p.133-4).
DAQUI
27/03/11
A book a day keeps the doctor away: "Ponto Ómega", Don DeLillo
Ponto Ómega não é um haiku, apesar de a sua contenção estar mais próxima do despojamento da forma japonesa do que da torrente épica de outros títulos, como, por exemplo, Submundo. No seu último romance, DeLillo oferece-nos apenas um trio de personagens e uma trama que se organiza, também ela, em três momentos breves. No primeiro, chamemos-lhe prólogo, assistimos a 24 Hour Psycho, vídeo-instalação criada por Douglas Gordon (um artista de carne e osso que esteve recentemente em Portugal a convite do Estoril Film Festival) e que, resumidamente, consiste na projecção do clássico de Hitchcock a um ritmo de dois fotogramas por segundo, estendendo-se, assim, por 24 horas. No segundo, somos transportados para o deserto do Arizona, retiro de Richard Elster, velho intelectual que serviu o Pentágono durante a guerra do Iraque e que acaba de receber em casa o jovem realizador Jim Findley, cujo sonho é fazer com ele um filme com um único plano-sequência. Aos dois juntar-se-á Jessie, filha de Elster, personagem que empurrará Ponto Ómega para um registo – chamemos-lhe thriller metafísico – próximo das atmosferas de Cormac. Por fim, o terceiro momento, em que regressamos de novo a 24 Hour Psycho e, assim, ao misterioso anónimo (quarta e obscura personagem, talvez Dennis, talvez o próprio autor, DeLillo...) que assistia já à sua projecção no prólogo: Havia um homem de pé, encostado à parede norte, quase invisível. Resumida a coisa de forma a não estragar o suspense (que o há), diga-se que Ponto Ómega é um livro estranho, a transbordar de referências políticas, filosóficas, cinematográficas, feito, apesar do seu reduzido número de páginas, para se degustar e não para se engolir de um trago (primeiro estranha-se, depois entranha-se). Um governo é uma iniciativa de carácter criminoso, escrevera Elster num ensaio antigo sobre o qual conversa agora com Findley. Eis uma frase que podíamos facilmente atribuir ao próprio DeLillo, crítico assumido da política norte-americana, mas que nos chega antes pela mão de um neoconservador (os neocon americanos assumem sem peias o seu cinismo e sabem que a guerra não é uma partida de canasta): O Estado tem de mentir. Não há nenhuma mentira na guerra ou na preparação para a guerra que não seja defensável. Nós fomos ainda mais além, resume. Inventariam, pois, uma nova forma de ver o mundo, assente em palavras e significados que, à maneira de um haiku, pretendia dar a ver o essencial: Eu queria uma guerra em haiku. (...) Queria uma guerra em três versos, diz Elster a dada altura. O tema do haiku remete-nos para a dimensão filosófica de Ponto Ómega, traduzida aqui nos fotogramas de Psycho. Cada um deles como que evidencia a natureza vital da experiência, à semelhança da forma japonesa onde se ensaia a Iluminação a partir da visão dos contrários, de acordo com o Zen, embora DeLillo prefira seguir pelos caminhos desbravados por Teilhard de Chardin, jesuíta vigiado pela Igreja que desconfiava dele e do seu darwinismo teológico – do seu “ponto ómega”: epifania da Consciência para onde converge inevitavelmente o mundo. Elster, cansado dos exércitos portadores do gene para a autodestruição, interpretará o conceito livremente (e DeLlilo com ele): Teremos de ser humanos para sempre? A consciência está exaurida. Regressemos à matéria inorgânica. É isso que nós queremos. Queremos ser pedras no meio do campo. E será, de certa forma, a essa condição que regressa Jessie, a filha, mas porque Ponto Ómega é um romance e não um ensaio, a epifania dela arrasta infortúnio e angústia. Chegados aqui, talvez possamos, contudo, ensaiar outra leitura e optar, como em Vertigo, por reencontrá-la no epílogo a assistir a 24 Hour Psycho, alheios às incongruências do tempo que, como sabia Henri Bergson (filósofo lido por Chardin), ou é invenção ou não é nada. Ponto Ómega, Don DeLillo, Sextante Editora, trad. de Paulo Faria, 128 págs.
26/03/11
Paulo Pinho e Manuel Futre ou corrijam-me se estiver errada
Paulo Futre em directo: Temos que ir buscar sponsors. Porquê? Porque se vem o melhor jogador chinês para aqui, vai vir charters todas as semanas de 400 ou 500 pessoas. O Sporting vai ter comissão dos charters, vai ter comissão dos hotéis, vai ter comissão dos restaurantes, dos museus, etc., etc., etc. Vamos só abrir um departamento para este jogador chinês.
Agora a sério. Não era esta, mais chinês menos chinês, a ideia do famigerado Pinho quando inventou o Allgarve e o o Portugal Europe’s West Coast?
25/03/11
A queda de um anjo
Sócrates, atacado de amnésia retrógrada, interroga-se em Bruxelas como é que foi possível fazerem isto ao país.
Conta-se pelos corredores que, ao ouvir o pungente desabafo, a senhora Merkel, num momento raro de comoção maternal, limpou-lhe uma lágrima ao canto do olho e... deu-lhe mais um beijinho.
As matilhas sempre me causaram urticária
Tropecei por acaso nesta notícia.
