05/08/12

A Biblioteca de Babel


Por circunstâncias várias que nada devem a Ortega y Gasset, filósofo preferido do ex-primeiro-ministro, descobri recentemente a Imelda que há em mim. Uma versão, quoi. Não falo de sapataria. Falo de livros. 
Que raio nos atrairá nos livros que nos leva a acumulá-los, a ser incapazes de lançar no lixo títulos mais do que obscuros (ocorre-me, de repente, “A Fenomenologia do Ser” de Sartre, obra lida e sublinhada pelo actual primeiro-ministro), ou a sujeitarmo-nos voluntariamente ao suplício de Sísifo, arrastando volumes e volumes em busca, não do tempo perdido, mas de uma Marmeleira mítica e suficientemente espaçosa? 
Nos últimos tempos ando a pensar imenso no Pacheco Pereira e, mais curioso ainda, a concordar com ele… 
Uma das explicações para este bizarro fenómeno esconder-se-á porventura na frase de Groucho Marx: “Outside of a dog, a book is man's best friend. Inside of a dog it's too dark to read”, mas duvido que o próprio a achasse assaz iluminadora. 
Borges imaginava o Paraíso como uma espécie de biblioteca, e eu tendo a concordar. Mas que fazer quando uma biblioteca se transforma num Inferno? Renunciar a “O Abraço”, pôr a andar o “Belo Adormecido”, desligar “a máquina de fazer espanhóis”? Não se trata disso. Como não se trata de colecionismo, truque infantil com que alguns pensam contrariar a morte. 
Milhares de tratados, ensaios, investigações e doutoramentos summa cum laude escritos sobre book dependency, e continuamos às escuras dentro do cão de Groucho. O cão ladra e os livros acumulam-se. Mordem-nos as canelas. Dão-nos cabo das costas. Quanto pesarão os sete volumes que Proust escreveu na cama, sem qualquer consideração pelas nossas articulações? Mas, por outro lado, como suportar o mundo sem o auxílio das madalenas do dito?  

6 comentários:

Cristina Torrão disse...

Tens a certeza de que não se trata de colecionismo? Quando a biblioteca se transforma num Inferno, algo talvez devesse ser mudado...
Eu também gosto muito de livros, mas, hoje em dia, não hesito em "despachar" aqueles que já li e que sei que não voltarei a ler. Com "despachar" não quero dizer deitar fora. Podem-se dar a alguém que também goste de ler, até se podem doar a uma biblioteca de poucas posses e também há aqueles procedimentos de os deixar numa cabine telefónica, ou num banco de jardim, de comboio ou autocarro (pelo menos, na Alemanha).
Às vezes, custa-me muito "despachar" um livro, mas garanto-te que compensa. É uma sensação tão agradável olhar para as estantes e ver locais livres, à espera de novos livros que me apetece comprar. Sem sentimentos de culpa.

mim ispilica disse...

todos os maníacos tem tendência para a acumulação
que tende a degenerar em comportamentos hebefrénicos


a acumulação e tentativa de organização de inúmeras colecções reais ou virtuaes

tende a aumentar com a idade
e alterações metabólicas

bioquímicas hormonais toxicológicas e outras que se alembre ou alambre

se o tal paxeco é mais maníaco que o pae no coleccionismo livresco

ou se acumulação de lixo do passado ao estylo dos jornaes de tempos perdidos em fundações
também elas perdidas
dá uma sensação de conhecimento que para o bacon com eggs era phoder ou um erzats du pouvoir ou da poivre isse já num sey

tempus fugit à pressa disse...

A internet e os livros, vão lenta, lentamente, desfazendo a acuidade visual, logo é preferível tirar notas dos livros e atirar os livros fora, pois salvo raras excepções todos os livros desvalorizam-se literariamente e economicamente com o tempo.
Basta ver o abate no número de livreiros que vendiam livros em 2ª mão, ou os compravam por preços semi-decentes.
Resumindo: Não resta um.
Pode dar o livro à REMAR ou à RETE
que também vendem livros a 50 cêntimos ou a 1 euro.
Isto se vive em Lisboa, Coimbra ou no Porto, ou em Almada, tirando isso pode fazer como milhares de portugueses e abandoná-lo perto do papelão ou caixote de lixo.
Pessoal da gandaia agradece,pode também juntar restos alimentares aos livros ou deitá-los directamente na co-incineração.
Sãõ sugestões gratuitas.
Sartre é tão chatinho.
E pedante.

henedina disse...

São tão perfeitos os seus leitores.
A minha casa mobilei-a para ter poucos moveis e já transgredi 1, 2, 3, 4, 5 vezes para comprar mais móveis para os livros.
Se até os homens, muito mais imperfeitos e lesivos, não os deitamos fora porquê os livros que nos dão tanto/mais momentos de prazer?
Mergulhe em livros, sufoque de livros afinal se for só esse o seu defeito, não se recrimine não é coleccionismo é lealdade.

Cristina Torrão disse...

Quando a biblioteca se torna "num Inferno", porque nos achamos "incapazes de lançar no lixo títulos mais do que obscuros"...
Claro que os livros "despachados" continuam a ser exceção, são mesmo aqueles sobre os quais dizemos: não gostei.
Uma coisa é certa: não deixo que a minha biblioteca se torne num Inferno!
Há pessoas que não são capazes de deitar fora as moedas sem valor, no meio da sua coleção de moedas valiosas; outras fazem o mesmo com selos; ou seja o que for. Claro que podemos estar horas seguidas a discutir sobre o valor de um livro em relação a um selo raro, que, talvez, seja uma obra de arte. Mas aquilo que nos faz infeliz e nos põe a pensar, aquilo que se tornou um Inferno, merece, pelo menos, uma reflexão sobre mudança de hábitos.

Anónimo disse...

ai q eu tenho tantos livros, sei lá, e eles são tão. sei lá. ideias é que nem vê-las, não basta ter, nem basta ler, é preciso saber ler. continue, porque ler livros, revistas cor de rosa ou ofender gratuitamente não lhe vai fazer grande diferença.