Não sou cristã. Nem por convicção, nem por água benta. Em casa de meus pais pontificava Jean Barois.
Pequenina, sentia-me estranha no colégio por ser a única que não acreditava em Deus. Às vezes falava com Ele e pedia-lhe um sinal. Coisas pueris. Que chovesse num dia de sol. Que a marmelada da sanduíche se transformasse em queijo. Que a camisola de lã me deixasse de picar. Nunca obtive resposta.
Já crescida, li sobre a Inquisição e outros temas edificantes da historiografia cristã. Tive a minha fase mata-frades. Há uns anos, em Auschwitz, voltei a sentir vontade de despachar alguns elementos do clero, mas também já me cruzei com católicos interessantes.
Pela parte que me toca, irrita-me o Novo Testamento. Prefiro a neurose judaica ao sorriso da Teresa de Calcutá (do que é que ela ri, afinal?).
À Virgem Maria, reputo-a responsável por séculos de prazer subtraído às mulheres; e mesmo a única ideia evangélica na aparência simpática — a de que somos todos irmãos em Deus — subverteu-a o proselitismo: os que negavam o parentesco eram perfilhados à força.
Chegada aqui, não sou cristã mas também não sou ateia. Gosto de me pensar panteísta, à maneira de Espinosa ou de Einstein. Ao ateísmo acho-lhe sobretudo uma falha: empobrece a imaginação. Quanto a acreditar em Deus, lembro a frase de Hemingway, citada pelo escritor Lobo Antunes, quando lhe perguntaram por isso: “Às vezes, à noite, no escuro”.
Agora quanto aos pedófilos, é assim. As denúncias são demasiadas, e demasiado graves, para que se possa continuar na lengalenga do costume que todas as classes (???) têm defeitos (???) desse género (???) (em Portugal, ao que parece, a coisa resume-se mesmo ao Frederico da Madeira que bazou para o Brasil).
Não sendo católica, e reconhecendo que as religiões de Deus único não terão trazido assim tanto Bem ao mundo, confesso, porém, que fico um pouco assustada com a hipótese de a Ratzinger sucederem os Bob Proctor. É que o primeiro, ao que dizem, terá de responder ante Deus. O Deus dele. Mas pelo menos isso.
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13 comentários:
Como por vezes, cá estou a lê-la.
Na minha opinião, M. Teresa de Cálcutá foi uma mulher que deixou obra feita. Não viveu no esplendor. Passou por cá, já não está, mas há relatos positivos da sua obra, da sua passagem.
Quanto ao resto da sua raiva-escrita, estou 100% de acordo. Assino por baixo.
Fique bem.
Em Portugal os padres entretinham-se com as beatas e dixavam os piquenos e as piquenas em paz.
O que vou contra é certo e verdadeiro.
Tive uma infância católica. Aos dez anos, na confissão para a comunhão solene, um padre que para ali veio ajudar o pároco (as filas de confessantes eram grandes), quis saber se eu me "tocava" ou "tocava em rapazes". Não percebi do que ele falava, mas agrediu-me o sentido com que ele falava. Não quis responder.
Dois anos depois, em segredo, o pároco - muito estimado, aliás - mudou de paróquia. Eu já estava resolvida a ser uma desiludida do catolicismo e decidi: não vou mais à missa. Espanto em casa: Mas porquê? Porque não quero. Foi então que o meu pai disse, com um suspiro: Se não queres, não vais. E não se fala mais nisso.
Muito mais tarde contou-me que andara aflito. O padre tão estimado tinha o costume de seduzir meninas e parece que o pai de uma delas veio a saber e lhe bateu forte e feio. Foi "corrido", dizia-se.
Não sei quem foram as vítimas. Teriam a minha idade. Nem me lembro do nome desse padre. É pena.
Agnóstica convicta, não me interessam muito as contas que pedófilos e quem os encobre tenham de dar ao seu Deus. Interessam-me, sim, as contas que eles têm de me dar a mim, a si, a todos. Por crime.
Guidinha, a M Teresa de Calcutá daria pano para mangas, mas ficará para outra altura
Anónimo, e nem um só machão pedófilo?
Maj, falo de duas coisas no meu post. Ou melhor, de três. Informo que não sou cristã, declaro que a pedofilía me repugna (claro que é crime!), e mostro-me inquieta com o futuro depois da Igreja, tal como a conhecemos. Apesar de não nutrir nenhuma simpatia pela instituição
1. reconheço que em muitos sítios é o único apoio de muita gente desesperada,
2. aflige-me um mundo sem deus, não porque acredite nele mas porque a alternativa - o materialismo mais ou menos new age e a "lei da selva" - não tem nenhuma figura que a regule. Infelizmente, não tenho tanta fé assim da espécie humana para acreditar que o mundo ficaria melhor apenas entregue aos homens. .
«...não tenho tanta fé assim NA espécie humana para acreditar que o mundo ficaria melhor apenas entregue aos homens...»
Não me chamo Rangel nem visto fatos de 35 linhas, mas «Eu assino por baixo»
" ... aflige-me um mundo sem deus ... ". Posso sugerir-lhe a leitura de "36 Arguments for the Existence of God", da autoria de Rebecca Goldstein ?
Saudoso, andei a vasculhar quem seria a senhora que me sugere (que eu não conhecia). O facto dela ter escrito um livro chamado "Betraying Spinoza: The Renegade Jew Who Gave Us Modernity" abona muito em favor da sua sugestão. Vou tentar segui-la.
Ana Cristina, parece que houve uma confusão - e a culpa foi minha.
Logo na primeira frase do meu comentário, escrevi "vou contra" em vez de vou contar. Uma gralha.
Também não tenho fé na lei da humana selva.
Se digo que pouco me importam as contas que alguém tem de dar a Deus, é porque o plano do Juízo (o encontro da alma com Deus) e o arrependimento têm sido razões invocadas pela hierarquia da igreja católica para o silêncio.
Olá Ana Cristina. Estarei assim tão mal informada? Não quero entrar em controvérsias porque não é para isso que a visito e «meto conversa». Não tenho muito jeito para brigar em casa alheia.
Faço-lh um pedido: talvez me possa elucidar sobre M. T. de Calcutá, quiçá com indicação de alguns escritos, para eu não andar iludida a tê-la como um referência na ajuda aos que mais ninguém quis.
Tal como muitos, eu sinto-me irreligiosa, mas concordo consigo quanto a não ter muita fé na espécie humana para acreditar que o mundo ficaria melhor apenas entregue aos humanos. Talvez por este facto aceitar, querer acreditar que apareceu um ser humano excepcional, nem que seja uma vez por outra.
Fique bem.
Beijo.
Guidinha, juro que mal tenha tempo falarei da Teresa de Calcutá
maj, acho que estamos de acordo
só para dizer que tb estou em sintonia com a interrogação sobre os motivos de riso da de Calcutá.
só no blog do Lx percebi que andava com os login trocados. A nelia (aí de cima) sou eu.
(pode parecer uma parvoíce a explicação mas eu sou assim mesmo :-) )
Eu ando triste. Porque acredito nos valores cristaõs, acredito no Amor com letra grande como aprendi na catequese.
Mas repugna-me a igreja que vejo à minha volta e não tenho nenhuma vontade de defender uma instituição que não condiz com o que acredito.
Enfim, aproveito para dizer que gostei de conhecer este interessanteblog.
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