Não sendo admiradora incondicional de Manuel Maria Carrilho — por razões que o adiantado da hora me dispensa de explicar — nem por isso pude deixar de reparar na catrefa de insultos em forma de comentários que surgem no final da transcrição das suas críticas a Sócrates.
Anónimos, Pedros, Carlos e Marias juntaram-se todos — comme par hasard — em defesa do Engenheiro, e com tal energia o fizeram que, em 46 comentários, meia dúzia não serão de afrontamento.
O que me leva a lançar aqui um apelo aos militantes do PS encarregues da propaganda online: diversifiquem, porra!
Martelar 40 vezes a mesma coisa já foi política que deu uvas. É que, e parafraseando o outro, a malta pode estar pobre mas tão parva também não.
24/03/11
23/03/11
22/03/11
... e eu já estou a ver os habitantes das grutas a correrem à pedrada os recenseadores do INE
Ficam assim excluídos do conceito de pessoa sem-abrigo:
· As pessoas a viverem em edifícios abandonados;
· As pessoas que, não tendo um alojamento que possa ser classificado de residência habitual, no momento censitário estavam presentes em alojamentos colectivos como hospitais, centros de acolhimento com valência residencial, casas de abrigo, etc…
· As pessoas que, apesar de não terem uma residência habitual, no momento censitário se encontravam em alojamentos de amigos ou familiares;
· As pessoas a viverem em abrigos naturais, por exemplo grutas.
Uma pergunta. E não se pode, por exemplo, exterminar os tipos que pensam e escrevem estas coisas? [cheguei ao conhecimento de tão extraordinários conceitos aqui]
20/03/11
Triste sina a nossa quererem obrigar-nos a escolher entre Khadafi e Sarkozy
Até há pouco, pour le reste, era um problema de "personalidade" e "temperamento"...
19/03/11
O Sócrates e a cabine telefónica
Havia um treinador que dizia que o Futre era capaz de fintar três jogadores dentro de uma cabine telefónica, mas depois não sabia onde estava a porta. Este primeiro-ministro é a mesma coisa: é mestre em táctica, mas depois não sabe onde está a porta, porque não tem estratégia, Luís Campos e Cunha
Uma boa história é uma boa história é uma boa história.
18/03/11
Mangualde beach e a rua árabe
Tom Waits não se referia aos árabes mas que estava damn right estava: (...) vivemos no meio de uma revolução e ninguém sabe de que lado vêm as pedras. Se ao desabafo de Waits juntarmos um aforismo atribuído a Twain, conseguiremos um zoom aproximado à cena actual. E o que Mark Twain terá dito foi: A profecia é um género muito difícil, sobretudo quando aplicado ao futuro.
Andávamos, pois, bestialmente entretidos com o gigante chinês, o aquecimento global, as duas Coreias, a crise do Euro e a praia de água salgada projectada para Mangualde quando o pessoal árabe resolveu sair à rua.
O preço dos combustíveis disparou, foi-se o milhão de Magalhães que ia ser exportado para a Líbia, e até a Nelly Furtado perdeu dinheiro ao anunciar no Twitter ir doar o milhão de dólares que recebeu em 2007 para cantar para Kadhafi, ainda o homem não era um ditador anacrónico.
O preço dos combustíveis disparou, foi-se o milhão de Magalhães que ia ser exportado para a Líbia, e até a Nelly Furtado perdeu dinheiro ao anunciar no Twitter ir doar o milhão de dólares que recebeu em 2007 para cantar para Kadhafi, ainda o homem não era um ditador anacrónico.
Neste estado de coisas, suspenderam-se as chinesices e regressou-se aos árabes. Alguns correram a ligar a Al Jazira. Eu – sem televisão há já um bom par de anos por recomendação de uma junta médica – pusera-me à procura na estante d' O Quarteto de Alexandria.
Entretanto, cresce o número de interessados nos direitos humanos na Líbia, assunto que, dizem os cínicos, tem qualquer coisa que ver com petróleo, o que talvez seja verdade até porque segundo consta Diógenes, o maior de todos os cínicos, tinha por casa um barril.
Adiante. Não encontrei o Durrell mas tropecei na Bíblia do Humor Judaico, o que também me deu jeito. Cito:
Um passarinho caiu do ninho num dia de muito frio. Pia desesperadamente até que passa um menino que o agarra e coloca num monte de estrume ainda quente. O passarinho, quentinho, desata a cantar em louvor do salvador. É então que passa uma raposa que, ao ouvi-lo, pula de contentamento e o devora.
Moral da história.
1º: Nem sempre aquele que te põe na merda te quer mal;
2º: Nem sempre aquele que te tira da merda te quer bem;
3º: Porquê cantar quando se está na merda?
Um passarinho caiu do ninho num dia de muito frio. Pia desesperadamente até que passa um menino que o agarra e coloca num monte de estrume ainda quente. O passarinho, quentinho, desata a cantar em louvor do salvador. É então que passa uma raposa que, ao ouvi-lo, pula de contentamento e o devora.
Moral da história.
1º: Nem sempre aquele que te põe na merda te quer mal;
2º: Nem sempre aquele que te tira da merda te quer bem;
3º: Porquê cantar quando se está na merda?
No fundo, está tudo nos livros.
17/03/11
16/03/11
15/03/11
No tempo do ultramar é que havia hinos de jeito
Cavaco Silva dixit: Importa que os jovens deste tempo se empenhem em missões e causas essenciais ao futuro do país com a mesma coragem, o mesmo desprendimento e a mesma determinação com que os jovens de há 50 anos assumiram a sua participação na guerra do Ultramar.
