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18/08/23
26/08/22
MEDITAÇÃO DE SEXTA: «O TEMPO DOS SISUDOS»
«Não indo esta que vos escreve para nova, vou começar por citar um clássico.
JUDITH: Acho, Reg, que qualquer grupo anti-imperialista como o nosso deve reflectir na sua base tal diversidade de interesses.
REG: Concordo. Francis?
FRANCIS: Sim, Reg, o ponto de vista de Judith parece-me válido, desde que o movimento nunca esqueça que o direito inalienável de qualquer homem…
STAN: Ou mulher…
FRANCIS: Ou mulher… É ele livrar-se…
STAN: Ou ela…
FRANCIS: Ou ela…
REG: Aprovado.
FRANCIS: Obrigado, irmão.
STAN: Ou irmã.
FRANCIS: Ou irmã. Onde é que eu ia?
REG: Acho que tinhas terminado.
FRANCISCO: Ah! Certo.
REG: Além disso, é direito inato de qualquer homem…
STAN: Ou mulher.
REG: Porque é que não te calas com as mulheres, Stan? Estás a desviar-nos do assunto.
STAN: As mulheres têm todo o direito a participar no nosso movimento, Reg.
FRANCIS: Porque é que falas tanto de mulheres, Stan?
STAN: Eu quero ser uma.
REG: O quê?!
STAN: Quero ser uma mulher. De aqui para diante, quero que me chamem Loretta.
REG: O quê?!
LORETTA: É um direito meu como homem.
JUDITH: Bom, mas porque queres ser Loretta, Stan?
LORETTA: Quero ter bebés.
REG: Queres ter bebés?!
LORETTA: É um direito de todo e qualquer homem ter filhos se quiser.
REG: Mas... tu não pode ter bebés.
LORETTA: Não me oprimas!
REG: Eu não te estou a oprimir, Stan. Tu não tens útero! Onde é que o feto se vai desenvolver?! Vais guardá-lo numa caixa?!
LORETTA: (chora)
JUDITH: Olha! Eu... eu tenho uma ideia. Digamos que concordas que ele não pode realmente ter bebés porque não tem útero, o que não é culpa de ninguém, nem sequer dos Romanos, mas que ele pode ter o direito a ter bebés.
FRANCIS: Boa ideia, Judith. Lutaremos contra os opressores pelo teu direito a dar à luz, irmão. Irmã. Desculpa.
REG: Qual é o interesse?
FRANCIS: O quê?
REG: Qual é o sentido de lutar pelo direito dele a ter bebés, quando ele não pode ter bebés?!
FRANCIS: É um símbolo da nossa luta contra a opressão.
REG: É um símbolo da luta dele contra a realidade, isso sim.” (...)»
29/05/22
GUERRA NA UCRÂNIA: PELA SAÚDE DOS UCRANIANOS (E JÁ AGORA DA NOSSA) CHAMEM ADULTOS À SALA!
Ou de como os políticos tentam sempre vender-nos the bright side of life...
JORNALISTA: “Wouldn’t a full embargo be the most effective way to stop Putin?”
Já para não falar da invasão da Ucrânia nos ir, afinal, tornar a todos bestialmente verdes (a Ursula também fala nisso na mesma entrevista...)
07/04/12
14/01/12
“Vou-me embora pra Pasárgada”*
Começo por uma confissão: nunca fui do MRPP.
Se professei o maoismo, e professei-o (nobody's perfect), fi-lo sempre do lado dos bons (cf. por favor, A Vida de Brian).
Dito isto, e dito que teria uns 16 anos quando me raspei — tudo porque começaram com umas tretas da moral burguesa versus moral proletária e queriam obrigar a malta a casar-se ou, pelo menos, a ir virgem para o casamento —, acrescento que no que toca à arte dos graffiti avant Basquiat, e em matéria de slogans, o partido de Arnaldo Matos sempre se mostrou imbatível.
Vem isto a propósito das recentes declarações de Miguel Relvas que, dando como exemplo os jovens portugueses emigrados que encontrou em Moçambique, voltou a insistir na tecla do Pirem-se daqui!, Desamparem-me a loja! (e ai de quem insinuar que a palavra “loja” esconde alguma indirecta ao ministro, ou sequer à Maçonaria).
Lembrei-me, pois, ouvindo Relvas, do célebre slogan cunhado outrora pelo MRPP: “Nem mais um soldado para as colónias!
