16/09/22

MEDITAÇÃO DE SEXTA: «A MORTE SAIU À RUA»

«... Eram os loucos anos 80. Sobretudo nas cidades, a juventude, isenta agora de ir para África combater os turras e gritar Angola é Nossa, dava finalmente ares de modernidade (ou de pós-modernidade) — amortecido o apelo dos comícios e da Reforma Agrária — e recuperava o tempo perdido da geração anterior.

O clima era culturalmente festivo e as noites não lhe ficavam atrás (quase se poderia colá-las ao título da francesa Raphaele Billetdoux editado pela saudosa Cotovia: As Minhas Noites são mais Belas que os Vossos Dias). E para se entender melhor o abismo que separa o ambiente, o tom, a alegria dessa época da anterior, registe-se a data de publicação de dois dos nossos romances maiores: O Delfim de José Cardoso Pires, 1968; O que Diz Molero de Dinis Machado, 1977. (...)

Estreou então entre nós o filme A Cidade Branca. Era 1983, na capital, no Bairro Alto, ainda havia jornais e putas, e foi com dificuldade que convenci um amigo brasileiro a ir ao cinema ver a fita do suíço. O meu amigo não podia com helvéticos. Odiava chocolate suíço, relógios de cuco, a banca suíça, os Alpes suíços, o queijo Gruyère e, claro, todo e qualquer artista suíço (talvez pudesse apreciar Robert Walser, mas porque Walser era louco). (...)»

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