Descoberto aqui (com banda-sonora e tudo)
O Mário Soares e o Nuno Álvares Pereira via José Sócrates ou o PS a fritar em lume brando
Mário Soares, goste-se ou não, foi o último homem político em Portugal. Já não exerce mas ainda mexe (Alegre que o diga...) e depois dele começámos a votar nas plantas.
Mexe e fala. Veio agora falar para dar uma cacetada no Sócrates. Não terá sido a machadada final, mas anda lá próximo
sobretudo se à crítica ao engenheiro se juntar o elogio a Passos Coelho
O que faltou a Soares para desferir o coup de grâce? Naturalmente, uma alternativa dentro do PS ao próprio Sócrates.
E enquanto o PS frita e nós com ele (essa parte é que me chateia), restar-nos-á então esperar por uma nova intervenção do D. Nuno Álvares Pereira, guerreiro valoroso e beato que, tendo salvo uma vez a Guilhermina do óleo da fritadura do peixe, talvez se digne comover-se connosco agora, desgraçados e encurralados, cada vez com mais vontade de morrer (como dizia o Herculano, citado pelo Soares).
Haverá milagre?
Salva in extremis pelo Inimigo Público
"Depois do PEC I, PEC II, PEC III, da tomada de posse de Cavaco Silva e da arbitragem de Carlos Xistra em Braga, a quarta réplica do Programa de Estabilidade e Crescimento de magnitude 10 na escala de Merkel, com epicentro em José Sócrates vai fazer deslocar o eixo da Terra em 25 centímetros.
As equipas de salvamento de 70 países começaram a chegar a Portugal para iniciar as operações de resgate dos milhares de pensionistas e portugueses de classe média.
Uma equipa de especialistas vem a Portugal para estudar o incremento de um sistema anti-PEC para minorar os danos futuros dos PEC V, VI, VII, VIII, XIX e X.
Os níveis anormais de radiação política de José Sócrates já levaram as autoridades a alargar para 20 km o raio de segurança entre o primeiro-ministro e os portugueses."
Confirmar a notícia aqui.
As equipas de salvamento de 70 países começaram a chegar a Portugal para iniciar as operações de resgate dos milhares de pensionistas e portugueses de classe média.
Uma equipa de especialistas vem a Portugal para estudar o incremento de um sistema anti-PEC para minorar os danos futuros dos PEC V, VI, VII, VIII, XIX e X.
Os níveis anormais de radiação política de José Sócrates já levaram as autoridades a alargar para 20 km o raio de segurança entre o primeiro-ministro e os portugueses."
Confirmar a notícia aqui.
14/03/11
Medidas do Estado social: e ainda dizem que o governo não é de esquerda
Pensava que passear de buggy por montes e vales verdejantes (com um caddie ao lado sempre pronto a servir-lhe algo...) era um handicap upper class?
Pois desengane-se. O governo acaba de anunciar mais um approach à democatização do desporto em Portugal: o IVA aplicado ao golfe desce de 23 para 6%.
... e sabendo-se como a prática desta modalidade é eficaz no combate ao stress, antecipo já filas e filas de desempregados a invadir os campos, numa reedição da reforma agrária 75 agora todos ao shot e fé no camarada Sócrates.
A book a day keeps the doctor away: "O Filho de Campo de Ourique e Outras Histórias", António Figueira
Estreia na ficção de António Figueira (n.1961), O Filho de Campo de Ourique e Outras Histórias reúne 17, esgalhadas sob o signo da ironia.
Manejo robusto da linguagem e uma construção cheia de piscadelas de olho ao leitor (as histórias lembram “bonequinhas russas” ou “caixinhas chinesas”, conforme — ideologicamente — se preferir) são qualidades evidentes deste primeiro livro.
Duas coisas a destacar, de caras: domínio alargado do português — contrariando a actual tendência para o encolhimento da língua, à imagem e semelhança do que já acontecia ao Deus de Bouvard e Pécuchet —, e desrespeito pelas fronteiras dos géneros, opção que me parece inevitável para quem queira fazer hoje literatura.
Manejo robusto da linguagem e uma construção cheia de piscadelas de olho ao leitor (as histórias lembram “bonequinhas russas” ou “caixinhas chinesas”, conforme — ideologicamente — se preferir) são qualidades evidentes deste primeiro livro.
Duas coisas a destacar, de caras: domínio alargado do português — contrariando a actual tendência para o encolhimento da língua, à imagem e semelhança do que já acontecia ao Deus de Bouvard e Pécuchet —, e desrespeito pelas fronteiras dos géneros, opção que me parece inevitável para quem queira fazer hoje literatura.
As histórias (ou contos, não há que ter medo das palavras...) doseiam com parcimónia imaginação e verosimilhança, construindo personagens e situações reconhecíveis e plausíveis mas, ao mesmo tempo, muito para lá do registo realista, visivelmente contaminado o seu autor pelo mal de Montano, enfermidade cuja sintomatologia foi brilhantemente descrita por Enrique Vila-Matas.
O filho de Campo de Ourique (1961-1986), o próprio (o que dá título ao livro), escritor genial embora tardio e, infelizmente, como Sócrates, o grego, sem herança escrita (não vou contar para não perder a graça...), foge, contudo, à categoria dos “escritores do não” tão querida ao escritor espanhol, espécimen português típico, ou seja, combinação explosiva de preguiça, arrebatamento e circunstâncias infelizes, cumpridor, pois, da máxima lusa: tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado.
