Há um provérbio português que diz assim: Mais vale cair em graça que ser engraçado. Ocorre-me a máxima a propósito de um texto de João Bonifácio sobre o último concerto de Leonard Cohen em Portugal. A coisa tem dias mas só recentemente me chamaram a atenção para tão «explosiva» prosa.
Não conheço Bonifácio e do Cohen conheço-lhe apenas a poesia e as canções. Mas sei, isso sei, quando alguém se esforça desesperadamente por ter graça e parecer irreverente. Sei-o, porque há uma notória diferença entre SÊ-LO e parecê-lo.
(...) Tudo o que de mau há na música de Cohen das últimas décadas - os arranjos ao gosto de Julio Iglesias, o funk branco soft porno???, as harmonias de guitarra à Casino do Estoril, os órgãos planantes para dois dedos de Martini em varanda de resort de luxo ao pôr-do-sol - esteve ali demasiado exposto, bem ao gosto dos turistas alemães de classe média alta???.
(...) É que, por detrás daquela voz de charme e da pose de cavalheiro que está ali por acaso???, ele canta: a sida, a crueldade emocional, o sado-masoquismo, o terror, o advento do fascismo, o crack, o sexo anal, o cunilingus enquanto forma de salvação, todas as coisas bonitas de que precisamos quando estamos de férias no Algarve???.
A minha recomendação é que João Bonifácio passe umas boas férias no Allgarve, já agora, deixe de usar tantas vezes o evocativo «judeu» e, sobretudo, não faça tanta questão em ter graça. Porque não tem. A não ser que estejamos a referirmo-nos àquela sua famosa tradução do Ne me quitte pas de Jacques Brel em que Laisse-moi devenir (...) L’ombre de ton chien passou hilariantemente a Deixa-me ser o ombro do teu cão…