Creio que foi através de Kundera que tomei conhecimento das sonoras gargalhadas que terão dado Kafka e seus amigos quando o autor de A Metamorfose leu em voz alta as aventuras de Gregor Samsa, o pobre caixeiro-viajante que um dia acorda transformado num insecto.
Veio a guerra e o humor foi sendo varrido da leitura dos textos do judeu de Praga, para dar lugar ao pesadelo da angústia e do absurdo que a sua obra premonitoriamente antecipara.
Kafkianos nos tornámos, kafkianos somos. Mas porque o humor, por muito negro, não pode ser descartado, dei por mim a levar à letra o haiku do Millôr Fernandes (o cético sábio sorri só com um lábio), ao tropeçar nas declarações de Peter Weiss, chefe-adjunto da missão da troika em Portugal, que, a dado passo, sugere que o aumento do desemprego se deverá, quem sabe, ao facto de os trabalhadores portugueses andarem a pedir encarecidamente para serem despedidos:
“Pode até acontecer a pedido dos trabalhadores, que é claro que estão interessados em ter uma maior duração do subsídio de desemprego, que pedem em vez de me despedir em Abril, despeça-me em Março – pode ser isso. Isto está sempre aacontecer: quando se aumenta os impostos sobre o tabaco, as pessoas começam a comprar cigarros. É um comportamento normal. Não temos quaisquer provas disso, avancei isso como uma das razões, porque, como disse, nós não entendemos completamente os números”.
Não tenho provas se este Peter Weiss fuma (o outro era dramaturgo e cachimbava), mas se o faz, anda decerto a fumar substâncias não homologadas. Só isso explicará o seu extraordinário raciocínio.
E dado que somos bem entrados em Abril, o mais cruel dos meses, deixo a pergunta: já foi despedido (ao preço antigo) o chefe-adjunto?
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1 comentário:
O DISCURSO DO FILHO DA PUTA
O titulo não me pertence, mas é rigoroso.
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