E assim seria, se António Figueira não optasse pelo saudável distanciamento da ironia, enquanto se mostra/esconde nesta espécie de auto-ficção rés-vés Campo de Ourique cheia de saudáveis estrangeirismos.
O Filho de Campo de Ourique e Outras Histórias, António Figueira, D. Quixote
O Filho de Campo de Ourique e Outras Histórias, António Figueira, D. Quixote
13/03/11
Só para pôr as coisas em perspectiva: a Helena Matos será formada em astrofísica ou assim?
Há uma suficiência tipicamente portuguesa assim como há uma incultura tipicamente portuguesa. Andam quase sempre de mão dada, como bem topou o Jorge de Sena já lá vão, portanto, uns aninhos.
Mais recentemente, o episódio Leopoldina protagonizado por Miguel Sousa Tavares comprova bem o quanto as moscas mudaram mas a merda nem por isso.
Para manter a lista actualizada, temos agora a intrépida Helena Matos a vociferar contra “Os filhos de Boaventura e @ gauche-caus@-modalisboa-lux” (título que, como a própria diria, é todo um programa).
O texto começa assim: Doutores em sociologia e relações internacionais, que tiveram bolsas de mestrado, bolsa de doutoramento, manifestam-se agora porque querem um contrato de trabalho que respeite as suas qualificações.
Se não fosse Helena... Helena, eu diria: é de homem!
Porque se também eu me espantei com a formação académica de um dos organizadores do protesto “Geração à Rasca” (licenciado em Relações Internacionais com mestrado em Estudos sobre Paz e Conflitos em África...), nunca por nunca ousaria enfrentar com tanta coragem e músculo as hordas de sociólogos que ontem saíram à rua.
Já agora, e sem querer entrar na polémica (deus me livre de polémicas!) sobre as “duas culturas” (Letras versus Ciências), perguntava, dado o patente desprezo de Helena pela sociologia e/ou relações internacionais (está mais do que no seu direito...): a senhora é formada em quê?
Mais recentemente, o episódio Leopoldina protagonizado por Miguel Sousa Tavares comprova bem o quanto as moscas mudaram mas a merda nem por isso.
Para manter a lista actualizada, temos agora a intrépida Helena Matos a vociferar contra “Os filhos de Boaventura e @ gauche-caus@-modalisboa-lux” (título que, como a própria diria, é todo um programa).
O texto começa assim: Doutores em sociologia e relações internacionais, que tiveram bolsas de mestrado, bolsa de doutoramento, manifestam-se agora porque querem um contrato de trabalho que respeite as suas qualificações.
Se não fosse Helena... Helena, eu diria: é de homem!
Porque se também eu me espantei com a formação académica de um dos organizadores do protesto “Geração à Rasca” (licenciado em Relações Internacionais com mestrado em Estudos sobre Paz e Conflitos em África...), nunca por nunca ousaria enfrentar com tanta coragem e músculo as hordas de sociólogos que ontem saíram à rua.
Já agora, e sem querer entrar na polémica (deus me livre de polémicas!) sobre as “duas culturas” (Letras versus Ciências), perguntava, dado o patente desprezo de Helena pela sociologia e/ou relações internacionais (está mais do que no seu direito...): a senhora é formada em quê?
Engenharia aeroespacial? Econometria? Nanociência? Ou, quiçá, em "Medicina Quântica"?
12/03/11
Geração parva
Sonhei que chegava ao trabalho e me sentava para a reunião de passagem de turno. Ninguém falava, mas à segunda-feira as coisas arrancam devagar. Olhei, interrogativo, a Valéria, que fizera o turno da noite. Como ela se mantivesse calada, disse, sem elevar a voz: — Podemos começar. A Valéria olhou nervosamente para os apontamentos. — Aconteceu alguma coisa? —perguntei, enquanto procurava os olhos da Júlia. A Júlia é a chefe de serviço e coordenadora do departamento. Quando me esqueço de alguma coisa — o que sucede com alguma frequência nos últimos anos — ela toma a palavra com naturalidade. Também me substitui em algumas conferências e, desde Janeiro, acompanha-me às reuniões do Conselho. Mas a Júlia não levantou os olhos. Então, do lado esquerdo, aproximou-se o Rogério, o jovem promissor que o Conselho contratou em Novembro, e, com aquela voz mansa que sempre me irritou levemente, disse: —Precisamos de falar.
— Depois de receber o turno, se não se importa — respondi, com autoridade.
— Acho que o senhor ainda não percebeu, Dr. Santos, nós já passámos o serviço — continuou o Rogério, sempre de pé, ligeiramente inclinado, do meu lado esquerdo.
Voltei a procurar a Júlia e pela segunda vez ela me falhou.
— Achámos que chegou a hora de ser substituído na direcção da empresa, Dr. Santos. Espero que compreenda essa necessidade e se integre no Novo Espírito, como a esta hora está a suceder por todo o lado, neste país, e em toda zona mediterrânea.
— Mas substituído por quem, ó Rogério ? E por ordem de quem? E por alma de quem? — tentei ironizar, calando prudentemente a minha surpresa pela erudição geopolitica do Rogério.