Na senda publicista de O’Neill, ocorreu-me: Nem mais um desempregado para as colónias!
E porque esta coisa de nos quererem pôr com dono me chateia, queria lembrar três coisas.
1. Já não há colónias;
2. «Nunca houve um encerramento geográfico como o de hoje. Quando se saía de Inglaterra, podia-se ir para a Austrália, a Índia, o Canadá; agora, deixou de haver autorização para trabalhar. O planeta fecha-se. Todas as noites, centenas de pessoas tentam entrar na Europa a partir do Magrebe. O planeta está em movimento, mas em que direção? Terrível, o destino atual dos refugiados. Deram-me a honra, na Alemanha, de fazer um discurso perante o governo. Terminei dizendo: "Senhoras e senhores, todas as estrelas se tornaram amarelas"» (George Steiner, “Télérama”, 12/12/2011);
3. Dados públicos apontam para cerca de meio milhão de portugueses desempregados sem subsídio. Entre os mais penalizados, estão todos os que têm cerca de 50 anos e não encontrarão trabalho.
Posto isto, Senhor Ministro, o que nos sugere? Já percebemos a parte do Raus! Agora o difícil é: fugir para onde?
* poema de Manuel Bandeira
Se professei o maoismo, e professei-o (nobody's perfect), fi-lo sempre do lado dos bons (cf. por favor, A Vida de Brian).
Dito isto, e dito que teria uns 16 anos quando me raspei — tudo porque começaram com umas tretas da moral burguesa versus moral proletária e queriam obrigar a malta a casar-se ou, pelo menos, a ir virgem para o casamento —, acrescento que no que toca à arte dos graffiti avant Basquiat, e em matéria de slogans, o partido de Arnaldo Matos sempre se mostrou imbatível.
Vem isto a propósito das recentes declarações de Miguel Relvas que, dando como exemplo os jovens portugueses emigrados que encontrou em Moçambique, voltou a insistir na tecla do Pirem-se daqui!, Desamparem-me a loja! (e ai de quem insinuar que a palavra “loja” esconde alguma indirecta ao ministro, ou sequer à Maçonaria).
Lembrei-me, pois, ouvindo Relvas, do célebre slogan cunhado outrora pelo MRPP: “Nem mais um soldado para as colónias!
Na senda publicista de O’Neill, ocorreu-me: Nem mais um desempregado para as colónias!
E porque esta coisa de nos quererem pôr com dono me chateia, queria lembrar três coisas.
1. Já não há colónias;
2. «Nunca houve um encerramento geográfico como o de hoje. Quando se saía de Inglaterra, podia-se ir para a Austrália, a Índia, o Canadá; agora, deixou de haver autorização para trabalhar. O planeta fecha-se. Todas as noites, centenas de pessoas tentam entrar na Europa a partir do Magrebe. O planeta está em movimento, mas em que direção? Terrível, o destino atual dos refugiados. Deram-me a honra, na Alemanha, de fazer um discurso perante o governo. Terminei dizendo: "Senhoras e senhores, todas as estrelas se tornaram amarelas"» (George Steiner, “Télérama”, 12/12/2011);
3. Dados públicos apontam para cerca de meio milhão de portugueses desempregados sem subsídio. Entre os mais penalizados, estão todos os que têm cerca de 50 anos e não encontrarão trabalho.
Posto isto, Senhor Ministro, o que nos sugere? Já percebemos a parte do Raus! Agora o difícil é: fugir para onde?
* poema de Manuel Bandeira
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10/09/11
Falta de ar
O mundo virado do avesso e o Bloco de Esquerda quer discutir a eutanásia. O tema é escorregadio. Desperta temíveis fantasmas — logo, logo, o Aktion T4 nazi — e termina nas assépticas clínicas actuais onde a morte chega em celofane a troco de um cheque chorudo.
“A morte é uma puta”, desabafou António Lobo Antunes quando sentiu a morte a rondá-lo. A eutanásia seria, assim, uma espécie de puta de luxo, nos antípodas da ceifeira cadavérica retratada pelos Monty Python em O Sentido da Vida.
O argumento mais usado pelos defensores da eutanásia relaciona-se com a questão do sofrimento inútil, chegado o momento em que a expressão “enquanto há vida há esperança” perde sentido. Os opositores (deixando de lado a contestação religiosa…) invocam sobretudo o precedente aberto pela sua descriminalização.
