Perdoar-me-ão
a conjugação pronominal reflexa nestes tempos dados à simplificação, mas dever-se-ia
dizer em geral da cultura aquilo que Natália Correia disse da poesia: que era
para comer.
Em Portugal, a cultura sempre andou associada a uma certa
pomposidade e snobismo e, por natural arrasto, ao seu inverso, o popularucho
bimba, a cultura popular arrasada nos anos do cavaquismo, instrumentalizada que
fora pelo antigo regime, promotor do pobrezinho mas honesto: por detrás das
sete saias da Nazaré muita miséria se escondia.
Acabamos de atingir um novo
patamar. Após 11 anos regidos por um engenheiro que começou por assinar projectos
de pato-bravo no Portugal profundo para acabar a comprar roupa por medida no
420, Rodeo Drive, e governados hoje por um homem que, nas sábias palavras de
António Lobo Antunes, evidencia quão curiosos são os caminhos do Senhor – “Deus
serviu-se de Filipe La Féria para termos este primeiro-ministro. Deus teve de
escolher entre duas desgraças. E preferiu que ele fosse primeiro-ministro a
cantor” –, estranho seria se não andássemos baralhados.
É assim que dizemos bye bye a Paula Rego enquanto acolhemos
com veneranda deferência Joana Vasconcelos no Palácio da Ajuda, ou assistimos
mudos e quedos ao assassínio d’ Os Lusíadas
por José Luís Peixoto.
Não me interpretem mal. Eu sei que à luz da ciência
moderna, provar que um verso de Camões vale mais do que 500 frases de Peixoto é
tarefa inglória. Tão inglória como provar que o truque dos tamanhos XL da Joana
Vasconcelos não passa disso mesmo: de um truque.
Mas isto: “Tágides do Tejo,
ninfas de ninfetice total… emprestem-me ainda um resto do vosso ninfetismo…”?!
Por
muito menos escreveu Almada o “Manifesto anti-Dantas e por extenso”.
6 comentários:
Finalmente, alguém disponível a quebrar essa estranho caso de Joana Vasconcelos.
Um hype que perdura e perdura e perdura...
Pedro
Gostei de ler
Eu também me passo com certas cenas do Peixoro. E não só.
(está tudo bem escrito)
PIM!
Estranhamente - ou não - penso que José Luís Peixoto e Joana Vasconcelos (entre outros) estão muito bem para o tempo que tristemente nos calhou viver... http://thoughloversbelostloveshallnot.blogspot.com/2013/04/jose-luis-peixoto-um-escritor.html
Eu sempre achei que aquela mania de furar as orelhas acabaria a esburacar o funcionamento - já de si tão débil - do bestunto.
E logo havia de embicar no avio popular do Camões!
Aquilo são peixotices, não ligue.
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