— Por mim - respondeu o rapaz. Ordens do Conselho, interpretando o Movimento a que pertenço.
— Do Conselho? — interroguei perplexo?
— De alguns membros do Conselho — explicou ele, tolerante. — Os mais jovens.
— Mas porquê você, Rogério? — comecei eu, jogando na divisão, e olhando cúmplice para a assistência. — Você, Rogério, tem um contrato magnifico, bem mais vantajoso do que o meu, ao que julgo saber. E, se se trata de promover uma renovação geracional, por que não dar o lugar à Dra. Júlia, muito mais preparada que você, caro Rogério, perdoe a franqueza.
— A Dra. Júlia faz parte da classe que deteve o poder, Dr. Santos, ou esteve perto dele, ou perto da geração do poder. As coisas mudaram, queira deixar essa cadeira.
Tentei protestar. — Cidália, tu que tanto protegi. — Fernando, que levei à conferência de Munique. — Serena, o que vai ser do teu projecto de doutoramento?
Levantei-me da cadeira. Igual às outras, afinal. Mas, pela colocação na sala e pelo uso que eu lhe dera, simbolizava a minha tíbia direcção. Se alguma coisa sei é a força que têm os símbolos. E também sei que em épocas destas é preciso respeitar gente como o Rogério e os membros mais jovens do Conselho. Tenho a pensão da minha mãe para defender — nem tudo está perdido.
Para quê o FMI quando temos o socialista José Sócrates?
Mais austeridade, sempre em nome dos mercados, e — esta é relativamente nova — também da dignidade e do prestígio do país.
Se não fosse o adiantado da hora eu dizia-te onde podias meter a "dignidade" e o "prestígio"...
Se não fosse o adiantado da hora eu dizia-te onde podias meter a "dignidade" e o "prestígio"...
[Entretanto, o Pedro Correia explica bem o novo pacote]
11/03/11
O mundo é um lugar estranho
Optimistas são as pessoas que insistem que o mundo que temos é o melhor possível; pessimistas são as que suspeitam que os optimistas podem ter razão, Zygmunt Bauman
10/03/11
Alguém que dê, por caridade, umas aulas de história ao Miguel Sousa Tavares
Não foi a rua que libertou os escravos; foi a imperatriz Leopoldina.
A frase tem o seu quê de imperial mas, infelizmente, Miguel Sousa Tavares, comentador encartado que, ao contrário, por exemplo, de Al Pacino, não melhorou nada com a idade, disse uma bacorada.
A abolição da escravatura só seria decretada no Brasil bastante mais tarde, pela Princesa Isabel, neta da Leopoldina citada pelo dito.
E era só.
09/03/11
Hibernemos, irmãos, hibernemos
O humor português, tirando as anedotas alentejanas, não será dos melhores do mundo mas que Portugal é na sua essência uma anedota... ninguém disso duvide.
Este ano já tivemos umas doidas a lançar as cinzas de um morto para dentro de um respiradouro de Metro, depois tivemos o "povo de esquerda" a votar militantemente no Festival da Canção, agora temos o povo, presumo que de direita, a tentar impedir que o grupo vencedor vá à Eurovisão.
E ainda só vamos em Março...
Este ano já tivemos umas doidas a lançar as cinzas de um morto para dentro de um respiradouro de Metro, depois tivemos o "povo de esquerda" a votar militantemente no Festival da Canção, agora temos o povo, presumo que de direita, a tentar impedir que o grupo vencedor vá à Eurovisão.
E ainda só vamos em Março...
08/03/11
A book a day keeps the doctor away: "Jerusalém Ida e Volta", Saul Bellow
Nunca a Saul Bellow (1915-2005) poderiam ser atribuídos os versos de Rimbaud: Par délicatesse/ J'ai perdu ma vie.
Polemista, cinco casamentos e entrevistado temível, Bellow foi exuberante na ficção e nas ideias. Restará para sempre como autor do extraordinário Herzog, mas também da pergunta Quem é o Tolstoi dos Zulus? O Proust dos Papuas? Ficaria feliz por poder lê-los, sobre a qual se explicaria mais tarde, classificando o escândalo provocado pela sua inconveniência de jornalístico, dado a frase ter sido retiradado contexto... (Saul Bellow, como Karl Kraus, não era grande admirador de jornalistas).
Israel, por seu turno, não é tema que se chame para a mesa, a não ser que se queira correr o risco de azedar o jantar.
O resultado da combinação do homem e da sua circunstância (no caso, judeu americano em visita à cidade santa das três religiões monoteístas) deu origem a Jerusalém Ida e Volta, um título datado de 1976, já lá vão, portanto, 35 anos, sem que nada de substancial se tenha alterado.
Escreve Carlos Vaz Marques, no Prefácio, que se trata de um livro político. Certamente. Em Jerusalém seria impossível fugir a isso, além de que Bellow não é um viajante qualquer — o seu coração bate por Israel:
Está-se numa cidade como muitas outras — bem, não exactamente, pois das cidades antigas que já visitei Jerusalém é a única em que as antiguidades não são expostas como relíquias, mas têm um uso diário. Ainda assim, é uma cidade moderna com serviços modernos. Fazem-se compras em supermercados, diz-se bom-dia aos nossos amigos pelo telefone, ouvem-se orquestras sinfónicas na rádio. Mas, de repente, a música pára e dá-se a notícia de uma bomba terrorista. Mais uma explosão em frente de um café na Estrada de Jafa: seis jovens mortos e trinta e oito feridos. Angustiados, pousamos a nossa bebida civilizada. Apreensivos, vamos para o nosso jantar civilizado. Por todo o lado, explodem bombas. Em Londres, usou-se dinamite ainda há pouco tempo. A diferença está no facto de, quando explode uma bomba num restaurante do West End, não se pôr em causa o direito fundamental da Inglaterra à existência.”
