31/08/10

Salvo pelos livros

— Não te esqueças amanhã de trazer os livros. Estão os três dentro do saco.
A dor fora-se diluindo gota a gota através do líquido branco que vazava do tubo. Parecia um homem novo.
— Não esqueço.
— Sobretudo, não te esqueças do Balzac. Que escritor! Dentro do saco está A Mulher de Trinta Anos junto com aquele d’ O Filósofo e o Lobo e o outro…
— Não esqueço.
— Quando era novo li o Père Goriot. Que coisa maravilhosa!
— Esse nunca li.
— Nunca leste?! Parece mentira!
— Agora tem de sair.
— Saio já.
— E traz um macinho de tabaco. E um isqueiro…
— Eu trago, mas não sei se o vão deixar fumar.
— Fumo há 60 anos. O que é que adiantaria agora…?
— Eu trago. O tabaco e os livros.
Tem mesmo que ir...
— Amanhã estou cá com as encomendas.
— Vai. Vai. E como é que nunca leste o Père Goriot é que eu gostava de saber…

2 comentários:

Leonor disse...

E como para além de um discurso de amor pelos livros assoma o não dito da ternura.

F disse...

Pois. Há lugares onde os livros são como verdadeiras janelas, naves, mãos que nos levam a passear.