Neste assunto, como em outros, Esquerda e Direita divergem. A última quase sempre por razões de fé, a primeira invocando razões de autonomia: o direito a uma morte digna.
Posso perceber ambas. Mas, lá pelo meio, algo me escapa: o fascínio pela legislação da Esquerda.
O Estado que tudo controla. O que se come, o que se bebe, o que se fuma… A vida privada cada vez mais enredada em regras, normas, artigos, regulamentos e adendas.
Algures pelo mundo, burocratas paranóicos vão ajustando a realidade aos seus delírios — dos babás ao rum que já não podem levar rum, às colheres de pau que passaram a ser de plástico. Interrogamo-nos: que raio de tipos serão estes que se lembram de criar leis sobre tais coisas?
O resultado está à vista: não andamos mais felizes. A paranóia alarga os seus tentáculos e um italiano é preso na Suécia por dar uma estalada ao filho; enquanto isso, as redes de pornografia infantil somem e seguem (a Casa Pia, topam?). Vivemos em regime esquizofrénico.
E a eutanásia no meio disto? Bom, a eutanásia é assim. Pela parte que me toca, gostaria que o Estado não se metesse na minha morte. Sei que não é simples, mas deveria bastar para começo de conversa.
“A morte é uma puta”, desabafou António Lobo Antunes quando sentiu a morte a rondá-lo. A eutanásia seria, assim, uma espécie de puta de luxo, nos antípodas da ceifeira cadavérica retratada pelos Monty Python em O Sentido da Vida.
O argumento mais usado pelos defensores da eutanásia relaciona-se com a questão do sofrimento inútil, chegado o momento em que a expressão “enquanto há vida há esperança” perde sentido. Os opositores (deixando de lado a contestação religiosa…) invocam sobretudo o precedente aberto pela sua descriminalização.
Neste assunto, como em outros, Esquerda e Direita divergem. A última quase sempre por razões de fé, a primeira invocando razões de autonomia: o direito a uma morte digna.
Posso perceber ambas. Mas, lá pelo meio, algo me escapa: o fascínio pela legislação da Esquerda.
O Estado que tudo controla. O que se come, o que se bebe, o que se fuma… A vida privada cada vez mais enredada em regras, normas, artigos, regulamentos e adendas.
Algures pelo mundo, burocratas paranóicos vão ajustando a realidade aos seus delírios — dos babás ao rum que já não podem levar rum, às colheres de pau que passaram a ser de plástico. Interrogamo-nos: que raio de tipos serão estes que se lembram de criar leis sobre tais coisas?
O resultado está à vista: não andamos mais felizes. A paranóia alarga os seus tentáculos e um italiano é preso na Suécia por dar uma estalada ao filho; enquanto isso, as redes de pornografia infantil somem e seguem (a Casa Pia, topam?). Vivemos em regime esquizofrénico.
E a eutanásia no meio disto? Bom, a eutanásia é assim. Pela parte que me toca, gostaria que o Estado não se metesse na minha morte. Sei que não é simples, mas deveria bastar para começo de conversa.
02/10/10
José Sócrates, o homem que gosta de andar de metro, contou em público a melhor piada do mundo e mantém-se vivo
O prémio para a melhor piada do mundo pertencia até agora aos ingleses. O seu efeito letal, largamente confirmado durante a II Guerra, levara os súbditos de sua majestade, acabado o conflito, a enterrá-la com pompa e circunstância. Acreditava-se que para sempre.
Eis senão quando José Sócrates a desenterra durante a sua última entrevista à RTP. Contudo, por motivos ainda desconhecidos, quando o engenheiro afirmou que as medidas de austeridade são para defender o emprego não se registaram mortes.
Vários analistas são de opinião que os efeitos letais da piada só se farão sentir mais pró Natal.
Outros dizem que a inexistência de vítimas se ficou a dever ao facto de já ninguém dar ouvidos ao primeiro-ministro.
Um terceiro grupo, no qual pontifica Manuel Alegre, e que se encontrava por acaso no interior de um submarino em prospecção de robalos, recusou prestar declarações alegando que o referido habitáculo era à prova de som.
Fontes bem informadas garantiram, porém, que a piada de Sócrates só não foi ouvida debaixo de água porque o Bardo declamava na altura um poema longo e toda a tripulação tinha metido salsa nas orelhas.