Se a política é o fio condutor dos vários textos reunidos, o mais interessante é o enorme talento literário de Bellow a transpirar por todos os parágrafos. É difícil resistir a frases como: A polícia devia ser ‘politizada’ e transformada, na medida do possível, num braço paramilitar e guerrilheiro do governo revolucionário, que o escritor de Chicago remata com Isto é leninismo, puro, sem gelo nem aperitivos.
Como na ficção, também aqui Bellow se mostra capaz de acrobacias estonteantes, passando do tema mais árido ou elevado à comicidade mais livre e inesperada: O julgamento moral, um espectro na Europa, metamorfoseia-se num gigante vigoroso quando se fala de Israel ou dos palestinianos. (…) Como a Suíça está para as férias de Inverno e a costa da Dalmácia para o turismo de Verão, Israel e os palestinianos estão para a necessidade de justiça do Ocidente — são uma espécie de estância moral.
A sua discordância de Sartre — explanada com vigor e ironia — beberá muito dessa recusa em deixar-se levar pelo intelectualismo das ideias, fazendo questão de as chamar à terra. Ou como disse de forma definitiva Allan Bloom (que Bellow imortalizaria em Ravelstein, o seu último romance publicado no ano 2000), he has always understood that even if you are on your way from Becoming to Being, you still have to catch the train at Randolph Street.
O livro é, sobretudo, uma colecção de tipos impagáveis, personagens romanescas desenhadas com profundidade, verdade e compaixão (Philip Roth lembrou uma vez que os retratos do escritor estavam na linha de Rembrandt, uma comparação que vale pelo menos dois doutoramentos em Bellow).
Figuras públicas de topo como Teddy Kollek, presidente da Câmara de Jerusalém, Isaac Rabin, Henry Kissinger, Mahmud Abu Zuluf, editor do jornal árabe de maior tiragem em Jerusalém, etc., mas também John Auerbach, marinheiro kibbutznik que acaba de perder o filho, Moshe, massagista competente que gosta de conversar sobre literatura, Meyer Weisgal, octogenário e pioneiro sionista fundador do Instituto de Rehovoth, Dennis Silk, poeta cansado da guerra…
Enquanto se aguarda a tradução de Letters, compilação da correspondência de Bellow publicada no final do ano passado, este livro é um excelente aperitivo. O tema, dramático, não podia ser ao mesmo tempo mais literário, já que é a própria vida, com as suas contradições, paradoxos, crueldade, beleza, desordem e multiplicidade que se joga naquele pequeno pedaço de terra. Ou como se conta na anedota judaica: Deus guiou o povo eleito no deserto durante quarenta anos, para o conduzir ao único lugar do Médio Oriente onde não petróleo.
Alexandra, à data mulher de Bellow, acompanha-o na viagem. Não é judia e atravessa o livro discretamente, sem chegar de facto a entrar nele. Contudo, ainda a caminho de Jerusalém, o diálogo entre ela e o marido diz tudo sobre a tragicomédia do um conflito que teima em não se resolver.
No avião, a abarrotar de ruidosos hassidim, Alexandra comenta: — Eu gosto deles (…) São tão animados, tão infantis. — Viver com eles não te havia de parecer tão fácil (…) — Mas são tão joviais (…). Adoro aquela roupa. Não consegues arranjar um chapéu daqueles? São lindos. — Não sei se os vendem a gentios.
A vida e Bellow no seu melhor.
Polemista, cinco casamentos e entrevistado temível, Bellow foi exuberante na ficção e nas ideias. Restará para sempre como autor do extraordinário Herzog, mas também da pergunta Quem é o Tolstoi dos Zulus? O Proust dos Papuas? Ficaria feliz por poder lê-los, sobre a qual se explicaria mais tarde, classificando o escândalo provocado pela sua inconveniência de jornalístico, dado a frase ter sido retiradado contexto... (Saul Bellow, como Karl Kraus, não era grande admirador de jornalistas).
Israel, por seu turno, não é tema que se chame para a mesa, a não ser que se queira correr o risco de azedar o jantar.
O resultado da combinação do homem e da sua circunstância (no caso, judeu americano em visita à cidade santa das três religiões monoteístas) deu origem a Jerusalém Ida e Volta, um título datado de 1976, já lá vão, portanto, 35 anos, sem que nada de substancial se tenha alterado.
Escreve Carlos Vaz Marques, no Prefácio, que se trata de um livro político. Certamente. Em Jerusalém seria impossível fugir a isso, além de que Bellow não é um viajante qualquer — o seu coração bate por Israel:
Está-se numa cidade como muitas outras — bem, não exactamente, pois das cidades antigas que já visitei Jerusalém é a única em que as antiguidades não são expostas como relíquias, mas têm um uso diário. Ainda assim, é uma cidade moderna com serviços modernos. Fazem-se compras em supermercados, diz-se bom-dia aos nossos amigos pelo telefone, ouvem-se orquestras sinfónicas na rádio. Mas, de repente, a música pára e dá-se a notícia de uma bomba terrorista. Mais uma explosão em frente de um café na Estrada de Jafa: seis jovens mortos e trinta e oito feridos. Angustiados, pousamos a nossa bebida civilizada. Apreensivos, vamos para o nosso jantar civilizado. Por todo o lado, explodem bombas. Em Londres, usou-se dinamite ainda há pouco tempo. A diferença está no facto de, quando explode uma bomba num restaurante do West End, não se pôr em causa o direito fundamental da Inglaterra à existência.”
