Há mais ou menos uma década morava na mesma rua do Raúl Solnado. Costumava cruzar-me com ele num restaurante óptimo que lá havia. Penso que só lhe dirigi a palavra uma vez, quando ele disse qualquer coisa a propósito do PCP ter vindo elogiar a Amália na altura em que ela morreu. Achei que ele tinha razão.
Uma noite coincidimos no jantar. Já tarde, fiquei sem cigarros para a sobremesa. Da minha mesa eu via a mesa dele e, sobretudo, via o maço de tabaco pousado ao lado da travessa. Fumadora inveterada, não resisti. Fui lá e pedi-lhe um cigarro. Estendeu-me amavelmente o maço e eu agradeci. Voltei para o lugar e passei ao café. Já ia no segundo quando Solnado se levantou para sair. Ao passar junto a mim, levou a mão ao bolso, tirou três cigarros e deixou-os ficar.
Por vezes é preciso muito pouco para identificarmos uma 'alma melhor'.
08/08/09
Raúl Solnado [19 de Outubro de 1929 - 8 de Agosto 2008]
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6 comentários:
:) um sorriso sem muito alarde, pela ternura do post
Um bonito "post".
Estou triste como muitos Portugueses da minha geração.
Sobre o falecimento de Raúl Solnado, escrevi assim:
http://atributos-1.blogspot.com/2009/08/descansa-em-paz_08.html
Melhores cumprimentos
José Magalhães
Recordo, da minha actual vigia higienista, a vertigem de não ter cigarros, por isso compreendo quantos adjectivos vale o gesto de Raúl Solnado.
Uma vez, estava parada no trânsito e, no sentido contrário, estava o Raul Solnado, parado no trânsito. Olhei para ele e sorri. Ele sorriu-me de volta e disse-me adeus.
Outra vez, estava parada no transito a sair de um concerto do Chico Buarque e, no carro ao lado, estava o próprio Chico. Olhei para ele e sorri. Ele sorriu-me de volta e disse-me adeus.
Lembrei-me da coincidência porque fala dos dois nas suas meditações na pastelaria.
Rita
Rita, duas almas melhores
gostei muito deste encadeamento todo (quer dizer, desde a última vez que estive por cá).
estava convencida de que era um cão...
é curioso isso dos cigarros; quando deixo tb deixo 3, como se 2 fossem os indispensáveis e o terceiro à cautela.
cara a cara com o Chico?! (olhos esbugalhados, nem eu sei bem porquê, talvez só porque ao imaginar-me em tal situação sinto que não seria capaz de mais nada do que dizer-lhe: pare de me olhar com esse verde, cara, não sei o que fazer com isso...)
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