Eis senão quando José Sócrates a desenterra durante a sua última entrevista à RTP. Contudo, por motivos ainda desconhecidos, quando o engenheiro afirmou que as medidas de austeridade são para defender o emprego não se registaram mortes.
Vários analistas são de opinião que os efeitos letais da piada só se farão sentir mais pró Natal.
Outros dizem que a inexistência de vítimas se ficou a dever ao facto de já ninguém dar ouvidos ao primeiro-ministro.
Um terceiro grupo, no qual pontifica Manuel Alegre, e que se encontrava por acaso no interior de um submarino em prospecção de robalos, recusou prestar declarações alegando que o referido habitáculo era à prova de som.
Fontes bem informadas garantiram, porém, que a piada de Sócrates só não foi ouvida debaixo de água porque o Bardo declamava na altura um poema longo e toda a tripulação tinha metido salsa nas orelhas.
09/06/10
Educação sexual dos 6 aos 16 ou a modernidade húmida
Estamos completamente quilhados (a palavra talvez devesse ser "fornicados" por mais apropriada ao assunto).
Tolhido pela profundidade do pensamento de D. Duarte de Bragança — "Tornar obrigatório a educação sexual resume-se a dizer: forniquem à vontade" — e/ou a pedagogia iluminada dos que acham indispensável introduzir a disciplina nas escolas primárias (penso que agora já não se chamam assim), Portugal dá mais um passo gigantesco em direcção a essa incontestada e incontestável coisa chamada Modernidade, que já no meu tempo era um conceito um bocado antigo.
Sobre a sexualidade infantil ainda nada foi dito de mais profundo do que isto: A teoria antiga negava a sexualidade dos adultos. A moderna diz que os bebés têm prazer sexual enquanto defecam. A antiga era melhor, ao menos podia ser contraditada pelas partes envolvidas.
O autor foi, claro, Karl Kraus e a frase visava Freud.
Quanto a mim, que nada tenho contra as cegonhas (o mesmo já não podendo dizer de Freud), estou com Kraus.
E acrescento: e se deixassem as crianças em paz? Não se preocupem com elas: quando estão interessadas, perguntam.
Isto, claro, se não estiverem demasiado ensonadas derivado ao facto de se levantarem às 6 da manhã para chegarem à escola às 8 (tudo em nome do seu sucesso escolar, claro). Mas também é verdade que já era esse o horário durante a Revolução Industrial, glorioso momento histórico que nos tornou a todos modernos.
Depois, contudo, não se admirem.
[O velhíssimo vídeo aí em cima, dos velhíssimos Monty Python, está classificado no YouTube para maiores de 18 anos — ora aí está uma medida adequada a estes tempos sombrios]
21/12/09
04/02/09
Há manias difíceis de perder*
* Dois anos depois de Mahmoud Ahmadinejad ter dito que Israel devia desaparecer do mapa, é a vez de Ze'ev Boim, ministro da habitação (?) israelita vir defender publicamente o assassínio de Ismail Haniyeh. Será que toda esta malta não consegue, ao menos, manter os segredos de estado?
23/12/08
22/11/08
Enquanto o país se assombra com um Loureiro e uma Oliveira eu dou continuidade às memórias na alcova, derivado ao raio de uma gripe ou lá o que seja
A mim não foi um qualquer quem me recrutou. Não senhor. O rapaz (na altura) havia de palmilhar uma via ascensional que, não o tendo conduzido a Fátima, o levou ao Santo Sepulcro. E para quê falar com Nossa Senhora quando se pode falar com Deus? Foi o que eu pensei. Estive uns anos sem saber dele. Até que soube. Estava bastante mais gordo. De resto estava igual.
Vou-vos, então, contar. Na altura ele não dirigia jornal coisíssima nenhuma. Era tão estudante como eu. Um dia chegou ao pé de mim e disse-me: «Temos que falar!». O tom era imperativo e conspirativo. Revelava que havia coisa. A certa altura chamou-me «camarada!» e eu senti que o momento era solene: «Camarada! Pensamos que chegou a altura de entrares para a UEC (ml). Não tens de responder já».
Aqueles que me lêem e se lembram d’ A Vida de Brian (Are you the Judean People's Front? Fuck off! What? Judean People's Front. We're the People's Front of Judea! Judean People's Front. Cawk. etc.) talvez consigam perceber.