Se a política é o fio condutor dos vários textos reunidos, o mais interessante é o enorme talento literário de Bellow a transpirar por todos os parágrafos. É difícil resistir a frases como: A polícia devia ser ‘politizada’ e transformada, na medida do possível, num braço paramilitar e guerrilheiro do governo revolucionário, que o escritor de Chicago remata com Isto é leninismo, puro, sem gelo nem aperitivos.
Como na ficção, também aqui Bellow se mostra capaz de acrobacias estonteantes, passando do tema mais árido ou elevado à comicidade mais livre e inesperada: O julgamento moral, um espectro na Europa, metamorfoseia-se num gigante vigoroso quando se fala de Israel ou dos palestinianos. (…) Como a Suíça está para as férias de Inverno e a costa da Dalmácia para o turismo de Verão, Israel e os palestinianos estão para a necessidade de justiça do Ocidente — são uma espécie de estância moral.
A sua discordância de Sartre — explanada com vigor e ironia — beberá muito dessa recusa em deixar-se levar pelo intelectualismo das ideias, fazendo questão de as chamar à terra. Ou como disse de forma definitiva Allan Bloom (que Bellow imortalizaria em Ravelstein, o seu último romance publicado no ano 2000), he has always understood that even if you are on your way from Becoming to Being, you still have to catch the train at Randolph Street.
O livro é, sobretudo, uma colecção de tipos impagáveis, personagens romanescas desenhadas com profundidade, verdade e compaixão (Philip Roth lembrou uma vez que os retratos do escritor estavam na linha de Rembrandt, uma comparação que vale pelo menos dois doutoramentos em Bellow).
Figuras públicas de topo como Teddy Kollek, presidente da Câmara de Jerusalém, Isaac Rabin, Henry Kissinger, Mahmud Abu Zuluf, editor do jornal árabe de maior tiragem em Jerusalém, etc., mas também John Auerbach, marinheiro kibbutznik que acaba de perder o filho, Moshe, massagista competente que gosta de conversar sobre literatura, Meyer Weisgal, octogenário e pioneiro sionista fundador do Instituto de Rehovoth, Dennis Silk, poeta cansado da guerra…
Enquanto se aguarda a tradução de Letters, compilação da correspondência de Bellow publicada no final do ano passado, este livro é um excelente aperitivo. O tema, dramático, não podia ser ao mesmo tempo mais literário, já que é a própria vida, com as suas contradições, paradoxos, crueldade, beleza, desordem e multiplicidade que se joga naquele pequeno pedaço de terra. Ou como se conta na anedota judaica: Deus guiou o povo eleito no deserto durante quarenta anos, para o conduzir ao único lugar do Médio Oriente onde não petróleo.
Alexandra, à data mulher de Bellow, acompanha-o na viagem. Não é judia e atravessa o livro discretamente, sem chegar de facto a entrar nele. Contudo, ainda a caminho de Jerusalém, o diálogo entre ela e o marido diz tudo sobre a tragicomédia do um conflito que teima em não se resolver.
No avião, a abarrotar de ruidosos hassidim, Alexandra comenta: — Eu gosto deles (…) São tão animados, tão infantis. — Viver com eles não te havia de parecer tão fácil (…) — Mas são tão joviais (…). Adoro aquela roupa. Não consegues arranjar um chapéu daqueles? São lindos. — Não sei se os vendem a gentios.
A vida e Bellow no seu melhor.
Tinta-da-China, 2011, trad. Raquel Moura
07/03/11
Às vezes me espanto, outras me envergonho ou a luta de classes à luz do Festival da Canção
A prova que vivemos soterrados em informação inútil é que também eu fiquei a saber da existência de um grupo chamado “Homens da Luta”. Li algures que “trazem de volta a música de intervenção, de raízes tradicionais e ritmos africanos e cheias de humor”.
A descrição não me diz nada mas já a música vencedora do Festival da Canção , em que parece que o POVO (de esquerda) votou com ardor e valentia, me deixou estarrecida.
E mais estarrecida fiquei quando dei conta que andam por aí a elevar o Jel (julgo ser o nome do líder) à categoria de cantor de protesto, confirmando assim as previsões de João Lisboa que bem disse não ser improvável que, empolgada pelo efeito-Deolinda, uma nova vaga de politólogos, sociólogos, hermeneutas, historiadores, exegetas, psicólogos e outros Professores Karamba, se lance, avidamente, sobre o crucial acontecimento político-cultural que foi a vitória dos Homens da Luta na relíquia televisiva anual conhecida como Festival RTP da Canção.
Pensava eu que o tempo do Festival da Canção acabara com a televisão a cores. Afinal, voltou com os “Homens da Luta”.
Dizem eles que a sua “ideologia é a luta pela luta" e que querem “o povo na rua a gritar".
Pior do que isto só a Ermelinda Duarte a cantar Somos Livres, vulgo “Uma gaivota voava/voava...”.
A descrição não me diz nada mas já a música vencedora do Festival da Canção , em que parece que o POVO (de esquerda) votou com ardor e valentia, me deixou estarrecida.
E mais estarrecida fiquei quando dei conta que andam por aí a elevar o Jel (julgo ser o nome do líder) à categoria de cantor de protesto, confirmando assim as previsões de João Lisboa que bem disse não ser improvável que, empolgada pelo efeito-Deolinda, uma nova vaga de politólogos, sociólogos, hermeneutas, historiadores, exegetas, psicólogos e outros Professores Karamba, se lance, avidamente, sobre o crucial acontecimento político-cultural que foi a vitória dos Homens da Luta na relíquia televisiva anual conhecida como Festival RTP da Canção.
Pensava eu que o tempo do Festival da Canção acabara com a televisão a cores. Afinal, voltou com os “Homens da Luta”.
Dizem eles que a sua “ideologia é a luta pela luta" e que querem “o povo na rua a gritar".
Pior do que isto só a Ermelinda Duarte a cantar Somos Livres, vulgo “Uma gaivota voava/voava...”.
Ou o Daniel Oliveira a garantir que eles são a prova que temos hoje mais sentido de humor.
Humor, Daniel Oliveira?!!!!
Tragam-me uma caixa de Kleenex.
Humor, Daniel Oliveira?!!!!
Tragam-me uma caixa de Kleenex.
05/03/11
A nacional-socialista Françoise Dior ou "Dior J’Adolf" ou deixem-se de merdas
Eu bem que perguntei: O que eu gostaria de saber era se os mesmos que com tanta facilidade e veemência vêm hoje a público indignar-se com uma troca de insultos o fariam ontem, quando os judeus estavam realmente na merda e os insultos se traduziam em viagens de comboio só com bilhete de ida.
A pergunta seria retórica, a resposta não.
DAQUI
A pergunta seria retórica, a resposta não.
DAQUI
04/03/11
Fazendo jus ao meu glorioso passado de crítica de modas & bordados venho aqui declarar que gosto do John Galliano e acho isto tudo uma histeria
O homem que disse: simplicity is a such a bore! Sometimes the real fun is in bad taste acabou por pagar caro a coerência.
O escândalo em que se envolveu recentemente e que levou ao seu despedimento da Dior e, porventura, ao ostracismo do fashion world, foi um momento de inegável mau gosto e prova que a maioria da malta não sabe apanhar bebedeiras.
Dito isto, gostaria de dizer mais algumas coisas.
A primeira de todas é esta: actualmente, não há nada mais fácil do que sair em defesa dos judeus. O que eu gostaria de saber era se os mesmos que com tanta facilidade e veemência vêm hoje a público indignar-se com uma troca de insultos o fariam ontem, quando os judeus estavam realmente na merda e os insultos se traduziam em viagens de comboio só com bilhete de ida.
Em segundo lugar, o uso dos telemóveis como arma de registo. Confesso que começo a ficar um pouco apreensiva com isto de uma pessoa ir na rua, dar um peido e alguém gravar o descuido.
Em terceiro lugar, e voltando ao teatral Galliano (está tudo aí, na palavra teatral), muito me surpreende que até hoje tenham aplaudido de pé a sua evidente “loucura”, para virem depois exigir-lhe que se porte como um manga-de-alpaca.
Dito isto, gostaria de dizer mais algumas coisas.
A primeira de todas é esta: actualmente, não há nada mais fácil do que sair em defesa dos judeus. O que eu gostaria de saber era se os mesmos que com tanta facilidade e veemência vêm hoje a público indignar-se com uma troca de insultos o fariam ontem, quando os judeus estavam realmente na merda e os insultos se traduziam em viagens de comboio só com bilhete de ida.
Em segundo lugar, o uso dos telemóveis como arma de registo. Confesso que começo a ficar um pouco apreensiva com isto de uma pessoa ir na rua, dar um peido e alguém gravar o descuido.
Em terceiro lugar, e voltando ao teatral Galliano (está tudo aí, na palavra teatral), muito me surpreende que até hoje tenham aplaudido de pé a sua evidente “loucura”, para virem depois exigir-lhe que se porte como um manga-de-alpaca.
03/03/11
O Steiner e eu
O Steiner não é o Papa, mas não deixa de me dar muito gozo que o senhor pense o mesmo que eu: "José Saramago não é o maior escritor português da actualidade. Para mim, esse é, de longe, António Lobo Antunes."
Há quem de certeza vá passar a achar o mesmo.
02/03/11
Merkel recebe Sócrates dois meses depois do tal telefonema que nunca existiu (aqui)
A viagem de hoje à Alemanha desperta insignes lendas e heroísmos.
Desta vez, porém, quem vai de corda ao pescoço a fazer de Egas Moniz não é Sócrates nem sequer Teixeira. Quanto a Merkel, duvida-se que a sua margem de comoção se equipare à de Afonso VII. E isto, parecendo que não, muda completamente o cenário e a moral da história. Vinheta picada aqui.
Desta vez, porém, quem vai de corda ao pescoço a fazer de Egas Moniz não é Sócrates nem sequer Teixeira. Quanto a Merkel, duvida-se que a sua margem de comoção se equipare à de Afonso VII. E isto, parecendo que não, muda completamente o cenário e a moral da história. Vinheta picada aqui.
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