Um: que o grande inimigo da União dos Estudantes Comunistas (marxistas-leninistas) era a União dos Estudantes Comunistas. Dois: que uma jovem ser convidada a entrar na União dos Estudantes Comunistas (marxistas-leninistas) seria o equivalente, na actualidade, a uma jovem ser convidada a entrar numa telenovela da SIC. Como protagonista. Devem-me ter tremido as pernas. Se não logo, depois. Já perceberão porquê. Respondi gaguejando que sim. E mais tarde combinou-se um encontro. Clandestino, como soía.
Não é preciso ter lido a Zita para saber que tais encontros envolviam preliminares kamasutrianos. Havia uma senha, como nos spy games, e havia, sobretudo, «o percurso». O percurso era um preâmbulo peripatético ao encontro, durante o qual todos os militantes tinham de atestar que a distância mais curta entre dois pontos nunca era uma linha recta. Por exemplo: eu estava no Cais do Sodré e queria ir para a Graça. Certo e certinho que havia de passar pelas Avenidas Novas com desvio pela Calçada da Estrela.
Abreviando, apanhámos o 28. Que estava longe de ser uma atracção turística e, como era uso então, seguia de portas abertas. Combinámos. Ali por perto da Calçada de São Vicente, quando a velocidade se encurta e o eléctrico faz corpo com o casario, pularíamos em andamento, no intuito de galgar umas escadas de que esqueci o nome. Aquiesci e lá montámos o dito, no meu caso tomada pela ânsia de ― imitando o voo do meu angariador ―mergulhar de cabeça no mundo dos ungidos.
Vou-vos, então, contar. Na altura ele não dirigia jornal coisíssima nenhuma. Era tão estudante como eu. Um dia chegou ao pé de mim e disse-me: «Temos que falar!». O tom era imperativo e conspirativo. Revelava que havia coisa. A certa altura chamou-me «camarada!» e eu senti que o momento era solene: «Camarada! Pensamos que chegou a altura de entrares para a UEC (ml). Não tens de responder já».
Aqueles que me lêem e se lembram d’ A Vida de Brian (Are you the Judean People's Front? Fuck off! What? Judean People's Front. We're the People's Front of Judea! Judean People's Front. Cawk. etc.) talvez consigam perceber.
Um: que o grande inimigo da União dos Estudantes Comunistas (marxistas-leninistas) era a União dos Estudantes Comunistas. Dois: que uma jovem ser convidada a entrar na União dos Estudantes Comunistas (marxistas-leninistas) seria o equivalente, na actualidade, a uma jovem ser convidada a entrar numa telenovela da SIC. Como protagonista. Devem-me ter tremido as pernas. Se não logo, depois. Já perceberão porquê. Respondi gaguejando que sim. E mais tarde combinou-se um encontro. Clandestino, como soía.
Não é preciso ter lido a Zita para saber que tais encontros envolviam preliminares kamasutrianos. Havia uma senha, como nos spy games, e havia, sobretudo, «o percurso». O percurso era um preâmbulo peripatético ao encontro, durante o qual todos os militantes tinham de atestar que a distância mais curta entre dois pontos nunca era uma linha recta. Por exemplo: eu estava no Cais do Sodré e queria ir para a Graça. Certo e certinho que havia de passar pelas Avenidas Novas com desvio pela Calçada da Estrela.
Abreviando, apanhámos o 28. Que estava longe de ser uma atracção turística e, como era uso então, seguia de portas abertas. Combinámos. Ali por perto da Calçada de São Vicente, quando a velocidade se encurta e o eléctrico faz corpo com o casario, pularíamos em andamento, no intuito de galgar umas escadas de que esqueci o nome. Aquiesci e lá montámos o dito, no meu caso tomada pela ânsia de ― imitando o voo do meu angariador ―mergulhar de cabeça no mundo dos ungidos.
E mergulhei literalmente de cabeça. Porque apesar do sim! sim! voluntarioso com que anuíra às instruções, a verdade é que nunca saltara de eléctrico. Quando finalmente cheguei, coxa, ao termo das escadas, o rapaz que muito mais tarde viria a ser, to say the least, um afamado e anafado director de jornal deu ― sem esconder a contrariedade ― por cancelado o encontro.
A coisa não começava bem e havia de terminar pior.
A coisa não começava bem e havia de terminar pior.
15/06/08
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